quarta-feira, 18 de julho de 2012

''É preciso voltar ao Evangelho. Só o papa pode reformar a Igreja''

18/07/2012

UNISINOS - O teólogo e ensaísta Pe. Santino Spartà explica as raízes da "crise atual" da Santa Sé.

A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vatican Insider, 17-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Santino Spartà

Eis a entrevista.

Como nasceu o Vatileaks?

A Igreja, desde a sua fundação, passou por momentos terríveis que humanamente deveriam tê-la levado ao fracasso, como todos os impérios mais poderosos, porque em seu interior floresceram idólatras espirituais, que se ajoelharam para adorar o próprio egoísmo, um nepotismo inveterado, uma política indecorosa, mas a Igreja saiu vitoriosa disso por ter se arrependido das culpas cometidas. Hoje também, esmagada pela pedofilia sacerdotal, abalada pela ambição econômica, inquietada pela ambição carreirista desenfreada de tantos funcionários eclesiais, seduzida pelo esplendor das escórias terrenas, a Igreja, para adquirir a imagem de imaculada de Cristo, deve voltar às raízes evangélicas.
Se os movimentos eclesiais, de um lado, esfarelaram a cotidianidade do indivíduo catolicamente tradicional, que observava os valores canônicos da Igreja para estar em harmonia com a exterioridade da prática religiosa, ao contrário, no nosso momento histórico atual, os movimentos perfuraram o aspecto mais íntimo do fiel. Mas, a longo prazo, se arrogaram o direito de tocar a autoridade da Igreja, pensando em substituir, no limite da obediência, aos decretos do cristianismo com alguma atitude arbitrária com relação à doutrina infalível divina. Nesse ponto, me parece ser desejável que algum movimento, meditando novamente sobre seus próprios conteúdos interiores, com serena objetividade, se reaproprie do dado "ordinário" da Igreja, sem se acampar sobre posições privilegiadas.

Como se pode reduzir na Igreja o rasgo entre a base e a cúpula?

No Concílio Vaticano II, havia se falado com argumentos favoráveis a uma maior colegialidade da Igreja, que ainda continua sendo uma monarquia absoluta. Eu penso que uma maior democracia, mesmo com o papa como chefe infalível, agilizaria os problemas não elimináveis da mística vinha do Senhor. Assim, se alcançaria, com mais desenvoltura burocrática, a concretude de tantas questões urgentes. A peregrinação do tempo se descoloraria diante das necessidades imperiosas de muitas dioceses do mundo, uma vez confiada à estrutura constitucional do aparato eclesiástico, uma solícita intervenção resolutiva dos vários casos evidenciados.
O voluntariado, que se inspira na dimensão católica, constitui, sem tropeçar nos "se" e nos "mas", uma sedutora fecundidade de contribuição volitiva para a Itália, especialmente neste atual estágio crítico. Segue-se daí que alguns membros afluentes da cúpula hierárquica eclesiástica devem se ater com espiritual senhoria à luz evangélica da clareza, à brilhante visibilidade do exemplo, depois de ter desbotado com força desgostosos interesses egoístas. O voluntariado, nesse ponto, poderia ser induzido a se curvar novamente perante o inicial ardor volitivo, em favor de um bem superior, tendo entrevisto agitações injustificadas naqueles que haviam sido pensado antes como guias qualificados.

Há um problema de classe dirigente?

A parte interna da Igreja, infelizmente, permaneceu anteriormente, por um certo tempo nas mãos de uma oligarquia eclesiástica, até porque quem estava no comando preferiu viajar pelos continentes com o sublime impulso de semear o Evangelho. Com essa falta ativa, constituiu-se então, sutilmente, um grupo de cérebros, que, de condutores dos mais renomados dicastérios eclesiásticos, ao tomar as rédeas do comando, governaram o filão específico de um modo personalista, tendendo mais para o imediatismo de resultados favoráveis a eles, remetendo-se apenas na teoria ao universalismo evangélico.
Nessa situação, paradoxalmente acéfala, e não tendo sido resolvidos muitos problemas, na carência de uma condução estavelmente prática e com a ingerência indevida de tantas cabeças, afloraram inevitavelmente diversos escândalos. Tot capita, tot sententiae, assim, mais uma vez, Cícero não se desmentiu. Bento XVI está purificando a esposa de Cristo, mas irá concluir ou lhe darão o tempo para cumprir a sua missão? A Igreja não deve se fechar em si mesma, mas sim responder aos ataques com o diálogo e a transparência. É o segundo mandamento ensinado diretamente por Cristo: "Ama o teu próximo como a ti mesmo". Esse preceito divina constitui a norma objetiva e o compromisso pessoal de todos os católicos, mesmo que não praticante. Ele deve se destacar como um arco-íris de luz interior na renovação cotidiana de cada ação pelo crescimento moral. E Jesus também afirma: "Cumprimentem os seus inimigos, rezem também por eles e perdoem a quem lhes fizer mal". Mesmo com aparente escândalo, mas com evidente significado metafórico, ele argumenta que é preciso dar a outra face a quem te fere.
Se "atacar" publicamente uma instituição se insere entre os atos violentos, isso se insinua, porém, como sinal claro de um "quê" desarmonioso. Então, para observar o ditado caritativo Cristo, para equilibrar novamente a ordem interna, para valorizar as críticas apresentadas pelos outros, a Igreja não pode não dialogar com quem a maltrata. Desse modo, irá aprender, às suas custas, a não assumir fatos negativos e a caminhar ereta por caminhos estabelecidos, mesmo permanecendo consciente de ser assistida pelo Espírito Santo. As palavras de Jesus: "Eu estarei com vocês até o fim do mundo", sempre em perene juventude de conteúdo, encorajará a Igreja a dialogar com os inimigos, a perdoar os perseguidores, a prestar atenção a se comportar bem no caminho dos séculos.

Hoje a Igreja está na mira do laicismo?

O laicismo, rigorosamente falando, não coloca a doutrina da Igreja diretamente na mira, assegurando-se por enfraquecer a todo custo os valores inegociáveis católicos, como a sacralidade da família, a positividade ontológica da vida, a liberdade de educação. Isso desenvolve, dentro do país, aquela política mais oportuna ao povo de pertença ou mais conveniente aos governantes de plantão, ou mais satisfatória para as relações internacionais. De fato, se confirmaram, entre um governo e outro da mesma nação, diversidades éticas, culturais, econômicas e também às vezes até religiosas.
O Evangelho ressalta que a lâmpada da fé deve ser sempre exposta "em cima dos telhados", para ser luminosa para aqueles que tateiam no escuro e para ser o endereço para os pigmeus do espírito. Uma imagem da Igreja em transparente perenidade não se desenvolveu aos poucos em uma absurda indiferença, mas conseguiu abalar pacificamente com benévola frequência os mais rebeldes, domesticados pela limpeza espiritual. Sem dúvida, a Igreja tem um problema de comunicação e de imagem, para se apresentar continuamente como místico espelho de limpeza, que reflete a consciência do divino.

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