quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Igreja Anglicana: Primaz prestes a renunciar? Comentário de um vaticanista


[IHU]


14/9/2011  

Rowan Williams
O arcebispo de Canterbury, Rowan Williams, líder espiritual dos anglicanos, pretende renunciar no próximo ano. A notícia, que não foi desmentida no Palácio de Lambeth, repercutiu no domingo em alguns meios de comunicação ingleses que falam de conflitos internos na Igreja Anglicana.
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vatican Insider, 13-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em essência, as fontes de divisão são as posições sobre os temas quentes da agenda da Comunhão Anglicana, das ordenações de sacerdotes gays à bênção dos casamentos entre homossexuais.
Há anos, a alma mais pura do anglicanismo contesta essa nova linha "liberal" que, ao contrário, Williams parece apoiar. Assim, por causa de uma situação interna que se tornou cada vez mais difícil, ocorrerá a possível e clamorosa renúncia de Williams.
Para voltar à vida acadêmica, o líder da Comunhão Anglicana poderia deixar o seu posto quase uma década antes do prazo previsto. Williams, de 61 anos, que se empenhou intensamente para conter os contragolpes das rupturas causadas na Comunidade Anglicana mundial pelas questões da ordenação de mulheres e de bispos homossexuais, seria esperado em um posto no corpo acadêmico da Universidade de Cambridge.
Os rumores provenientes da Grã-Bretanha repercutiram no Vaticano, onde Rowan goza de uma boa reputação, especialmente depois da calorosa acolhida que ele deu, em setembro de 2010, a Bento XVI, durante a sua viagem apostólica à Escócia e à Inglaterra. Um ano e meio atrás, o chefe dos anglicanos havia determinado que "a Igreja Anglicana não tem nenhum problema em nomear bispos pessoas homossexuais, contanto que sejam respeitadas as tradições e os padrões históricos que exigem que os padres gays permaneçam célibes". O "sim" aos bispos gays havia levantado uma onda de reações e de polêmicas dentro do mundo anglicano, tanto da parte liberal quanto da conservadora. A intenção era a de manter unida a Igreja da Inglaterra, mas parece ter tido o efeito oposto, a partir da ameaça de um cisma conservador depois da nomeação a bispo de Jeffrey John, unido civilmente a um outro homem.
"O custo para toda a Igreja seria muito alto se a tolerância aos gays tivesse que ser levada até o ponto de aceitar padres e bispos com relações ativas", afirmou Williams, em setembro de 2010, embora dizendo-se consciente, desde a sua nomeação a bispo de Canterbury, que a questão homossexual é "uma ferida para todo o ministério".
Apesar das atuais dificuldades entre anglicanos e católicos sobre as questões de caráter teológico e ético, Bento XVI promoveu com decisão o diálogo, recebendo em audiência no dia 23 de novembro de 2010 o primaz da Comunhão Anglicana, o arcebispo de Canterbury (acompanhado de sua esposa, Jane, e do filho, Philip) em uma data fortemente simbólica: o 40º aniversário do histórico encontro entre o então arcebispo de Canterbury, Michael Ramsey, e o Papa Paulo VI. Um "face a face" de porte epocal, que deu origem a uma nova era de relações depois da ruptura ocorrida no tempo de Henrique VIII no século XVI.
O arcebispo Williams falou abertamente ao Papa Ratzinger sobre a tensões e as dificuldades que afligem a Comunhão Anglicana e, assim, sobre a incerteza do futuro da própria Comunhão. Desdobramentos recentes, especialmente no tocante ao ministério ordenado e a certos ensinamentos morais, afetaram não só as relações internas da Comunhão Anglicana, mas também as relações entre a Comunhão Anglicana e a Igreja Católica.
A decisão da Igreja de Inglaterra de aprovar a ordenação sacerdotal de mulheres em 1992 tornou-se um dos problemas no caminho rumo à plena unidade entre as duas Igrejas. Em 2003, bispos anglicanos da África, Ásia e América Latina criticaram duramente a decisão da Igreja Episcopal dos Estados Unidos (pertencente à Comunhão Anglicana) de nomear bispo um homossexual de New Hampshire. A Igreja Episcopal dos Estados Unidos também nomeou como presidente, pela primeira vez, uma mulher, Katharine Jefferts Schori, até recentemente bispa de Nevada.
Há anos, na verdade, a questão dos padres abertamente homossexuais promovidos a bispos levanta em todo o mundo um ardente debate. Ainda em novembro de 2003, a consagração de Gene Robinson, gay declarado, a bispo coadjutor da diocese episcopal de New Hampshire (EUA), ameaçou tornar real o cisma entre anglicanos e episcopais.
Rowan Williams, galês, é considerado um dos homens mais cultos do nosso tempo. Conhece e fala oito idiomas. Graduado em filosofia e em teologia, passou a maior parte de sua vida como professor nas duas universidades inglesas mais importantes, a de Cambridge e a de Oxford. Desde 1981, está casado com Jane Paul, também teóloga e professora universitária, com quem teve dois filhos.
"A formação religiosa do arcebispo tem características muito especiais. É o fruto do amor e do conhecimento das várias formas em que, ao longo dos séculos, se dividiu a religião cristã", explica o escritor católico Renzo Allegri. "Ele vem de uma família de luteranos-jansenistas, que deram as bases para a sua fé religiosa. Mas, desde jovem, quis ser educado na tradição anglo-católica e depois, como adulto, se apaixonou pelo estudo da tradição russo-ortodoxa. O ecumenismo é, portanto, um elemento inato do seu espírito. Uma característica muito surpreendente desse personagem é o fato de que ele é também um dos grandes poetas do nosso tempo. É contado entre os clássicos modernos, como Thomas Stearns Eliot, por exemplo".

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