sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Ecclesia «SOPHIA» Archive for the ‘Batismo’ tag!


 Antologia de textos teológicos, ascéticos e místicos

A Origem da Quaresma: acompanhar os catecúmenos até ao seu batismo, na Páscoa

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Depois deste tempo consagrado à observância do jejum, a alma chega, purificada e esgotada, ao batismo. Recobra então as forças mergulhando nas águas do Espírito; tudo o que tinha sido queimado pelas chamas das doenças renasce do orvalho da graça do céu. Abandonando a corrupção do homem velho, o neófito adquire uma nova juventude [...]. Através de um novo nascimento, renasce outro homem, sendo embora o mesmo que tinha pecado.
Por meio de um jejum ininterrupto de quarenta dias e quarenta noites, Elias mereceu pôr fim, graças à água que veio do céu, a uma seca longa e penosa na terra inteira (1Rs 19, 8; 18, 41). Extinguiu a sede ardente do solo trazendo-lhe uma chuva abundante. Estes fatos produziram-se para nos servir de exemplo, para merecermos, após um jejum de quarenta dias, a chuva bendita do batismo, para que a água que vem do céu regue toda a terra, desde há muito tempo árida, dos nossos irmãos do mundo inteiro. O batismo, como uma rega de salvação, porá fim à longa esterilidade do mundo pagão. É, com efeito, de seca e de aridez espiritual que sofre todo aquele que não foi banhado pela graça do batismo.
Através de um jejum do mesmo número de dias e noites, o santo Moisés mereceu falar com Deus, ficar, permanecer com Ele, receber das Suas mãos os preceitos da Lei (Ex 24, 18). [...] Também nós, irmãos muito queridos, jejuamos com fervor durante todo este período, para que [...] também para nós se abram os céus e se fechem os infernos.

O novo Elias

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Ponto final do Antigo Testamento, o batismo é também o início do Novo. Com efeito, ele teve como promotor João e «entre os nascidos de mulher não apareceu ninguém maior do que ele» (Mt 11, 11). João termina a série de profetas, «porque todos os profetas e a Lei vaticinaram até João» (Mt 11, 13). E abre a era do Evangelho, como está escrito: «Princípio do Evangelho de Jesus Cristo [...]. João Batista apareceu no deserto a pregar um baptismo» (Mc 1, 1.4).
Opô-lo-ias a Elias, o tisbita que foi levado para o céu? Mas ele não é superior a João. Enoc foi levado para o céu, mas não é superior a João. Moisés foi um grande legislador em Israel. Todos os profetas foram admiráveis, mas não eram superiores a João. Não se trata de comparar profetas com profetas; mas o seu Senhor, o nosso Senhor, o Senhor Jesus, declarou: «Entre os homens não apareceu ninguém maior do que João Batista» (Mt 11, 11). A comparação foi estabelecida entre o grande servo e os seus companheiros, mas a superioridade e a graça do Filho face aos servos não tem comparação.
Vês então que homem Deus escolheu como primeiro beneficiário desta graça? Um pobre, um amigo do deserto, que não era por isso inimigo dos homens. Ao alimentar-se de gafanhotos, dava asas à sua alma. Comendo mel, pronunciava palavras mais doces e mais úteis que o mel. Vestindo um traje de pêlo de camelo, demonstrava na sua pessoa o exemplo do esforço. Foi desde o ventre de sua mãe santificado pelo Espírito Santo (Lc 1, 15). Jeremias foi santificado, mas não era profeta desde o ventre materno. Apenas João, na prisão do ventre de sua mãe, estremeceu de alegria (Lc 1, 44); ainda sem ver com os olhos de carne, sob a ação do Espírito, ele reconheceu o Senhor. A grandeza da graça do batismo exigia um grande chefe de fila.

Cala-te e sai desse homem!

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O Batismo, banho de santidade, lava as manchas do pecado, mas não altera a dualidade da nossa vontade e não impede que os espíritos do mal nos combatam ou nos enredem nas suas ilusões. [...] Mas a graça de Deus tem a sua morada na profundidade da alma, ou seja, no entendimento. Com efeito, diz-se que a filha do rei e as donzelas suas amigas «avançam com alegria e júbilo e entram com alegria no palácio real» (Sl 44, 16): entram para o interior, não se mostram aos demónios. Por isso, quando nos recordamos de Deus com fervor, sentimos brotar o desejo do divino do fundo do nosso coração. Mas, nessa altura, os espíritos malignos atacam os sentidos corporais e aí se ocultam, aproveitando o relaxamento da carne. [...] Desta forma, o nosso interior, como diz o divino apóstolo Paulo, rejubila continuamente na lei do Espírito (Rom 7, 22), mas os sentidos desejam deixar-se levar pela propensão para os prazeres [...].
«A luz brilhou nas trevas, mas as trevas não a receberam» (Jo 1, 5) [...]: o Verbo de Deus, verdadeira Luz, no Seu incomensurável amor pelo Homem, considerou oportuno manifestar-Se à Criação em carne e osso, acendendo em nós a luz do Seu conhecimento divino. O espírito do mundo não acolheu o desígnio de Deus, isto é, não O reconheceu. [...] No entanto, como maravilhoso teólogo, o evangelista João acrescenta: «O Verbo era a luz verdadeira que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina. Ele estava no mundo e por Ele o mundo veio à existência, mas o mundo não O reconheceu. Veio para o que era Seu e os Seus não O receberam. Mas, a quantos O receberam, aos que Nele crêem, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus» (vv. 9-12). [...] Quando diz que o mundo não recebeu a verdadeira Luz, o evangelista não se refere a Satanás, que lhe é estranho, visto que A rejeitou desde o início. Com esta afirmação, São João acusa justamente os homens que compreendem os poderes e as maravilhas de Deus mas, devido aos corações obscurecidos, não se querem aproximar da claridade do Seu conhecimento.

A casa encheu-se com a fragrância do perfume

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«Encontrando-se Jesus em Betânia, em casa de Simão, o leproso, e estando à mesa, chegou uma mulher que trazia um frasco de alabastro com perfume de nardo puro, de elevado preço» (14, 3). Esta mulher diz-vos diretamente respeito, a vós que ides receber o batismo. Ela partiu o frasco de alabastro para que Cristo, o Ungido do Senhor, fizesse de vós cristãos pela unção. É isso que está dito no Cântico dos Cânticos: «O teu nome é como perfume derramado: por isso te amam as donzelas. Leva-me atrás de ti, corramos!» (1, 3-4). Enquanto o perfume estava fechado, enquanto Deus só foi conhecido na Judéia, enquanto o Seu nome não foi grande senão em Israel (Sl 75, 2), as jovens não seguiam Jesus. Mas, a partir do momento em que o perfume se espalhou por todo o mundo, as almas dos crentes seguiram o Salvador. [...] Ela partiu o frasco de alabastro, a fim de que todos usufruíssem do perfume [...]; um ato que nos recorda o grão de trigo que, «se não morrer, fica só ele» (Jo 12, 24): assim também, se o frasco não for partido, não poderemos ungir-nos com o perfume.
Esta mulher não é a mesma que é citada noutro Evangelho, por ter lavado os pés do Senhor (Lc 7, 38). Porque essa mulher, que era até então uma pecadora de má vida [...], inunda com as suas lágrimas os pés do Salvador e seca-os com os seus cabelos; mas é só aparentemente que ela lava os pés do Salvador, porque o que realmente faz é lavar os seus pecados. [...]
Que o mesmo se passe convosco, que ides receber o batismo; dado que somos todos pecadores, que ninguém é puro, mesmo que a sua vida tenha durado um só dia (Job 14, 4) [...], começai por abraçar os pés do Salvador, lavai-os com as vossas lágrimas, enxugai-os com os vossos cabelos; depois disso, tocar-Lhe-eis então na cabeça, como fez a mulher do Evangelho de Marcos. Quando descerdes à fonte da vida com o Salvador, tendes de aprender como foi que o perfume chegou à Sua cabeça. Porque, se «a cabeça de todo o homem é Cristo» (1Cor 11, 3), também a vossa cabeça há de estar perfumada; e será pelo batismo que recebereis esta unção.

Batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo

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Eis a regra da nossa fé, eis o fundamento do nosso edifício, eis aquilo que dá firmeza ao nosso comportamento. Em primeiro lugar: Deus Pai, incriado, ilimitado, invisível, Deus uno, criador do universo; é o primeiro artigo da nossa fé. Segundo artigo: o Verbo de Deus, Filho de Deus, Jesus Cristo, Nosso Senhor, que foi revelado aos profetas segundo o género das suas profecias e segundo os desígnios do Pai; por meio de Quem todas as coisas foram feitas; no final dos tempos, para recapitular todas as coisas, dignou-Se encarnar, aparecendo entre os humanos, visível, palpável, para destruir a morte, fazer surgir a vida e operar a reconciliação entre Deus e o homem. Terceiro artigo: o Espírito Santo, por Quem os profetas profetizaram, os nossos pais conheceram as coisas de Deus e os justos foram conduzidos para a via da justiça; no final dos tempos, foi enviado aos homens de uma maneira nova, a fim de os renovar em toda a face da terra, para Deus.
É por isto que o baptismo do nosso novo nascimento é colocado sob o signo destes três artigos. Deus Pai concede-no-lo, com vista ao nosso novo nascimento em Seu Filho, pelo Espírito Santo. Porque aqueles que trazem em si o Espírito Santo são conduzidos ao Verbo, que é o Filho, o Filho condu-los ao Pai, e o Pai concede-lhes a imortalidade. Sem o Espírito, é impossível ver o Verbo de Deus, e sem o Filho ninguém pode aproximar-se do Pai. Porque o conhecimento do Pai é o Filho; o conhecimento do Filho faz-se pelo Espírito Santo; e o Filho concede o Espírito segundo a complacência do Pai.             

Trouxeram-lhe todos os que sofriam

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Trouxeram-lhe todos os que sofriam [...], que padeciam doenças e tormentos

Ergamos todos os olhos para o Senhor que está nos céus, e digamos, como o profeta: «Fez a Sua aparição na terra, onde permaneceu entre os homens» (Bar 3, 38). Esse mesmo que aos profetas Se mostrou sob aparências várias, Esse que surgiu a Ezequiel na aparência de um homem num trono de fogo (Ez 1, 26) e que Daniel viu como Filho do Homem e Ancião, idoso e jovem ao mesmo tempo (Dn 7, 9.13), proclamando-O como um só Senhor, Esse é Aquele que apareceu e que tudo iluminou.
Ele fez dissipar a noite sinistra; graças a Ele, é sempre dia. Resplandeceu no mundo a luz sem ocaso, Jesus, nosso Salvador. O país de Zabulão vive na abundância e imita o paraíso, pois todos podem «saciar-se» no seu «rio de delícias» (Sl 35, 9), e faz desaguar nele uma corrente de água sempre viva [...]. Na Galileia contemplamos «a fonte da vida» (v. 10), Aquele que apareceu e que tudo iluminou.
Também eu Te verei, Jesus, a iluminar o meu espírito e a dizer aos meus pensamentos: «Se alguém tem sede, venha a Mim e beba!» (Jo 7, 37). Refresca este coração humilhado que a minha vida errante fez quebrar. Ela consumiu-o, na fome e na sede; não fome de alimentos, não sede de beber, mas de ouvir as palavras do Senhor (Am 8, 11) [...]. Por isso o meu coração geme baixinho, esperando o Teu juízo, o que vem de Ti, que apareceste e que tudo iluminaste [...]
Dá-me um sinal claro, purifica os meus erros escondidos, pois as feridas minam-me [...] A Teus joelhos me rojo, Salvador, como a hemorroísa. Também eu toco na fímbria da Tua túnica e digo: «Se ao menos tocar nas Suas vestes, ficarei curado.» (Mc 5, 28). Não faças vã a minha fé, Tu, que és médico das almas [...]. Encontrar-Te-ei, para minha salvação, a Ti, que apareceste e que tudo iluminaste.

Hoje o céu abriu-se, o Espírito desceu sobre Jesus e a voz do Pai domina as águas: Tu és o meu Filho muito amado (versículo do Aleluia)

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Hoje nasceu o Sol sem ocaso e o mundo está iluminado com a luz do Senhor. [...] Hoje as nuvens derramam sobre a humanidade uma rosácea celeste de justiça. Hoje Aquele que não foi criado permite que Aquele que criou Lhe imponha a mão. Hoje o profeta e precursor chega antes do seu Mestre, mas fica ao seu lado, a tremer, ao ver a condescendência de Deus para connosco.
Hoje as marés do Jordão transformam-se em fonte de salvação na presença do Senhor. [...] Hoje as ofensas dos homens são apagadas nas águas do Jordão. Hoje o paraíso abre-se diante da humanidade e o Sol da justiça brilha sobre nós (Mal 3, 20) [...] Hoje o Mestre dispõe-Se a ser baptizado para salvar o género humano. Hoje Aquele que não Se pode baixar inclina-Se diante do Seu servidor para nos livrar da escravatura. Hoje adquirimos o Reino dos céus, pois o Reino do Senhor  não terá fim.
Hoje a terra e o céu partilham da alegria do mundo e o mundo está cheio de júbilo. «Ao verem-Vos, as águas, oh Deus, as águas tremeram» (Sl 77, 17). «O Jordão voltou para trás» (Sl 113, 3) ao ver o fogo da divindade vir até ele em corpo e descer à sua corrente. O Jordão voltou para trás ao ver o Espírito Santo descer do céu transformado em pomba e pairar sobre Ti. O Jordão voltou para trás ao ver o Invisível tornar-Se visível, o Criador fazer-Se carne, o Senhor tomar a aparência de um escravo. [...] As nuvens fizeram escutar a sua voz na admiração que lhes causava a vinda a nós da Luz da Luz, do Deus verdadeiro de Deus verdadeiro.
É a festa do Senhor que nós vemos hoje no Jordão. Vemo-Lo deitar ao Jordão a morte que nos valeu a desobediência, o aguilhão do erro, as correntes do inferno e dar ao mundo o baptismo da salvação.       

A fim de que todo o homem que crê obtenha por Ele a vida eterna

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A figura é uma forma de expor, por imitação, as coisas que esperamos. Por exemplo, Adão é a prefiguração do Adão que iria chegar (1Cor 15, 45) e o rochedo [no deserto, durante o Êxodo] é figurativamente Cristo; a água que corre do rochedo é a figura do poder vivificante do Verbo (Ex 17, 6; 1Cor 10, 4), porque Ele disse: «Se alguém tem sede, venha a Mim e beba» (Jo 7, 37). O maná é a prefiguração do «pão vivo que desceu do céu» (Jo 6, 51); e a serpente colocada sobre um poste é a figura da Paixão, da nossa salvação consumada na cruz, pois os que olhavam para ela eram salvos (Nm 21, 9). Do mesmo modo, aquilo que as Escrituras dizem dos Israelitas que saíram do Egipto foi narrado como uma prefiguração dos que são salvos através do baptismo; pois os primogénitos dos israelitas foram salvos [...] pela graça concedida aos que tinham sido marcados com o sangue do cordeiro pascal e esse sangue prefigurava o sangue de Cristo. [...]
Quanto ao mar e à nuvem (Ex 14), nessa época conduziam à fé pela admiração; mas para o futuro, figuravam a graça que estava para chegar. «Quem for sábio compreenderá as coisas!» (Sl 106,43) Compreenderá que o mar, prefigurando o baptismo, os separava do Faraó como o baptismo nos faz escapar à tirania do demónio. Outrora o mar sufocou em si o inimigo; hoje morre a inimizade que nos separava de Deus. Do mar, o povo saiu são e salvo; e nós saímos das águas como que revivendo de entre os mortos, salvos pela graça d’Aquele que nos chamou. Quanto à nuvem, ela era a sombra do dom do Espírito, que nos refresca os membros ao apagar a chama das paixões.   

Pela fé, receber a cura e entrar na verdadeira vida

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Naaman era sírio, tinha lepra e ninguém conseguia purificá-lo da doença. [...] Foi a Israel e Eliseu ordenou-lhe que se banhasse sete vezes no Jordão. Então Naaman pensou que os rios da sua pátria tinham águas melhores, nas quais ele se tinha banhado muitas vezes sem ter sido purificado da lepra. [...] Mas acabou por se banhar e, imediatamente purificado, compreendeu que a purificação não vem das águas, mas da graça. [...]
Foi por isso que [no dia do teu baptismo] te disseram: não creias apenas naquilo que vês, porque poderias dizer, também tu, como Naaman. É esse o grande mistério que «nem o olho viu, nem o ouvido ouviu, nem jamais passou pelo pensamento do homem» (1Cor 2, 9)? Vejo água, como sempre vi! Terá esta água o poder de me purificar, quando tantas vezes me banhei nela sem ser purificado? Aprende que a água não purifica sem o Espírito.
E foi por isso que leste que, no baptismo, «três são os que testificam: o Espírito, a água e o sangue» (1Jo 5, 7-8). É que, se retirares um que seja, o sacramento do baptismo desaparece. Com efeito, o que é a água sem a cruz de Cristo? É um vulgar elemento, sem qualquer alcance sacramental. E, da mesma maneira, sem água não há mistério do novo nascimento, porque «quem não nascer da água e do espírito não pode entrar no Reino de Deus» (Jo 3, 5). O catecúmeno acredita na cruz do Senhor Jesus, cujo sinal recebeu; mas, se não tiver sido baptizado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, não pode receber o perdão dos seus pecados, nem acolher o dom da graça espiritual.
O sírio Naaman mergulhou sete vezes, segundo a Lei; tu, porém, foste baptizado em nome da Trindade. Tu confessaste a tua fé no Pai, confessaste a tua fé no Filho, confessaste a tua fé no Espírito Santo. Recorda a sucessão destes factos. Nesta fé, morreste para o mundo, ressuscitaste para Deus.

A Quaresma conduz ao Batismo

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Aproximaste-te, viste a pia baptismal e viste também o bispo perto da pia. E sem dúvida surgiu na tua alma o mesmo pensamento que se insinuou na de Naaman, o sírio. Pois, embora tenha sido purificado, inicialmente ele duvidara. [...] Temo que alguém tenha dito: «É apenas isto?» Sim, realmente é apenas isto: ali encontra-se toda a inocência, toda a piedade, toda a graça, toda a santidade. Viste o que conseguiste ver com os olhos do corpo [...]; aquilo que não se vê é muito maior [...], porque aquilo que não se vê é eterno [...]. Que haverá de mais surpreendente do que a travessia do Mar Vermelho pelos israelitas, para não falarmos agora apenas do baptismo? E, no entanto, todos os que o atravessaram morreram no deserto. Pelo contrário, aquele que atravessa a pia baptismal, isto é, aquele que passa dos bens terrestres para os do céu [...], não morre, mas ressuscita.
Naaman era leproso. [...] Ao vê-lo chegar, o profeta disse-lhe: «Vai, entra no Jordão, banha-te e ficarás curado.» Ele pôs-se a reflectir em si mesmo e disse para consigo: «É apenas isto? Vim da Síria à Judeia e disseram-me: vai até ao Jordão, banha-te e ficarás curado. Como se não houvesse rios melhores no meu país!» Os servos diziam-lhe: «Senhor, por que não fazes o que diz o profeta? Fá-lo, experimenta.» Então ele foi até ao Jordão, banhou-se e ficou curado.
Que significa isto? Viste a água, mas nem toda a água cura; mas a água que contém em si a graça de Cristo cura. Há uma diferença entre o elemento e a santificação, entre o acto e a eficácia. O acto realiza-se com água, mas a eficácia vem do Espírito Santo. A água não cura se o Espírito Santo não tiver descido e consagrado aquela água. Leste que quando nosso Senhor Jesus Cristo instituiu o rito do baptismo, veio ter com João e este disse-Lhe: «Eu é que tenho necessidade de ser baptizado por Ti. E Tu vens até mim?» (Mt 3,14). [...] Cristo desceu; João, que baptizava, estava a Seu lado; e eis que, como uma pomba, o Espírito Santo desceu. [...] Por que desceu Cristo primeiro e em seguida o Espírito Santo? Por que razão? Para que o Senhor não parecesse ter necessidade do sacramento da santificação: é Ele que santifica; e é também o Espírito que santifica.

«Queres ficar são?»

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O paralítico da piscina de Betzatá esperava um homem [para o ajudar a descer à piscina]. Quem era esse homem, a não ser o Senhor Jesus, nascido da Virgem? Com a Sua vinda, Ele não prefigurou apenas a cura de algumas pessoas; Ele era a própria verdade que cura todos os homens. Por conseguinte, era Ele que se esperava que descesse, Ele de Quem Deus Pai disse a João Baptista: «Aquele sobre Quem vires o Espírito descer e permanecer é que baptiza no Espírito Santo» (Jo 1, 33). [...] Então, por que desceu o Espírito como uma pomba, se não para que tu a visses e reconhecesses que a pomba enviada da arca por Noé, o justo, era uma imagem desta outra pomba, de modo a que nela reconhecesses a prefiguração do sacramento do Baptismo? [...]
Podes estar ainda na dúvida, quando o Pai proclama para ti de maneira indubitável no Evangelho: «Este é o meu Filho muito amado, no qual pus todo o Meu agrado» (Mt 3, 17); quando o Filho o proclama, Ele sobre Quem o Espírito Santo se manifestou sob forma de pomba; quando o Espírito Santo também o proclama, Ele que desceu sob forma de pomba; quando David o proclama: «A voz do Senhor ressoa sobre as águas, o Deus glorioso faz ecoar o seu trovão, o Senhor está sobre a vastidão das águas» (Sl 28, 3)? A Escritura atesta também que, às preces de Gedeão, o fogo desceu do céu; e que, à prece de Elias, o fogo foi enviado para consagrar o sacrifício (Jg 6, 21; 1R 18, 38).
Não consideres o mérito pessoal dos sacerdotes, mas a sua função [...]. Por conseguinte, acredita que o Senhor Jesus está lá, invocado pela oração dos sacerdotes, Ele que disse: «Pois, onde estiverem dois ou três reunidos em Meu nome, Eu estou no meio deles» (Mt 18, 20). Por maioria de razão, onde está a Igreja, onde estão os mistérios, é lá que Ele se digna conceder-nos a Sua presença. Desceste ao baptistério. Recorda o que disseste: que crês no Pai, que crês no Filho, que crês no Espírito Santo. [...] Pelo mesmo compromisso da tua palavra, quiseste crer no Filho da mesma maneira que crês no Pai, acreditar no Espírito Santo da mesma maneira que crês no filho, apenas com a diferença que professas que é necessário crer na cruz do único Senhor Jesus.
Santo Ambrósio (c. 340-397), Bispo de Milão e Doutor da Igreja
Sobre os mistérios, 24s (trad. breviário rev.)
Fonte: Evangelho Cotidiano

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