[bibliacatolica]
6 dezembro 2011
Fonte: Apologistas Católicos
Um dos grandes mistérios da teologia judaico-cristã é a existência do
mal, porque Deus permitiu o seu surgimento, existência e os detalhes
sobre a sua origem. Dois fatos, porém, são claros: ele existe e ele será
derrotado.
Textos como os de Ez. 28,12 – 15 e Lc.10,18 indicam
que houve uma rebelião liderada por um anjo de luz (lúcifer), que,
exercendo o seu livre arbítrio, optou pelo não-bem e pela ruptura de
comunhão contra o Criador. Deus cria um lugar-estado (inferno) e para lá
os lança (II Pe. 2,4).
O chefe desses anjos caídos é denominado
de lúcifer ou satanás (hebraico = adversário), recebendo outros, como:
belzebu, belial, o maligno, o príncipe deste mundo, diabo (grego =
instigador, acusador).
Satanás lidera os demônios que:
1.
São seres espirituais com personalidade e inteligência. Como súditos de
satanás, inimigos de Deus e dos seres humanos (Mt.12,43 – 45);
2. São malignos, destrutivos e estão sob a autoridade de Satanás.
3. São numerosos (Mc. 5,9; Ap. 12,41).
Eles
mantêm a forma angélica, com a natureza voltada para o mal. Têm
inteligência e conhecimento, mas não podem conhecer os pensamentos
íntimos das pessoas e nem obrigá-los a pecar.
Há autoridade e
organização no mundo inferior (Mt. 25,41), mas por não ser Satanás
onipresente, onipotente e onisciente (atributos exclusivos de Deus), ele
age por delegação a seus inúmeros demônios (Mt. 8,28; Ap.16,1 – 14).
A teologia cristã tem percebido, a partir da Bíblia e da experiência, os seguintes ministérios demoníacos:
a) indução à desobediência a Deus e aos seus mandamentos;
b) propagação do erro e da falsa doutrina;
c) indução à mentira (“pai da mentira”) e à corrupção;
d) provocação de rebeldia nas pessoas que sofrem provações;
e) influência negativa sobre o corpo, os sentidos e a imaginação;
f) influência sobre os bens materiais (apego vs. perda);
g) realização de efeitos extraordinários, com aparência de milagres;
h) indução a sentimentos negativos, como o temor, a angústia e o ódio;
i) promoção da idolatria, da superstição, da necromancia, da magia, do sacrilégio e do culto satânico.
O
mal esteve agindo no Pecado Original (queda), e exerce continuamente a
sua obra perversa até o fim dos tempos, como tentador (Gn. 3,1 – 5),
caluniador (Jó.1,9 – 11), causador de enfermidades (Jó. 2,7) e
arquienganador (Mt. 4,6).
Ele mantém permanente luta contra Deus e
o seu povo, procura desviar os fiéis de sua lealdade a Cristo (II Co.
11,3), induzindo-os a pecar e a viver segundo os sistemas elaborados
pela natureza corrompida ou “carne” (I Jo. 5,19).
Os cristãos
devem conhecer, pelo estudo da Bíblia e da teologia, a natureza e o
ministério do mal, para se conscientizarem e se precaverem.
O apóstolo Paulo nos exorta a nos fortalecer em Deus e no seu poder, resistindo firmes pois “a
nossa luta não é contra os seres humanos, mas contra os poderes e
autoridades, contra os dominadores desse mundo de trevas, contra as
forças espirituais do mal nas regiões celestiais” (Ef.6:12).
A
disciplina devocional, com a leitura da Bíblia, a oração, os
sacramentos, a busca de santidade, o desenvolvimento dos dons, a
comunhão do Corpo, são antídotos contra o mal.
O ministério demoníaco contra as pessoas pode se dar de três maneiras:
a) tentação: apoio a opções negativas e atinge todos os seres humanos;
b)
indução: (também chamada obsessão), uma ação mais íntima e contínua de
“assessoria” à maldade, que atinge os descrentes e os crentes carnais;
c)
possessão: quando os demônios se apoderam de corpos, controlando-os.
Para a teologia evangélica clássica isso não pode acontecer a um
convertido, cujo corpo é habitado pelo Espírito Santo.
Satanás e os demônios têm poder sobre os perdidos nesta vida e após a morte, que se destinam ao inferno.
Devemos estar advertidos para não cair em um dualismo de fundo zoroastrista. Satanás não é um ente contrário comparável a Deus.
Quem combate contra ele é o chefe dos anjos bons, e são os anjos bons que combatem os anjos maus.
Não devemos nem minimizar, nem maximizar o ministério do maligno.
Ele
já foi derrotado na cruz, e o sangue de Cristo já tem poder, a obra da
expiação já foi realizada, Cristo já ressuscitou e o Espírito Santo já
foi enviado. O resgate já se deu, é oferecido pela Graça e recebido pela
fé. O Senhor já reina sobre o universo, a História e a sua Igreja.
A perfeição da Ordem Criada (Éden) será revivida na Ordem Restaurada (Nova Jerusalém).
O
mal terá um fim, quando satanás e os demônios forem todos lançados no
lago do fogo (Mt. 25,41), também chamado de “segunda morte” (Ap. 20,14).
Devemos
evitar cair na irresponsabilidade moral atribuindo aos demônios os
males que são fruto de nossa opção, com natureza caída e pecadores. Não
sejamos, portanto, ”caluniadores de satanás”.
O racionalismo e o liberalismo teológico haviam negado a existência de Satanás e dos demônios.
A
teologia conservadora clássica (como fizera com os anjos bons),
afirmava a sua existência, mas pouco elabora na prática do cotidiano dos
fiéis. O pós-pentecostalismo e a teologia da “batalha espiritual” os
vulgarizou e hipertrofiou o seu poder, além de, em uma atitude
irracional, anti-científica e anti-bíblica, atribuir tudo aos mesmos.
Nem indiferenças, nem irresponsabilidade, nem angústia opressiva.
Devemos
rejeitar as representações pictóricas aterradoras (fruto da imaginação
dos artistas), pois o mal não é incompetente em “marketing” ou em
“relações públicas”, podendo aparentar beleza, bondade e prodígio.
O mal, que ele nos tenta, pode estar em nosso caráter, em nosso temperamento, e em nossa ética.
Devemos
evitar o dualismo de fundo bramânico, entre “alma” (boa) e “corpo”
(ruim). O ser humano foi criado integrado, caiu integrado e é restaurado
integrado. “Carne” na Bíblia não é igual a Corpo (muito menos a
sexualidade) mas a natureza caída (integrada). Lutero disse: “Jesus veio em carne e não pecou; Satanás não tem carne e peca todo o tempo”.
A
Palavra e o Espírito vão nos libertando dos condicionamentos culturais e
nos forjando como “novas criaturas”. A presente ordem, e o poder do
mal, são transitórias. A nossa esperança é escatológica, “pois a antiga
ordem já passou” (Ap. 21,4b).
Conclusões
Com
o ocaso da modernidade vão-se os seus mitos: a bondade natural, o
progresso, a razão (ciência) e as utopias globais. Volta a ambigüidade
moral (e o pecado), os avanços e as decadências, a sensação de limitação
nos empreendimentos e instituições humanas, e a redescoberta do
além-razão no ser humano: o místico, o estético, o erótico, o lúdico, o
intuitivo etc.
Há uma redescoberta do antes desvalorizado. A
construção do futuro, porém, não se faz com um mero retorno ao passado
(e aos seus males). O angélico e o demoníaco voltam como temas e
realidades, vencendo-se, porém, os “sincretismos protestantes” e as
“superstições evangélicas”, estranhas ao espírito e a proposta da
Reforma.
Nem o reducionismo psicanalítico, nem o reducionismo dos “cultos de descarrego”.
A
consciência do místico, do transcendente e do espiritual, não nos leva à
alienação da História e das nossas responsabilidades como cidadãos e
pessoas plenas.
Pois o bem e o mal, e suas potestades, se
relacionam com os poderes políticos históricos, como procurou demonstrar
Agostinho de Hipona em sua “Cidade de Deus”.
Que os Anjos do Senhor acampem ao redor de nós.
Artigo originalmente escrito por: Padre Félix, Uma demonologia bíblica. Disponível em:
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