09/03/2012
IHU - As lideranças dos Padres e Irmãos Maryknoll votaram a dispensa da ordem do padre Roy Bourgeois, antigo ativista da paz que foi objeto de investigação pelo seu apoio à ordenação de mulheres.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada no sítio National Catholic Reporter, 07-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada no sítio National Catholic Reporter, 07-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Embora o resultado e o momento da votação não estejam claros, o responsável pela comunicações da ordem confirmou ao NCR que ela ocorreu.
A confirmação da votação veio depois que Bourgeois disse
em uma entrevista por telefone na última terça-feira que ele havia
recebido um telefonema no fim de fevereiro do padre maryknoll Mike Duggan, superior regional da ordem nos EUA, informando-o sobre a votação.
Em uma conversa em separado, o padre dominicano Thomas Doyle, renomado canonista que tem atuado em nome de Bourgeois, disse ao NCR que ele também falou com Duggan em fevereiro.
Doyle disse que Duggan lhe
contou que o conselho geral da ordem, que consiste em seu
superior-geral e três assistentes-gerais, tinham chegado a uma decisão
dividida sobre a remoção de Bourgeois.
Como o Direito Canônico ordena que ao menos cinco pessoas votem sobre questões referentes à dispensa das ordens religiosas, Doyle disse que Duggan lhe
contara que uma quinta pessoa da ordem havia sido convidada a
participar do conselho na votação. Não foi revelado o nome dessa quinta
pessoa.
Doyle afirmou que Duggan lhe dissera que dois membros do conselho votaram a favor da demissão – o padre maryknoll Edward Dougherty, superior-geral da ordem, e o padre maryknoll Edward McGovern, um dos assistentes-gerais –, e três membros se abstiveram.
Duggan disse que o conselho enviou uma carta ao Vaticano com os resultados da votação, segundo Bourgeois e Doyle.
Respondendo a um convite para comentar o assunto, o responsável pela comunicações da ordem, Mike Virgintino, disse por telefone que "não há muita coisa que possamos dizer".
"No início, a Sociedade Maryknoll e o Pe. Roy Bourgeois concordaram
mutuamente que todas as discussões seriam realizadas privadamente, já
que a matéria envolvia a relação pessoal do Pe. Bourgeois com a sua
Igreja", escreveu Virgintino em um e-mail posterior. "A Maryknoll tem sido e continuará sendo fiel a esse acordo".
Os telefonemas para Duggan para convidá-lo para comentar não foram respondidos.
Dois advogados canônicos contatados pelo NCR se
recusaram a comentar sobre as questões canônicas concernentes a essa
votação de remoção, citando a sensibilidade do caso e a falta de
informações específicas sobre o que havia ocorrido.
Um terceiro canonista, o Pe. Francis Morrissey,
disse que era "muito difícil" avaliar a situação, porque a discussão
sobre a dispensa é "muito técnica" e envolve "muitas hipóteses".
Doyle e Bourgeois manifestaram
alguma frustração pela falta de comunicação oficial por parte das
lideranças. Doyle disse que havia escrito "13 ou 14" cartas a Dougherty no ano passado sobre o caso e que recebera "apenas duas respostas".
Erros canônicos
Em janeiro, Bourgeois tinha ouvido falar de membros maryknolls anônimos que o conselho geral havia votado a sua demissão. Doyle escreveu uma carta no dia 24 de janeiro endereçada a Dougherty, ao conselho geral e a Duggan pedindo esclarecimentos.
Se a votação ocorreu sem notificar Burgeois, escreveu Doyle na época, então "algo está claramente errado com a aplicação das normas canônicas".
McGovern respondeu a Doyle com uma carta datada de 30 de janeiro, à qual o NCR teve acesso. McGovern disse que estava respondendo em nome de Dougherty, já que Dougherty estava no exterior, e que o superior-geral entraria "em contato posterior", assim que retornasse ao país.
"Eu não tenho notícias dele desde então", disse Doyle, que é mais conhecido pela sua defesa em nome das vítimas de abuso sexual por parte do clero. "Eles votaram a dispensa de Bourgeois e enviaram isso ao Vaticano. Roy não tinha nem ideia de que isso estava acontecendo, e nem eu, e eu sou seu advogado".
Bourgeois disse ao NCR que ele sentia que a Maryknoll deveria ser mais aberta sobre o processo, "no espírito de transparência e no espírito da nossa comunidade e abertura".
Fazendo
referência ao fato de ter sido um membro da comunidade por 46 anos, ele
disse que, "por causa das possíveis consequências com as quais estamos
lidando aqui", qualquer membro da Maryknoll que enfrente tal situação "deve ter o direito de ter acesso ao que está sendo dito ao Vaticano".
"Não é apenas com relação a mim", disse Bourgeois. "Trata-se de transparência".
Questões em aberto
Entre as possíveis questões levantadas por uma votação de dispensa, encontra-se qual congregação vaticana a Maryknoll pode ter contatado sobre a possível remoção e quais abstenções efetivas estiveram em questão, disse Morrissey.
Quanto ao comentário de Doyle de que três das cinco pessoas na votação se abstiveram, Morrissey disse
que os cânones que tratam da remoção de membros de ordens religiosas
"não dizem nada" sobre abstenções, "só que deve haver ao menos cinco
votos".
De acordo com esses cânones, ou seja, os números 699 e
700, a dispensa só pode ocorrer depois de que o superior-geral de uma
ordem consulte o seu conselho geral e "proceda colegialmente com toda a
ponderação ao exame das provas, dos argumentos e da defesa".
Se
os procedimento dessa discussão são secretos, os cânones afirmam que o
superior-geral deve "lavrar o decreto de demissão, expressando nele para
a validade ao menos sumariamente as razões de direito e de fato".
Morrissey, que um Oblato de Maria Imaculada e professor da universidade católica Saint Paul, de Ottawa, disse que outro cânone, que trata da assunção de atos jurídicos, pode ser aplicável nesse caso.
Esse
cânone, 127, afirma que exige-se "a maioria absoluta dos presentes" em
alguns casos em que a lei prescreve que um superior-geral "necessita do
consentimento ou do parecer de algumas pessoas" na tomada de
determinadas ações.
Embora Morrissey tenha dito
que não estava certo de que esse cânone se aplicaria a essa situação,
ele também disse que, simplesmente, "dois de um total de cinco não
seriam a maioria dos presentes".
Em resposta a um pedido anterior para comentar a situação, uma declaração dos Padres e Irmãos Maryknoll disseram que a ordem se comunica com "muitas congregações e dicastérios" do Vaticano.
"Sobre essa questão, e sobre as muitas questões na Maryknoll em
que pregamos o Evangelho e ajudamos as pessoas pobres do nosso mundo
onde servimos em missão, a Sociedade continuamente dialoga privadamente e
em confiança com a Santa Sé sobre como melhor realizar a nossa missão", dizia a declaração.
O cânone 700 também afirma que um decreto de demissão "só tem valor depois de confirmado pela Santa Sé".
Ele também afirma que a demissão "deve indicar o direito que o demitido
tem de, no prazo de dez dias contados depois de recebida a notificação,
recorrer para a autoridade competente".
Embora, como uma sociedade missionária, a ordem normalmente atue subordinada à Congregação para a Evangelização dos Povos do Vaticano, Morrissey disse
que a congregação que eles contataram sobre a votação poderia depender
dos fundamentos que a ordem estava usando para avaliar a remoção de Bourgeois.
Por exemplo, disse Morrissey, se a ordem estava usando a participação de Bourgeois em
uma cerimônia de ordenação de mulheres em 2008 como a principal razão
para a demissão, a sua carta sobre o assunto provavelmente deve ter ido,
ao invés, para a Congregação para a Doutrina da Fé.
Excomunhão
Em outubro de 2008, essa congregação deu a Bourgeois 30
dias para se retratar da sua "crença e declarações públicas de apoio à
ordenação de mulheres" ou, senão, enfrentaria a excomunhão automática. Bourgeois nunca se retratou, dizendo que não poderia fazê-lo em sã consciência.
Não está claro se o padre foi formalmente excomungado, porque o Vaticano nunca emitiu uma declaração pública nesse sentido.
No ano passado, Bourgeois recebeu
duas advertências formais de sua ordem de que, se ele continuasse a sua
"campanha em favor das presbíteras e não se retratasse publicamente da
sua posição sobre o assunto", ele enfrentaria a dispensa e a laicização.
Em uma carta do dia 16 de agosto à ordem, Doyle pediu
que teólogos de renome fossem trazido para examinar o caso "a fim de
olhar mais profundamente" sobre duas questões centrais: a afirmação da
Igreja de que o ensino sobre a ordenação de mulheres é infalível e o
direito de um católico de "agir e pensar de acordo com os ditames de sua
consciência", mesmo que as conclusões o ponham em conflito com as mais
altas autoridades da Igreja.
De acordo com um comunicado de imprensa de 2008, o conselho geral dos Padres e Irmãos Maryknoll é composto por quatro homens, incluindo Dougherty, McGovern e os padres maryknolls Paul Masson, vigário-geral da Sociedade, e José Aramburu, assistente-geral.
Segundo o comunicado, os membros do conselho têm mandatos de seis anos.
De acordo com as constituições da ordem Maryknoll, que estão disponíveis online, o processo de demissão de membros da ordem deve seguir as disposições do Direito Canônico "com as devidas adaptações".
"Uma vez que o decreto de demissão seja confirmado pela Congregação para a Evangelização dos Povos,
o membro demitido não pode ser readmitido à Sociedade, nem poderá
exigir qualquer compensação pelos serviços prestados à Sociedade ou às
missões", diz uma seção das constituições.
Em sua entrevista, Doyle disse que a votação sobre a remoção de Bourgeois da
ordem é "especialmente interessante agora", considerando a postura que a
Conferência dos Bispos dos EUA está tomando com relação à liberdade de
consciência ao longo de uma norma federal controversa que exige a
cobertura de serviços de contracepção pelos planos de saúde.
"Todos esses bispos norte-americanos estão falando sobre liberdade de consciência e exercício da religião", disse Doyle. "Mas eles não vão respeitar um dos membros do seu próprio povo que quer apelar à mesma dinâmica".
De sua parte, independentemente das incertezas que cercam a votação de demissão, Bourgeois
disse que o fato de que vários membros do conselho aparentemente não
endossaram a sua demissão lhe ofereceu um "vislumbre de esperança".
"Eu
estou sempre falando sobre solidariedade – que devemos ser solidários
com as mulheres chamadas ao sacerdócio – e eu senti que essa foi uma
expressão muito boa de solidariedade para com um membro da comunidade",
disse Bourgeois. "Para ser bem honesto, eu senti um
pouco de alegria e um vislumbre de esperança, porque eu estou lutando
para ficar na nossa comunidade".
Citando o fato de ter passado 46 anos junto à ordem, 40 dos quais como padre, Bourgeois disse
que estava "agradecido pela felicidade, pelo sentido e pela esperança
que eu encontrei na minha vocação de padre e com a minha comunidade Maryknoll".
"Eu
apenas sinto que eu tenho o direito, assim como os outros, de expressar
abertamente discordâncias acerca dos ensinamentos da Igreja, sem medo",
afirmou. "Sem ser ameaçado com a excomunhão ou com a perda da pensão".
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