Entrevista com Michel Roy, da Caritas internacional
Por Sergio Mora
ROMA, quinta-feira, 29 de março de 2012 (ZENIT.org) - A Caritas Internationalis (CI) reúne 162 Caritas nacionais, que, por sua vez, coordenam as diocesanas, chegando de maneira capilar, através das paróquias e das instituições, até onde ninguém chega. Nesta entrevista, o número 2 da Caritas Internacional explica o serviço que este instrumento da caridade do papa realiza no mundo.
A organização se baseia no princípio da subsidiariedade: cada instância mais alta só intervém quando a imediatamente inferior não consegue agir sozinha, como nas emergências humanitárias.
Na caridade, mais importante do que o dinheiro é o desejo de ajudar, começando horizontalmente. Este sistema único, que nasce de um mandado preciso do evangelho, torna também único este instrumento da caridade do papa e faz com que a Caritas Internationalis amplifique a voz dos pobres diante das entidades multilaterais e internacionais.
Michel Roy, secretário geral da CI, nos fala a este respeito em entrevista a ZENIT.
Como a Caritas realiza a caridade?
- Michel Roy: A caridade é realizada primeiro localmente, num país, num bairro. É uma atitude do cristão que é sensível ao sofrimento dos outros e age, se organiza. A caridade pode ser feita dando esmola a um mendigo, mesmo que isso não mude muito a vida dele.
Organização em que nível?
- Michel Roy: Nós temos que interagir como irmãos na base do problema, mas, muitas vezes, é necessária uma organização, porque não basta dar coisas, é preciso algo metódico, em nível paroquial, por exemplo. E também em níveis mais altos. Numa diocese, entre bairros pobres e ricos, etc. A missão de um bispo é incentivar a caridade, fazer a comunidade cristã ser caridosa e capaz de amar, como as primeiras comunidades cristãs, nos atos dos apóstolos. Por isso, o bispo muitas vezes delega essa obra à Caritas.
Então o nível paroquial é o mais capilar e depois vêm as dioceses?
- Michel Roy: Entre uma diocese e outra existem desigualdades. A Caritas nacional ajuda as dioceses como instrumento da conferência episcopal. Por sua vez, as Caritas nacionais compõem a Caritas internacional, que é uma federação, com membros independentes, que se confederaram há 61 anos, quando havia só 27 Caritas no mundo. A primeira começou na Alemanha, no final do século XIX.
O objetivo é ajudar, basicamente?
- Michel Roy: Não, é mais do que simplesmente ajudar. A Caritas é um instrumento da Igreja e do papa para realizar a caridade. É um dever dos cristãos e dos homens de boa vontade, para com os mais pobres e para criar uma sociedade mais justa e fraterna.
E no nível internacional?
- Michel Roy: A Caritas Internacionalis é uma entidade da Santa Sé. Como Caritas internacional, nós somos a caridade do papa. O nosso superior eclesiástico hoje é Bento XVI. Como dicastério de referência, nós temos na cúria o Cor Unum, que acompanha o nosso trabalho.
Como são escolhidos os membros da Caritas Internacional?
- Michel Roy: O presidente é eleito pela assembleia geral de 264 membros, a cada quatro anos. O presidente sempre foi um clérigo, sacerdote ou bispo, e já tivemos também cardeais. Mas poderia ser também um leigo ou uma leiga. A Santa Sé tem o direito de dar o nihil obstat às candidaturas. A assembleia elege ainda o secretário geral e o tesoureiro.
E por que um instrumento da caridade do papa?
- Michel Roy: O santo padre tem vários instrumentos, como a Caritas Internacional, que é uma pequena organização, um total de umas trinta pessoas. Nós somos caridade do papa, e as Caritas locais são a caridade das conferências episcopais. Também existe o Cor Unum, que dirige dois instrumentos de caridade: a Fundação Populorum Progressio, que trabalha na América Latina e no Caribe, e a Fundação João Paulo II, para o Sahel. Quando o papa recebe dinheiro dos fiéis, ele o usa para ajudar de diversas maneiras. Entre elas, ele ajuda a Caritas Internacionalis para as emergências maiores.
Como é o trabalho de vocês?
- Michel Roy: Temos diversos eixos de trabalho em nosso plano, que é aprovado pela assembleia geral, e que muda conforme a situação global. Por exemplo, temos que reduzir o risco de emergências internacionais e coordenar a ajuda nesses casos. No ano passado, respondemos a trinta emergências maiores, que nos exigiram 42 milhões de euros, direta ou indiretamente, através das Caritas nacionais. Queremos dar uma resposta de qualidade, que não é só doar. Tem que ser de maneira responsável, criando perspectivas. Promovemos o desenvolvimento humano integral e o nosso valor agregado é facilitar a relação entre os membros que têm experiência na área com aqueles que querem apoiar. Em muitos setores nós temos peritos, como no da imigração e do tráfico de seres humanos, de mulheres, crianças, trabalhadores migrantes.
Respostas específicas para cada setor...
- Michel Roy: Exatamente. Por exemplo, outro setor é o do clima e o da segurança alimentar. Vamos pensar no Chifre da África e no Sahel, por exemplo. Mas também temos a promoção da paz e da reconciliação. Temos que levar a voz da Igreja até as Nações Unidas, no caso dos conflitos.
E na saúde?
- Michel Roy: Trabalhamos no setor de doenças como a aids, a malária, a tuberculose, as pandemias. No caso da aids também fazemos um ação pastoral.
Como é a luta contra a pobreza?
- Michel Roy: A luta contra a pobreza é mais global, partindo dos objetivos do milênio, como a educação, a saúde, etc. O ponto é que, para nós, não é a comunidade que tem problemas disso ou daquilo, mas pessoas que têm problemas. A luta contra a pobreza tem que ser horizontal, dando orientação, porque são pessoas, e a parte espiritual também é importante. Por isso, em outubro de 2013, nós faremos uma campanha global contra a pobreza quando as Nações Unidas abordarem o problema dos objetivos do milênio, que não foram cumpridos.
Há outros objetivos dentro da sua estratégia?
- Michel Roy: Queremos aumentar a capacidade de dar respostas às Caritas nacionais. A caridade local não precisa necessariamente de fundos, mas principalmente de atitude. Salvo nos casos em que não existem fundos, ou quando os projetos são mais amplos, aí sim pedimos verba de fora. Na maioria dos projetos de desenvolvimento humano, o dinheiro vem de outras Caritas, solidárias. De Caritas para Caritas.
E os objetivos espirituais?
- Michel Roy: Como Igreja, nós temos que fazer cada um crescer na sua comunidade, do jeito que Deus espera de cada um. Fomos criados como filhos de Deus, à sua imagem e semelhança, e o meio ambiente tem que dar condições de dignidade, de relações fraternas. A miséria impede essas relações. E juntos, inspirados pela doutrina social da Igreja, podemos mudar este mundo de maneira mais justa.
E a capilaridade da Caritas?
- Michel Roy: Quando eu falo com representantes da ONU em Genebra ou em Nova Iorque, para eles a capilaridade da rede da Caritas é muito importante, porque é não só nacional, mas também local, e chega mesmo até os mais pobres. Eles nos conhecem e valorizam, estão dispostos a escutar o que nós queremos dizer. A nossa voz é a voz dos pobres, das Igrejas locais.
Há novos estatutos, não é?
- Michel Roy: Estamos num processo de integração maior com a Santa Sé, como Caritas Internacionalis. Os nossos novos estatutos foram aprovados pelo comitê executivo em novembro e estão agora no secretariado. Estamos esperando um decreto do santo padre sobre a aprovação dos estatutos ad experimentum.
O que muda com o novo estatuto?
- Michel Roy: Em 2004, o papa João Paulo II deu à Caritas Internationalis uma personalidade jurídica canônica pública, o que faz de nós uma entidade da Santa Sé, que antes era jurídica privada. E na carta de João Paulo II, ele diz que, quando a Caritas fala publicamente, ela fala em nome da Igreja. Então é uma responsabilidade muito grande, que nos integra mais com a Igreja. A Caritas traz até a Santa Sé a realidade dos pobres e aqui nós temos a missão de Igreja, doutrinal e pastoral, para reforçar. É um intercâmbio importante. Os novos estatutos são a reafirmação da missão da Caritas Internacionalis e das Caritas, de difundir a caridade e promover a justiça social.
ROMA, quinta-feira, 29 de março de 2012 (ZENIT.org) - A Caritas Internationalis (CI) reúne 162 Caritas nacionais, que, por sua vez, coordenam as diocesanas, chegando de maneira capilar, através das paróquias e das instituições, até onde ninguém chega. Nesta entrevista, o número 2 da Caritas Internacional explica o serviço que este instrumento da caridade do papa realiza no mundo.
A organização se baseia no princípio da subsidiariedade: cada instância mais alta só intervém quando a imediatamente inferior não consegue agir sozinha, como nas emergências humanitárias.
Na caridade, mais importante do que o dinheiro é o desejo de ajudar, começando horizontalmente. Este sistema único, que nasce de um mandado preciso do evangelho, torna também único este instrumento da caridade do papa e faz com que a Caritas Internationalis amplifique a voz dos pobres diante das entidades multilaterais e internacionais.
Michel Roy, secretário geral da CI, nos fala a este respeito em entrevista a ZENIT.
Como a Caritas realiza a caridade?
- Michel Roy: A caridade é realizada primeiro localmente, num país, num bairro. É uma atitude do cristão que é sensível ao sofrimento dos outros e age, se organiza. A caridade pode ser feita dando esmola a um mendigo, mesmo que isso não mude muito a vida dele.
Organização em que nível?
- Michel Roy: Nós temos que interagir como irmãos na base do problema, mas, muitas vezes, é necessária uma organização, porque não basta dar coisas, é preciso algo metódico, em nível paroquial, por exemplo. E também em níveis mais altos. Numa diocese, entre bairros pobres e ricos, etc. A missão de um bispo é incentivar a caridade, fazer a comunidade cristã ser caridosa e capaz de amar, como as primeiras comunidades cristãs, nos atos dos apóstolos. Por isso, o bispo muitas vezes delega essa obra à Caritas.
Então o nível paroquial é o mais capilar e depois vêm as dioceses?
- Michel Roy: Entre uma diocese e outra existem desigualdades. A Caritas nacional ajuda as dioceses como instrumento da conferência episcopal. Por sua vez, as Caritas nacionais compõem a Caritas internacional, que é uma federação, com membros independentes, que se confederaram há 61 anos, quando havia só 27 Caritas no mundo. A primeira começou na Alemanha, no final do século XIX.
O objetivo é ajudar, basicamente?
- Michel Roy: Não, é mais do que simplesmente ajudar. A Caritas é um instrumento da Igreja e do papa para realizar a caridade. É um dever dos cristãos e dos homens de boa vontade, para com os mais pobres e para criar uma sociedade mais justa e fraterna.
E no nível internacional?
- Michel Roy: A Caritas Internacionalis é uma entidade da Santa Sé. Como Caritas internacional, nós somos a caridade do papa. O nosso superior eclesiástico hoje é Bento XVI. Como dicastério de referência, nós temos na cúria o Cor Unum, que acompanha o nosso trabalho.
Como são escolhidos os membros da Caritas Internacional?
- Michel Roy: O presidente é eleito pela assembleia geral de 264 membros, a cada quatro anos. O presidente sempre foi um clérigo, sacerdote ou bispo, e já tivemos também cardeais. Mas poderia ser também um leigo ou uma leiga. A Santa Sé tem o direito de dar o nihil obstat às candidaturas. A assembleia elege ainda o secretário geral e o tesoureiro.
E por que um instrumento da caridade do papa?
- Michel Roy: O santo padre tem vários instrumentos, como a Caritas Internacional, que é uma pequena organização, um total de umas trinta pessoas. Nós somos caridade do papa, e as Caritas locais são a caridade das conferências episcopais. Também existe o Cor Unum, que dirige dois instrumentos de caridade: a Fundação Populorum Progressio, que trabalha na América Latina e no Caribe, e a Fundação João Paulo II, para o Sahel. Quando o papa recebe dinheiro dos fiéis, ele o usa para ajudar de diversas maneiras. Entre elas, ele ajuda a Caritas Internacionalis para as emergências maiores.
Como é o trabalho de vocês?
- Michel Roy: Temos diversos eixos de trabalho em nosso plano, que é aprovado pela assembleia geral, e que muda conforme a situação global. Por exemplo, temos que reduzir o risco de emergências internacionais e coordenar a ajuda nesses casos. No ano passado, respondemos a trinta emergências maiores, que nos exigiram 42 milhões de euros, direta ou indiretamente, através das Caritas nacionais. Queremos dar uma resposta de qualidade, que não é só doar. Tem que ser de maneira responsável, criando perspectivas. Promovemos o desenvolvimento humano integral e o nosso valor agregado é facilitar a relação entre os membros que têm experiência na área com aqueles que querem apoiar. Em muitos setores nós temos peritos, como no da imigração e do tráfico de seres humanos, de mulheres, crianças, trabalhadores migrantes.
Respostas específicas para cada setor...
- Michel Roy: Exatamente. Por exemplo, outro setor é o do clima e o da segurança alimentar. Vamos pensar no Chifre da África e no Sahel, por exemplo. Mas também temos a promoção da paz e da reconciliação. Temos que levar a voz da Igreja até as Nações Unidas, no caso dos conflitos.
E na saúde?
- Michel Roy: Trabalhamos no setor de doenças como a aids, a malária, a tuberculose, as pandemias. No caso da aids também fazemos um ação pastoral.
Como é a luta contra a pobreza?
- Michel Roy: A luta contra a pobreza é mais global, partindo dos objetivos do milênio, como a educação, a saúde, etc. O ponto é que, para nós, não é a comunidade que tem problemas disso ou daquilo, mas pessoas que têm problemas. A luta contra a pobreza tem que ser horizontal, dando orientação, porque são pessoas, e a parte espiritual também é importante. Por isso, em outubro de 2013, nós faremos uma campanha global contra a pobreza quando as Nações Unidas abordarem o problema dos objetivos do milênio, que não foram cumpridos.
Há outros objetivos dentro da sua estratégia?
- Michel Roy: Queremos aumentar a capacidade de dar respostas às Caritas nacionais. A caridade local não precisa necessariamente de fundos, mas principalmente de atitude. Salvo nos casos em que não existem fundos, ou quando os projetos são mais amplos, aí sim pedimos verba de fora. Na maioria dos projetos de desenvolvimento humano, o dinheiro vem de outras Caritas, solidárias. De Caritas para Caritas.
E os objetivos espirituais?
- Michel Roy: Como Igreja, nós temos que fazer cada um crescer na sua comunidade, do jeito que Deus espera de cada um. Fomos criados como filhos de Deus, à sua imagem e semelhança, e o meio ambiente tem que dar condições de dignidade, de relações fraternas. A miséria impede essas relações. E juntos, inspirados pela doutrina social da Igreja, podemos mudar este mundo de maneira mais justa.
E a capilaridade da Caritas?
- Michel Roy: Quando eu falo com representantes da ONU em Genebra ou em Nova Iorque, para eles a capilaridade da rede da Caritas é muito importante, porque é não só nacional, mas também local, e chega mesmo até os mais pobres. Eles nos conhecem e valorizam, estão dispostos a escutar o que nós queremos dizer. A nossa voz é a voz dos pobres, das Igrejas locais.
Há novos estatutos, não é?
- Michel Roy: Estamos num processo de integração maior com a Santa Sé, como Caritas Internacionalis. Os nossos novos estatutos foram aprovados pelo comitê executivo em novembro e estão agora no secretariado. Estamos esperando um decreto do santo padre sobre a aprovação dos estatutos ad experimentum.
O que muda com o novo estatuto?
- Michel Roy: Em 2004, o papa João Paulo II deu à Caritas Internationalis uma personalidade jurídica canônica pública, o que faz de nós uma entidade da Santa Sé, que antes era jurídica privada. E na carta de João Paulo II, ele diz que, quando a Caritas fala publicamente, ela fala em nome da Igreja. Então é uma responsabilidade muito grande, que nos integra mais com a Igreja. A Caritas traz até a Santa Sé a realidade dos pobres e aqui nós temos a missão de Igreja, doutrinal e pastoral, para reforçar. É um intercâmbio importante. Os novos estatutos são a reafirmação da missão da Caritas Internacionalis e das Caritas, de difundir a caridade e promover a justiça social.
Nenhum comentário:
Postar um comentário