[IHU]
3/9/2011
“Deve-se
notar que Mateus está se referindo aqui a nenhuma estrutura hierárquica de sua
Igreja do primeiro século... O que significa que a responsabilidade pelo ser
juntos e pelo viver juntos dos discípulos é confiada a todos os membros da
Igreja, a todos os cristãos, para garantir a unidade de toda a Igreja”, afirma
o padre Raymond Gravel no seu comentário das leituras do 23º
Domingo do Tempo Comum – 04 de setembro de 2011.
As reflexões
de Raymond Gravel estão publicadas no sítio Culture et Foi. A
tradução é do Cepat.
Seguem as
reflexões.
Referências
Bíblicas: Primeira Leitura: Ez 33, 7-9
Segunda Leitura: Rm 13, 8-10
Evangelho: Mt 18, 15-20
Segunda Leitura: Rm 13, 8-10
Evangelho: Mt 18, 15-20
Hoje começa
o quarto dos cinco discursos de Mateus e diz respeito à Igreja, à vida em
comunidade. A grande questão à qual esse discurso quer responder é a seguinte:
como garantir a unidade da Igreja, uma vez que é composta de homens e mulheres
diferentes, limitados e frágeis? Em relação à leitura do Evangelho de hoje e da
primeira leitura, tirada do profeta Ezequiel, há um perigo que nos espreita na
interpretação literal e legalista desses textos, o de que a interpretação contradiz
a mensagem do evangelista Mateus.
1. A
responsabilidade cristã.
Infelizmente, durante muito tempo esta passagem foi chamada de “A correção
fraterna”. Esta expressão tem necessariamente uma conotação negativa e
pejorativa de punição. Parece-me que o termo mais apropriado seria "O
viver juntos dos discípulos" e "A responsabilidade cristã", ou
seja, alguns que se encarregam de outros, respeitando a individualidade de cada
um. Além disso, deve-se notar que Mateus está se referindo aqui a nenhuma
estrutura hierárquica de sua Igreja do primeiro século... O que significa que a
responsabilidade pelo ser juntos e pelo viver juntos dos discípulos é confiada
a todos os membros da Igreja, a todos os cristãos, para garantir a unidade de
toda a Igreja.
Basicamente,
Mateus não reconhece um poder específico aos dirigentes para garantir a unidade
da Igreja; ele reconhece, no entanto, uma responsabilidade partilhada de todos
os discípulos da Igreja do seu tempo. Cabe a cada cristão trabalhar para
construir a unidade, e isso só é possível se cada um for responsável pelo
outro, pelos outros...
2. Tornar-se
vigia. Mas como garantir a unidade da Igreja, uma vez
que todas e todos somos seres humanos limitados e frágeis? Existe uma expressão
na primeira leitura de hoje que é muito bonita, mas que precisa ser explicada:
cada crente é chamado a ser um "vigia", missão confiada ao profeta
Ezequiel, na primeira leitura de hoje. O que significa ser vigia? (Ez 33, 7).
Ser vigia
não é espionar as pessoas para encontrar nelas falhas ou culpas, a fim de
denunciá-las e puni-las. Se este for o sentido que lhe dermos, ele supõe que
ela ou ele que vigia é perfeito e nele não há nada que precise ser reprovado.
Esse é, geralmente, o comportamento dos legalistas e fariseus. Ser vigia
significa ser um sentinela para os outros para protegê-los dos perigos que os
ameaçam. Isso também supõe que a pessoa que desempenha esse papel, reconhece
suas próprias limitações e pode compartilhar sua experiência com os outros,
respeitando a sua liberdade. Mateus, no seu evangelho, oferece uma caminhada em
três tempos...
3. Um vigia
cristão. Quando um irmão ou irmã, portanto um discípulo,
cometeu um pecado, não uma falha pessoal, mas um ato que rompe a unidade da
comunidade (Mt 18, 15a), Mateus oferece um processo em três etapas.
Primeira
etapa: "Vá e mostre o erro dele, mas em particular,
só entre vocês dois" (Mt 18,15b). O resultado desta abordagem dependerá da
atitude que eu tiver para com o meu irmão ou minha irmã: se eu pedir para
encontrá-lo com uma atitude condescendente e desdenhosa em relação a ele por
sua ação, é evidente que eu devo passar diretamente para a segunda etapa.
Entretanto, se eu me reconheço tão frágil quanto ele e eu me mostro cheio de
compreensão e compaixão para com ele, haverá boas chances de que o problema
será resolvido rapidamente.
Segunda
etapa: "Se ele não lhe der ouvir, tome com você uma
ou duas pessoas, para que toda a questão seja decidida sob a palavra de duas ou
três testemunhas" (Mt 18, 16). Novamente, esta reunião de várias pessoas
pode ser bem sucedida, se a palavra de duas ou três testemunhas for uma
mensagem de reconciliação e de amor. O amor é a única dívida que devemos ter
para com os outros: "Não fiquem devendo nada a ninguém, a não ser o amor
mútuo. Pois quem ama o próximo cumpriu plenamente a Lei" (Rm 13, 8). Se um
irmão ou irmã, culpado de ter quebrado a unidade da comunidade, não se sente
amado por aqueles que vêm para reconciliá-lo, é óbvio que passamos
automaticamente para a terceira etapa. Mas se ele sente que é ouvido e
compreendido, é provável que o conflito seja resolvido ali mesmo.
Terceira
etapa: "Caso ele não dê ouvidos, comunique à
Igreja. Se nem mesmo à Igreja ele der ouvidos, seja tratado como se fosse um
pagão ou um cobrador de impostos" (Mateus 18, 17). Infelizmente, esta
etapa nem sempre foi bem interpretada na Igreja. Por muito tempo, serviu para
justificar as condenações, os julgamentos, as exclusões e as excomunhões na
Igreja... E, portanto, se Mateus nos convida a considerar um irmão ou irmã, no
final do processo, como um pagão ou um publicano, todos nós sabemos qual o
lugar que os gentios e os cobradores de impostos ocupam no coração do Cristo
ressuscitado. Ele os prefere aos outros, de sorte que ele nunca hesitou em
recomendá-los, em dar-lhes um exemplo e em incluí-los na comunidade.
Deve ser
visto como um convite a nos redobrar de empatia, de compaixão, de reconciliação
e de amor por um irmão ou irmã, tornado pagão ou publicano. Tanto mais que a
parábola que precede o relato de Mateus de hoje é a parábola da ovelha perdida
e reencontrada (Mt 18, 10-14), que termina da seguinte maneira: "Do mesmo
modo, o Pai que está no céu não quer que nenhum desses pequeninos se
perca" (Mt 18, 14). E a passagem que segue é a resposta dada a Pedro que
pergunta a Jesus quantas vezes deve perdoar seu irmão (Mt 18, 21). Jesus
respondeu: "Não lhe digo que até sete vezes, mas até setenta vezes
sete" (Mateus 18, 22)... Portanto, o perdão é ilimitado e incondicional.
4. Uma
Igreja da reconciliação e da inclusão. Ao longo
dos Evangelhos, a mensagem do Cristo ressuscitado é um convite à reconciliação,
ao perdão, à partilha, à inclusão, ao respeito, à liberdade, à justiça, à paz,
à esperança e ao amor... e o evangelista Mateus parece reconhecer em todos os
cristãos o poder de perdoar ou de reter o perdão: "Eu lhes garanto: tudo o
que vocês ligarem na terra, será ligado no céu, e tudo o que vocês desligarem
na terra, será desligado no céu" (Mt 18, 18). Esta frase não é um convite
para recusar o perdão; ela diz simplesmente que os discípulos de Cristo têm a
capacidade de recusá-lo, assim como eles têm a capacidade de oferecê-lo
gratuitamente... Não é isso que Cristo fez e ele nos convida a fazer hoje?
Portanto, à
questão, pode-se excluir alguém da comunidade, da Igreja?, penso que a resposta
é “não”! Em nome do Evangelho que nós servimos! É como a violência: não se pode
combatê-la senão pela não-violência; caso contrário, criamos situações piores
do que aquelas que queremos denunciar e corrigir. Para ilustrar meu propósito, vou
concluir justamente com uma passagem de um mestre da não-violência, Lanza
del Vasto, que disse: "Se você retribui o mal com o mal, não repara o
mal, você o aumenta. Como você pode chamar bem, o mal que faz? Se, para punir o
assassino, você o mata, isso não vai trazer de volta a vida à sua vítima. Isso
provocaria duas mortes em vez de uma e dois assassinos, ele e você... Como você
pode acreditar que é uma maneira de estancar o mal, enquanto você mesmo
acrescenta um elo ao qual outros vão se somar? Porque o perdedor aguarda a sua
hora para se vingar. E se você acabar com ele, seu irmão irá vingá-lo. Se você
o reduzir à servidão, você se verá ligado à outra extremidade da sua corda. A
violência é um encadeamento. Quem pensa se libertar por ela, forja sua próxima
cadeia... Só a não-violência é solução eficaz, ruptura da cadeia de libertação.
Mesmo se o adversário for tão teimoso e tão errante que você não possa chegar
ao fim, a luta vai lhe forçar a vitórias sobre si mesmo, a experiências e
descobertas interiores, cujos frutos irá colher".
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