[ihu]
12/01/2012
"Vou voltar para a Diocese de Palmares. Quanto à paróquia, é o bispo quem vai decidir", afirma o padre ao retornar ao Brasil.
Confira a entrevista.
Expulso do país há 30 anos com a acusação de ter se recusado a
celebrar uma missa em homenagem ao Dia da Independência, o padre
italiano Vito Miracapillo está de volta ao Brasil,
disposto a reassumir a Diocese de Palmares, em Pernambuco. Enquanto
resolvia os trâmites para garantir sua permanência no país, ele aceitou
conceder a entrevista a seguir por e-mail, em que esclarece quais foram
as razões que deram origem a sua expulsão. “Os verdadeiros motivos que
geraram a minha expulsão foram o trabalho pastoral que desenvolvia com o
povo e o apoio que a paróquia ofereceu aos camponeses quanto ao direito
à posse da terra na questão da Usina Caxangá”, afirma Miracapillo em
entrevista, por email, concedida à IHU On-Line..
Depois de viver os últimos 30 anos na Itália, onde atuou como diretor da pastoral missionária diocesana, Miracapillo
avalia que “com a passagem para a democracia, houve uma melhora na vida
do povo e mudança no exercício do poder e nas estruturas públicas”. Em
relação à ditadura militar, que perdurou no país de 1964 a 1985, e a
abertura dos arquivos secretos, ele é enfático: “É necessário que o
Brasil, assim como outros países já fizeram, tenha a coragem civil e
democrática de conhecer, pelo respeito devido às vítimas, a seus
familiares e às instituições do país, o que se passou naquele período
histórico e faça triunfar aí a justiça”.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O senhor foi expulso do país há trinta anos por
não aceitar celebrar uma missa em homenagem ao Dia da Independência.
Lembra desse dia?
Vito Miracapillo – Lembro sim, mas aquela motivação
só foi pretexto do poder e da ditadura, pois negamos uma missa imposta.
No domingo, celebrei três missas pela Independência e não podia celebrar
outra do jeito que queriam. Além disso, os verdadeiros motivos que geraram a minha expulsão
foram o trabalho pastoral que desenvolvia com o povo e o apoio que a
paróquia ofereceu aos camponeses quanto ao direito à posse da terra na
questão da Usina Caxangá.
IHU On-Line – Como reagiu ao receber a notícia de que seria
expulso do país? Qual foi seu sentimento? O senhor sofreu algum tipo de
perseguição política?
Vito Miracapillo – Com muita serenidade, mesmo sofrendo, pois sabia que aquele era o preço a
pagar para a transformação da realidade da Zona da Mata Sul. O sentimento maior foi de compaixão pelo povo oprimido, empobrecido e excluído e por não podermos juntos continuar aquele trabalho de transformação pacífica, profunda e real que estávamos levando adiante com os colaboradores leigos, os grupos da paróquia e as comunidades do campo. A perseguição se deu pelo poder econômico da área, que, muito ante da missa imposta, estava preparando a minha expulsão junto com autoridades, capangas e soldados.
pagar para a transformação da realidade da Zona da Mata Sul. O sentimento maior foi de compaixão pelo povo oprimido, empobrecido e excluído e por não podermos juntos continuar aquele trabalho de transformação pacífica, profunda e real que estávamos levando adiante com os colaboradores leigos, os grupos da paróquia e as comunidades do campo. A perseguição se deu pelo poder econômico da área, que, muito ante da missa imposta, estava preparando a minha expulsão junto com autoridades, capangas e soldados.
IHU On-Line – Como era a relação da Igreja com os militares no período ditatorial?
Vito Miracapillo – Muito crítica, principalmente
depois da imposição ao país do estatuto dos estrangeiros, que visava a
expulsão de missionários católicos e de refugiados políticos do cone sul
da América Latina. Essa medida foi criticada por João Paulo II, quando visitou o país, em julho de 1980. Eu me tornei a primeira vítima.
IHU On-Line – Como a Igreja brasileira se posicionou em relação à sua expulsão do país?
Vito Miracapillo – Como um corpo só, unida e firme a
meu favor. Junto com a Igreja, a grande maioria do povo brasileiro
tomou posição contra a ditadura e me acompanhou com grande solidariedade
até sair do país.
IHU On-Line – Como foi sua acolhida na Itália e como a Igreja
italiana se posicionou diante do caso? Houve alguma repercussão
internacional?
Vito Miracapillo – A acolhida na Itália foi em tom muito menor, porque por parte da Igreja temia-
se pelos outros padres que aqui trabalhavam e, por outro lado, os interesses econômicos existentes entre os dois países levou a silenciar o caso.
se pelos outros padres que aqui trabalhavam e, por outro lado, os interesses econômicos existentes entre os dois países levou a silenciar o caso.
IHU On-Line – Hoje o Brasil é mais independente do que naquela época? Em que aspectos o Brasil continua dependente, e de quem?
Vito Miracapillo – A minha afirmação de que o povo não era independente não era em relação à
independência histórica do Brasil no conjunto das nações, mas sim no que se refere à situação de exclusão e opressão em que o povo vivia e à falta de respeito de seus direitos humanos, civis, trabalhistas.
independência histórica do Brasil no conjunto das nações, mas sim no que se refere à situação de exclusão e opressão em que o povo vivia e à falta de respeito de seus direitos humanos, civis, trabalhistas.
IHU On-Line – Que atividades desenvolveu nos últimos 30 anos na Igreja italiana?
Vito Miracapillo – Desde que cheguei, o bispo me
nomeou pároco e, sendo pároco, me nomeou também diretor da pastoral
missionária diocesana. Do ano 2000 até hoje sou diretor da Pastoral
Social Diocesana e do setor de Justiça e Paz, assim como do de
Preservação do Meio Ambiente.
IHU On-Line – Quais as diferenças e aproximações entre a Igreja brasileira e a italiana?
Vito Miracapillo – As diferenças são mais devidas à
extensão do território, ao número de operadores pastorais (padres,
religiosos, freiras, pessoas engajadas), às estruturas e recursos
econômicos, à cultura e ao tipo de sociedade do que à própria vida
interna da Igreja. São muitas as afinidades existentes desde a liturgia
até a vida da caridade.
IHU On-Line – O senhor acompanhou a situação política,
econômica e social do Brasil ao longo desses 30 anos? Como analisa a
posição política do Brasil em relação à ditadura militar e a resistência
em abrir os arquivos históricos daquela época?
Vito Miracapillo – Por certo, com a passagem para a
democracia, houve uma melhora na vida do povo e mudança no exercício do
poder e nas estruturas públicas. Quanto à ditadura, é necessário que o
Brasil, assim como outros países já fizeram, tenha a coragem civil e democrática de conhecer,
pelo respeito devido às vítimas, a seus familiares e às instituições do
país, o que se passou naquele período histórico e faça triunfar aí a
justiça.
IHU On-Line – Como avalia a permanência de Severino Cavalcante no cenário político brasileiro ao longo desses 30 anos?
Vito Miracapillo – A avaliação pertence ao povo brasileiro e à sua educação política.
IHU On-Line – Como foi seu encontro com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB)?
Vito Miracapillo – Muito acolhedor e amigável. Um momento para agradecer a ajuda que deu para a revalidação de meu visto de permanência.
IHU On-Line – Qual sua expectativa ao retornar para o Brasil? Pretende reassumir a paróquia de Ribeirão, em Pernambuco?
Vito Miracapillo – Vou voltar para a Diocese de Palmares. Quanto à paróquia, é o bispo quem vai decidir.

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