28 agosto 2012
Henri Decaisne (1799-1852), O Anjo da Guarda (cerca de 1836)
Parece que o anjo não é delegado à guarda do homem desde o seu nascimento:
1. Com
efeito, os anjos são enviados “a serviço em proveito daqueles que
recebem a salvação como herança”, diz o Apóstolo na Carta aos Hebreus
(1, 14). Ora, os homens começam a receber essa herança quando são
batizados. Logo, o anjo é delegado a guardar o homem desde o momento do
batismo, e não desde o nascimento.
2. Além
disso, os anjos guardam os homens iluminando-os pelo ensinamento da
doutrina. Ora, aos recém-nascidos não são capazes de doutrina, pois não
têm o uso da razão. Logo, aos recém-nascidos não são delegados anjos da
guarda.
3. Ademais, a
criança no seio materno possui em certo momento a alma racional, como a
tem após o nascimento. Ora, ainda no seio materno não lhe são delegados
anjos da guarda, pois nem sequer os ministros da Igreja lhes conferem
os sacramentos. Portanto, não é logo após o nascimento que os anjos são
delegados à guarda dos homens.
EM SENTIDO CONTRÁRIO, diz Jerônimo: “Cada alma, desde o nascimento, tem um anjo delegado à sua guarda”.
Ao
comentar o Evangelho de Mateus, Orígenes diz que, a esse respeito, há
duas opiniões. Alguns disseram que o anjo é delegado à guarda do homem
desde o batismo; outros já desde o nascimento. É esta a opinião que
Jerônimo aprova e com razão. Os benefícios que o homem recebe de Deus
pelo fato de ser cristão começam com o batismo; por exemplo, a recepção
da Eucaristia e outros semelhantes. Todavia, os benefícios que Deus
dispõe para o homem pelo fato de ele ter uma natureza racional lhe são
concedidos desde o momento em que, pelo nascimento, adquire tal
natureza. Ora, esse benefício é a guarda dos anjos como está claro pelo
que foi dito anteriormente [art. 1: “Os homens são guardados por anjos?”]. Portanto, tão logo nasce, o homem tem um anjo delegado para sua guarda.
Quanto às objeções iniciais, portanto, deve-se dizer que:
1. Os anjos
são enviados a serviço eficazmente só para aqueles que recebem a
salvação como herança se considerarmos o último efeito de sua guarda,
que é o recebimento da herança. Todavia, aos demais homens não é negado o
serviço dos anjos, embora não seja eficaz em conduzi-los à salvação.
Entretanto, é eficaz na medida em que os preserva de muitos males.
2. A guarda
dos anjos tem como efeito último e principal a iluminação doutrinal.
Todavia, tem muitos outros efeitos que interessam às crianças, como
afastar demônios e evitar outros danos tanto espirituais como corporais.
3. A
criança, enquanto se encontra no seio materno, não está totalmente
separada da mãe, pois, em virtude de uma ligação especial, é ainda de
alguma maneira parte dela, como o fruto que pende da árvore faz parte da
árvore. Por isso se pode dizer como provável que o anjo da guarda da
mãe guarda a prole que está em seu seio. Mas, ao nascer, ao separar-se
da mãe, lhe é delegado o anjo da guarda, como diz Jerônimo.
Suma Teológica I, q.113, a.5
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