[reporterdecristo]
Segundo São João da Cruz, há duas maneiras de resistir aos vícios e adquirir as virtudes.
Existe uma maneira mais comum e não tão perfeita que consiste em procurar resistir a algum vício por meio de atos de virtude, que se lhe opõe e que destrói tal vício, pecado ou tentação.
Por
exemplo, considerando a Paixão do Senhor: “Era maltratado e ele sofria,
não abria a boca” (Is 53,7); ou trazendo à lembrança os bens que se
adquirem com o sofrimento e com o vencer-se a si mesmo, ou ainda,
pensando que Deus nos ordenou que sofrêssemos por advir daí o nosso
aproveitamento.
Por meio
dessas considerações, consinto em sofrer, querer e aceitar a citada
injúria, afronta ou dano, e isso, visando a glória e a honra de Deus.
Esta maneira de resistir e de se opor à tentação, vício ou pecado em
apreço, dá ocasião ao exercício da paciência e é um bom modo de
resistir, ainda que árduo e menos perfeito.
Há outra
maneira proveitosa e perfeita de vencer vícios e tentações e adquirir e
conquistar virtudes; consiste no seguinte: a alma deve aplicar-se
apenas nos atos e movimentos anagógicos (contemplação das coisas
divinas), por este meio, consegue opor resistência e vencer todas as
tentações do nosso adversário, alcançando assim as virtudes, em grau
eminente.
Ao
sentirmos o primeiro movimento ou investida de algum vício, como a
luxúria, a ira, impaciência, espírito de vingança por uma ofensa
recebida, etc., não procuremos resistir opondo um ato da virtude
contrária, segundo ficou dito, mas desde os primeiros assaltos, façamos
logo um ato ou movimento de amor anagógico contra o vício em questão, elevando nosso afeto a Deus, porque com essa diligência já a alma foge da ocasião e se apresenta a seu Deus e se une com Ele.
Ora,
desse modo, consegue vencer a tentação e o inimigo não pode executar o
seu plano, pois não encontra a quem ferir, uma vez que a alma, por estar
mais onde ama do que onde anima, subtraiu divinamente o corpo a
tentação. Portanto, não acha o adversário por onde atacar e dominar a
alma; ela já não se encontra ali onde ele a queria ferir e lhe causar
dano.
E então,
ó maravilha! a alma como esquecida do movimento vicioso, se une com seu
Amado, nenhum movimento sente do tal vício com que o demônio pretendia
tentá-la, tendo mesmo, para isso, arremessado seus dardos contra ela;
primeiramente, porque subtraiu o corpo, como ficou dito, e, portanto, já
não se encontra ali; assim, se me permitem a expressão, seria quase
como tentar um corpo morto, pelejar com o que não está, com o que não
sente, nem é capaz de ser tentado, naquela ocasião.
Desta
maneira vai-se formando na alma uma virtude heroica e admirável, que o
Doutor Angélico, Santo Tomás, denomina virtude da alma perfeitamente
purificada.
Esta
virtude, diz o Santo, é a que vem a ter a alma quando Deus a eleva a tal
estado que ela já não sente as solicitações dos vícios, nem seus
assaltos, nem arremetidas ou tentações, pelo elevado grau de virtude a
que chegou. E que lhe nasce e
advém uma tão sublime perfeição que já nada se lhe dá que a injuriem ou
que a louvem e enalteçam; que a humilhem, que digam mal dela ou que
digam bem.
Porque,
como os citados movimentos, conduzem a alma a tão elevado e sublime
estado, o efeito mais próprio deles com relação a ela é fazê-la esquecer
todas as coisas que estão fora de seu Amado, que é Jesus Cristo. E que
lhe vem, segundo referimos, que estando a alma unida a seu Deus e
entretida com ele, as tentações não encontram a quem ferir, pois não
podem elevar-se ao nível a que a alma subiu, ou até onde foi elevada por
Deus: “Nenhum mal te atingirá” (Sl 90,10)
Deve-se
prevenir aos principiantes, cujos atos de amor anagógicos não são ainda
tão rápidos e instantâneos, nem tão fervorosos, para que consigam, de um
salto, ausentar-se completamente dali e unir-se com o Esposo, que, se
perceberem que apenas essa diligência não basta para esquecer por
completo o movimento vicioso da tentação, não deixem de opor
resistência, lançando mão de todas as armas e considerações que puderem,
até que cheguem a vencê-la completamente.
Devem
proceder do seguinte modo: primeiramente, procurem resistir com os mais
fervorosos movimentos anagógicos que lhes for possível e os ponham em
prática, exercitando-se neles muitas vezes; quando isso não for
suficiente, porque a tentação é forte e eles são fracos, aproveitem-se,
então, de todas as armas de piedosas meditações e exercícios que
julgarem ser necessários para conseguir a vitória.
Devem
estar persuadidos de que este modo de resistir é excelente e eficaz,
pois encerra em si todas as estratégias de guerra necessárias e de
importância.
São João da Cruz, Ditames de Espírito.
Fonte: anjosdeadoracao
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