Ordinariato para membros da Igreja Episcopal que queiram mudar para o catolicismo desafia tradição do celibato
No primeiro dia do Ano Novo, o Vaticano anunciou a formação de um ordinariato (noticia publicada em 07/01/2012)
- uma espécie de diocese sem fronteiras - para que os sacerdotes da
Igreja Episcopal e suas congregações pudessem se juntar ao catolicismo
romano. A grande novidade não é que alguns episcopais terão rápido
acesso ao catolicismo, mas que em breve haverá ainda mais padres casados
nos Estados Unidos.
E padres casados criam dúvidas provocadoras sobre os fundamentos da
Igreja Católica, cuja escassez de clérigos vem piorando a cada dia.
O reverendo Jay Scott Newman, padre católico que não se importa com o fato de alguns colegas serem casados
A maioria dos americanos - talvez a maioria dos católicos americanos -
não sabe que a Igreja permite que padres sejam casados. Sempre houve
padres casados nos ritos não-latinos, como o catolicismo maronita ou o
catolicismo ucraniano. Essas igrejas são totalmente católicas,
obedientes ao papa, mas ordenam homens casados, embora eles permitam que
padres solteiros se casem após terem assumido o sacerdócio.
Alguns padres do catolicismo romano também foram casados, pelo menos
até o Primeiro Concílio de Latrão, em 1123, que proibiu a prática.
Padres católicos casados puderam novamente ter esposas em 1980, quando a
Igreja disse que os clérigos protestantes que se tornassem padres
católicos poderiam permanecer casados.
Existem cerca de 80 padres católicos desse tipo nos Estados Unidos,
diz o reverendo Paul D. Sullins, sociólogo da Universidade Católica em
Washington. Ele, que foi um padre episcopal, agora ele é um padre
católico casado.
Sullins já entrevistou mais de 70 padres casados e muitas de suas
esposas para um livro que está escrevendo. Ele diz que a grande maioria
dos sacerdotes são ex-episcopais, embora alguns tenham vinco de outras
denominações protestantes.
O pequeno grupo de padres casados cria várias dúvidas. Primeiro, eles
estão fazendo um trabalho tão bom quanto os outros padres? Se a igreja
decidiu que o celibato confere certos dons aos sacerdotes, seria correto
dizer que padres casados são menos capacitados para servir suas
congregações? Além disso, será que os padres que adotaram o celibato
não têm inveja dos padres que podem servir a Deus e também fazer sexo?
Por outro lado, se os padres casados estão fazendo um bom trabalho e não
provocam esta inveja, por que então manter a regra do celibato para os
sacerdotes em geral?
Para responder à primeira pergunta, é importante compreender a razão
para a regra do celibato. "O celibato" refere-se a uma vida sem
casamento; "continência" é o termo para uma vida sem atividade sexual.
Em princípio, padres celibatários são também continentes. A Igreja nunca
ensinou que o celibato é necessário para o sacerdócio, mas a tradição
diz que um sacerdote que realiza os sacramentos representa Jesus Cristo,
que era solteiro. Esta ideia do sacerdote in persona Christi, ou na
pessoa de Cristo, é também um dos principais motivos pelo qual mulheres
não podem assumir o sacerdócio.
Além disso, segundo Sullins, acredita-se que "se um homem não é
casado, ele é capaz de se dedicar mais completa e exclusivamente à sua
paróquia”. Mas ele descobriu que padres casados são geralmente
auxiliados e não prejudicados por suas esposas, que geralmente também
são muito comprometidas com a paróquia. Ele acrescenta que os sacerdotes
celibatários podem ser menos acessíveis do que os padres casados.
"A verdade é que os padres celibatários, muitas vezes têm maneiras de
se isolar", diz Sullins. "Se você ligar para a reitoria de um padre
celibatário no meio da noite, é provável que caia na caixa postal. Mas
se você ligar para a reitoria de um padre casado no meio da noite, e ele
não está muito inclinado a sair, vai receber um cutucão de sua
companheira, dizendo: 'Ei, você se comprometeu com este trabalho.'"
"Não quero dizer que a diferença é grande, mas se há uma diferença, ela é a favor do padre casado", acrescentou.
A Igreja Católica Romana tradicionalmente tem mostrado preferência
por clérigos celibatários, impedindo os padres casados de atuar em
paróquias, a menos que tenham sido permitidos por alguma circunstância
especial. Os sacerdotes episcopais que entrarem na igreja como parte do
novo ordinariato serão exceções a essa regra. E por culpa de padres
americanos, as circunstâncias já têm colocado padres casados no comando
de muitas paróquias. Na verdade, o Reverendo James Parker, o primeiro
padre casado aceito sob a Provisão Pastoral, como é conhecida a regra da
igreja estabelecida em 1980, foi encarregado por uma paróquia em
Charleston, Carolina do Sul, e aparentemente fez um bom trabalho.
"Ele era apenas um irmão entre irmãos", diz o reverendo Jay Scott
Newman, que pastoreia uma igreja em Greenville, Carolina do Sul. Para
ele, o fato de Parker ser casado "nunca foi um problema, nem por um
instante." E ele foi capaz de fazer bem o seu trabalho, assim como os
homens casados em outras profissões exigentes.
"Médicos que trabalham 80 horas por semana conseguem ter filhos",
disse Newman. "Isso pode ser feito. E estes sacerdotes fazem isso como
anglicanos" - a igreja da qual os episcopais fazem parte.
Este caloroso elogio de Newman a seu colega casado ajuda a responder a
nossa segunda questão, a da inveja. Não encontrei nenhuma evidência de
que padres celibatários ressentem seus colegas casados. Embora um
pequeno número de teólogos e canonistas tenha criticado a Provisão
Pastoral de 1980, parece que os padres não se incomodam com ela.
Mesmo Newman, por exemplo, que acredita que o celibato é uma
importante declaração da contracultura - um padre celibatário "apostou
sua vida na premissa de que esta vida não é tudo que existe e ele está
colocando a sua carne como prova disso" - diz que a Igreja pode abrir
exceções. Referindo-se a outro sacerdote casado que ele conheceu na
Carolina do Sul, Newman disse que "houve uma compreensão intuitiva entre
todos de que esta foi uma exceção à regra e não houve injustiça contra
aqueles que foram católicos ao longo de sua vida e se tornaram padres
sabendo que o celibato fazia parte”.
A posição geral da Igreja a respeito do celibato sacerdotal, de que é
ideal porém não é necessária, é enfraquecida já que alguns padres
casados parecem estar muito próximo do ideal. E à medida que a falta de
padres piora, o celibato voltará a ser debatido.
Pelo menos 25 mil americanos abandonaram o sacerdócio desde 1970,
segundo Sullins. Muitos deles esperavam que a igreja abandonasse a regra
do celibato, mas quando perceberam que a regra não iria mudar, deixaram
de ser padres e se casaram. São vinte e cinco mil ex-padres em um país
com menos de 40 mil sacerdotes hoje em dia. Celibatários ou não, todos
os católicos conseguem fazer a conta.
Por Mark Oppenheimer

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