22/02/2013
A infalibilidade pontifícia e o
primado de jurisdição do Pontífice, necessariamente unidos, devem ser,
para todo católico, alvo de um amor preferencial. Mas como
fundamentá-los na Escritura, na Tradição e na História?
Nos últimos cem anos, poucas passagens
do Evangelho têm sido objeto de discussões tão veeme "Eu te declaro: tu
és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do
inferno não prevalecerão contra ela" (Mt 16, 18).
ntes e apaixonadas, pois, segundo alegam
alguns, a formulação atual não corresponderia ao original escrito por
Marcos, mas tratar-se-ia de um texto manipulado por volta do ano 130 com
vistas a justificar o primado de Pedro e seus sucessores sobre seus
irmãos no episcopado.
Entretanto, durante séculos ninguém
pusera em dúvida a autenticidade dessa passagem. Foi preciso aguardar a
infiltração do racionalismo na exegese bíblica no século XIX e o
historicismo protestante do século XX, para começarem as tentativas de
desqualificá-la.
Argumentos bíblicos em favor do primado de Pedro
Sob o ponto de vista documental, a tese
da suposta manipulação desse versículo não se sustenta. Os textos mais
antigos que reproduzem a passagem em questão não apresentam nenhum
vestígio de adulteração: nem o Diatessaron (concordância dos quatro
Evangelhos) de Taciano, de meados do segundo século, nem os escritos dos
Padres da Igreja anteriores ao século IV e nem os 4 mil códices dos
oito primeiros séculos que hoje se conhecem.
Pelo contrário, como pode-se ver no box
da próxima página, mais de 160 passagens do Novo Testamento mencionam
Pedro ocupando, em muitos deles, uma posição de preeminência sobre os
demais Apóstolos. Até mesmo São João, que trata em menor medida do
Príncipe dos Apóstolos em seu Evangelho, devido às circunstâncias
históricas nas quais foi escrito - em plena polêmica com os gnósticos -,
traz duas importantes referências à entrega do primado petrino: "Serás
chamado Cefas (que quer dizer pedra)" (Jo 1, 42); e "Simão, filho de
João, amas-Me mais do que estes? [...] Apascenta meus cordeiros" (Jo 21,
15-17).
Ora, é em Mt 16, 18-19 que se baseia
principalmente a doutrina sobre o Papado, realçando-se normalmente na
interpretação destes versículos a tríplice metáfora usada por Nosso
Senhor: São Pedro é fundamento da Igreja, pois é comparado com os
alicerces que dão coesão e estabilidade a todo o edifício; seu poder de
jurisdição está figurado nas chaves, as quais, na linguagem bíblica e
profana, são símbolo do domínio; e, por último, a imagem de ligar e
desligar simboliza a capacidade de criar ou abolir leis que obrigam em
consciência.
Considerada isoladamente, a
interpretação acima poderá suscitar ceticismo; mas unida a outros
trechos do Novo Testamento, bem como aos escritos dos Padres da Igreja e
à praxe dos primeiros séculos de cristianismo constitui um poderoso
aparato argumentativo. Todos esses indícios somados convergem em afirmar
o primado indiscutível de São Pedro, dado por Cristo e reconhecido
ininterruptamente ao longo da História da Igreja.
Testemunho dos Padres Apostólicos
De especial importância para o tema que
nos ocupa é a história dos primeiros séculos da Igreja, por chocar
frontalmente com a gratuita suposição de que o primado de jurisdição
universal do Romano Pontífice tenha sido uma invenção posterior aos
tempos apostólicos.1
Ora, já na carta enviada pelo Papa São
Clemente aos fiéis de Corinto, a respeito da rebelião ocorrida nessa
comunidade em torno do ano 96, fica patente o primado romano. Com
efeito, nela o Pontífice não pede desculpas por imiscuir-se nos assuntos
internos de outra Igreja - como seria normal, caso fosse um simples
primus inter pares, chefe de outra Igreja irmã -, mas escusa-se por não
ter tido oportunidade de intervir no assunto com mais rapidez; adverte
do perigo de cometer pecado grave quem não obedecer às suas
admoestações; e mostra-se convencido de que sua atitude é inspirada pelo
Espírito Santo.2 Por outro lado, a carta foi recebida em Corinto sem
resistências e considerada como uma grande honra, a ponto de ainda no
ano de 170, segundo testemunhas, ser lida na liturgia dominical.3
Fundamento bíblico do primado petrino
São Pedro ocupa posição preeminente no
Novo Testamento, onde é mencionado 114 vezes nos Evangelhos e 57 vezes
nos Atos dos Apóstolos.
Fala em nome de todos os Apóstolos (Lc
12, 41, Mt 19, 27, Mc 10, 28, Lc 18, 28), responde por eles (Jo 6, 68,
Mt 16, 16, Mc 8, 29) e age por todos (Mt 14, 28, Mc 8, 32, Mt 16, 22,
Lc 22, 8, Jo 18, 10). Outras vezes os evangelistas referem- se aos
Apóstolos dizendo "Pedro e os seus" (Mc 1, 36, Lc 8, 45; 9, 32, Mc 16,
7, At 2, 14. 37). Jesus o elege depois de fazer um grande milagre (Lc
5, 1-11); serve-Se de sua barca para pregar às multidões (Lc 5, 3);
hospeda-Se em sua casa (Mc 1, 29); associa-o a Si no pagamento do
tributo (Mt 17, 23-26); escolhe-o, com Tiago e João, para assistir à
ressurreição da filha de Jairo (Mc 5, 37), à transfiguração (Mc 9, 2) e
à agonia no Getsêmani (Mc 14, 33); é o primeiro a quem aparece
ressuscitado (Lc 24, 34). É o único dos Doze que o anjo nomeia para
ser-lhe comunicada a mensagem da Páscoa (Mc 16, 7). São João espera a
chegada de São Pedro, para deixá-lo entrar primeiro no Sepulcro de
Jesus (Jo 20, 2-8).
Imagens: "Vocação dos Apóstolos Pedro e André", por Duccio di Buoninsegna - National Gallery of Art, Washington DC. "Cristo entrega as chaves a São Pedro" - Basílica de Paray-le-Monial, França. "Pregação de São Pedro" - Catedral de Manresa, Espanha. |
Depois da Ascensão e de Pentecostes,
vemos São Pedro exercendo a autoridade máxima na Igreja. Completa o
Colégio Apostólico com a eleição de São Matias (At 1, 5ss); fala em
nome dos Apóstolos no dia de Pentecostes (At 2, 14ss); defende perante
as autoridades judaicas o direito dos Apóstolos, de pregar a Fé em
Cristo (At 4, 8-12); condena Ananias e Safira (At 5, 1-11); é inspirado
a abrir as portas da Igreja também aos pagãos, com a conversão do
centurião Cornélio (At 10, 47); preside o Concílio de Jerusalém (At 15,
6ss); toda a Igreja orava por sua libertação, quando foi encarcerado
por ordem de Herodes (At 12, 5).
Por outro lado, São Paulo assinala de
modo preeminente a importância de São Pedro como cabeça da Igreja.
Depois de sua estada na Arábia, dirige-se a Jerusalém para vê-lo (Gal
1, 18); reconhece nele uma das colunas da Igreja (Gal 2, 9); coloca-o
como o primeiro entre as testemunhas das aparições de Cristo
ressuscitado (Cor 15, 5); e mesmo quando lhe resiste "em face" em
Antioquia, age como quem reconhece sua autoridade e, portanto, confirma
de algum modo seu primado (Gal 2, 11-14).
Esses fatos adquirem especial relevo ao
considerar-se que o Apóstolo São João, ainda vivo, encontrava- se em
Éfeso, bem mais perto de Corinto do que de Roma.4 E não consta que nem
São Clemente, nem os fiéis de Corinto, nem o próprio São João tenham
duvidado da autoridade do Sucessor de Pedro para dirimir a questão.
Outro importante testemunho dessa época a
favor do primado do Sucessor de Pedro é a carta enviada por Santo
Inácio de Antioquia (†107) à Igreja de Roma. Nela também se manifesta de
modo evidente, e mais explícito que no caso anterior, o primado da Sé
Romana sobre as outras. Com efeito, essa missiva é substancialmente
diferente das enviadas por ele nas mesmas circunstâncias (prisioneiro
levado da Síria para Roma, onde seria martirizado) a outras Igrejas,
como Éfeso, Magnésia, Trália, Filadélfia e Esmirna. Na primeira, o santo
Bispo de Antioquia escreve em tom submisso; nas demais, em tom de
autoridade.
Além do mais, Santo Inácio reconhece à
Igreja de Roma o poder de dirigir as outras Igrejas, instruindo- as como
a discípulos do Senhor e recomenda sua diocese na Síria à solicitude
pastoral da Sé Romana, e não à de qualquer outra Igreja, talvez mais
próxima.5
Um terceiro testemunho é o de Santo
Irineu de Lyon. Nascido entre 130 e 140, falecido por volta de 202, foi
discípulo de São Policarpo, o qual, por sua vez, havia sido discípulo de
São João. Portanto, esteve em contato quase direto com a idade
apostólica.
Em seu tratado Adversus hæreses, fala
clara e explicitamente do primado da Igreja Romana sobre todas as outras
Igrejas e faz referência à mencionada carta de São Clemente Romano aos
fiéis de Corinto, que tinha entre outros objetivos "renovar sua Fé" e
"declarar a tradição que havia recebido dos Apóstolos".6
Eloquente também é a intervenção do Papa
Vítor I (189-199) a propósito da data da comemoração da Páscoa, que ele
resolveu unificar. Na Província da Ásia se obedecia a outro calendário.
Para solucionar a questão, o Papa convocou um Sínodo dos Bispos
italianos em Roma, escreveu aos Bispos do mundo inteiro e, por fim,
conclamou os Bispos da Ásia a adotar a prática da Igreja universal, de
sempre celebrar a Páscoa no domingo. Caso não o atendessem, ele os
declararia excluídos da comunhão da Igreja.7 Vários Bispos tentaram
moderar a decisão papal, incluindo Santo Irineu, sem resultado, ao que
parece. Fato é que pouco a pouco o costume romano se tornou prática
comum em toda a Igreja. Trata-se de mais uma amostra do reconhecimento
universal do primado do Papa.
Insuspeito testemunho de um herege
Mas os argumentos não provêm apenas do
campo católico. Por volta do ano 220, Tertuliano, já então envolvido na
heresia montanista, escreveu um libelo8 atacando o Papa Calisto I, que
publicara um edito para ser lido em todas as igrejas, suavizando a
disciplina penitencial aplicada aos adúlteros e fornicadores.
Atribuindo de modo sarcástico ao
sucessor de Pedro a expressão "Pontífice Máximo, ou seja, o Bispo dos
Bispos"9 - títulos então usados pelo Imperador romano -, o malfadado
escritor eclesiástico mostra quão abrangente era o poder espiritual do
Papado. Ademais, termina sua longa objurgatória com uma crítica à
reivindicação de Calisto I de que sua autoridade "de ligar e desligar"
se fundamentava na de São Pedro, dando um precioso testemunho de quão
antiga é a consciência da origem divina dessa autoridade.
Detalhe importante: ao tentar refutar o
Papa, Tertuliano - acérrimo adversário da Igreja que antes amara - cita
sem qualquer objeção a passagem do Evangelho de São Mateus contestada
pelos racionalistas dezoito séculos mais tarde: sim, o Senhor disse a
Pedro que este era a rocha sobre a qual construiria a Igreja; deu- lhe,
de fato, as chaves, assim como o poder de ligar e desligar, e
confiou-lhe o cuidado da Igreja. Basta ler as palavras de Tertuliano
para constatar que ele se referia a um fato pacificamente aceito por
todos em sua época, tão próxima dos tempos apostólicos, nem se
permitindo alguma suspeita relacionada com adulteração do texto bíblico.
Supremacia fundada sobre uma rocha divina
São Leão Magno - cujo pontificado, entre
os anos 440 e 461, constitui um interessante ponto de inflexão na
história do primado petrino - referia- se à Igreja de Roma como magistra
(mestra) e não tinha dúvida alguma a respeito da autoridade do Papa
sobre o concílio.
Em nome dessa autoridade confirmou a
doutrina definida pelo Concílio de Calcedônia (451), iniciando assim uma
prática que será mantida por seus sucessores e considerada como
necessária para conferir validez a qualquer concílio ecumênico. 10 Sua
conhecida Epístola dogmática11 foi aclamada com transportes de
entusiasmo pelos Padres reunidos em Calcedônia, quase todos orientais,
com a famosa sentença: "Isto disse Pedro através de Leão!".12
Ora, São Leão Magno desenvolve o
conceito de soberania petrina tomando justamente por base o já citado
versículo de São Mateus: "Eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra
edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra
ela" (Mt 16, 18). Ele põe em realce que essa declaração do Divino
Mestre aplica-se efetivamente à Sé Romana e que o Papa, como Sucessor de
Pedro, tem a missão especialíssima de guiar e governar a Igreja
universal, bem como o direito de intervir e tomar decisões nas questões
eclesiásticas das Igrejas locais.
Infelizmente, fatos históricos indicam, a
partir do século VII, uma latente recusa do primado de jurisdição
universal do Bispo de Roma por parte de alguns líderes da Igreja do
Oriente, embora reconhecendo em geral a autoridade papal em matéria
doutrinária.13 O exaltar dos ânimos teria como triste desfecho o cisma
de 1054.
Papa Bento XVI |
Jurisdição plena e universal
Duas importantes prerrogativas dimanam do primado de Pedro: o primado de jurisdição universal e a infalibilidade pontifícia.
A jurisdição do Papa14 se aplica plena e
supremamente à Igreja universal, porque ela abrange toda a potestade
outorgada por Nosso Senhor Jesus Cristo à Igreja. Essa jurisdição é
também monárquica, pois Cristo a concedeu a São Pedro e não aos outros
Apóstolos, e ilimitada, o que significa que o Papa não presta contas
senão a Deus, por não existir na Igreja instância alguma superior a
ele.15 Além do mais, abarca os poderes legislativo, judiciário e
executivo. Diz- -se também que é uma potestade ordinária no sentido de
que é constitutiva do próprio exercício do ministério petrino; imediata
porque se exerce por direito próprio, sem necessidade de intermediários;
e episcopal, visto ser eminentemente pastoral o objetivo de seu
exercício.16
Em consequência, o Papa é, por um lado,
livre de entrar em contato direto com seus Pastores e com os fiéis, sem
coerção por parte do poder civil;17 e por outro, é o juiz supremo dos
fiéis, ao qual todos têm o direito de recorrer e ninguém pode impugnar,
nem mesmo um concílio ecumênico.18
Magistério ordinário e extraordinário
A infalibilidade pontifícia, por sua
vez, é um carisma inerente ao próprio ministério petrino que confere uma
assistência especial do Espírito Santo ao Papa quando este - falando ex
cathedra, ou seja, como supremo Pastor da Igreja universal - define uma
doutrina de Fé e moral.19
Sobre ela pronunciou-se claramente o
Concílio Vaticano II nos termos seguintes: As definições do Romano
Pontífice "com razão se dizem irreformáveis por si mesmas, e não pelo
consenso da Igreja, pois foram pronunciadas sob a assistência do
Espírito Santo, que lhe foi prometida na pessoa de São Pedro. Não
precisam, por isso, de qualquer alheia aprovação, nem são susceptíveis
de apelação a outro juízo. Pois, nesse caso, o Romano Pontífice não fala
como pessoa privada, mas expõe ou defende a doutrina da Fé Católica
como mestre supremo da Igreja universal, no qual reside de modo singular
o carisma da infalibilidade da mesma Igreja".20
Junto com essa forma de Magistério
extraordinário, o Papa exerce também o ordinário, por meio de
orientações e ensinamentos através de encíclicas, constituições,
exortações apostólicas, discursos, etc.
Infalibilidade não significa impecabilidade
Convém lembrar, por fim, que nem do
exercício do ministério petrino, nem do carisma da infalibilidade advém
ao Romano Pontífice a impecabilidade ou, por outras palavras, a
confirmação em graça.
Três Padres Apostólicos dão importante testemunho do reconhecimento universal do primado de Pedro nos primeiros séculos da Igreja "São Clemente Romano" - Basílica de São Marcos, Veneza. "Santo Inácio de Antioquia" - Igreja do Gesù, Roma. "Santo Irineu de Lyon" - Paróquia de Santo Irineu, Centocelle, Itália |
Um dos argumentos racionalistas contra o
primado de Pedro é que o pescador da Galileia era sujeito a pecar, como
todo homem. E, sem dúvida, o era. Entretanto, seu primado não repousa
sobre qualidades humanas, mas na onipotente força do Fundador da Igreja.
A festa da Cátedra de Pedro
A Igreja celebra a festa de São Pedro em dois dias diferentes:
em 29 de junho, junto com São Paulo, e
em 22 de fevereiro, a Cátedra de Pedro. A antiquíssima origem
destaúltima festa está documentada por sua inclusão num calendário do
ano 354 e no Martyrologium Hieronymianum, o mais antigo da Igreja
Latina, composto entre 431 e 450. Há também referências a ela em duas
homilias do século V.24
Essa longa existência mostra a
relevância do símbolo da Cátedra para a vida da Igreja e reforça com o
testemunho da Tradição a importância dada ao primado petrino, pelo menos
a partir de meados do século IV, pois, segundo explica o Martyrologium
Romanum, a Sé de Pedro é"chamada a presidir a comunhão universal da
caridade". O Missal Romano acrescenta que a comemoração da Cátedra de
São Pedro põe em relevo a missão de mestre e de pastor conferida por
Cristo a São Pedro que, em sua pessoa e na de seus sucessores, é
fundamento visível da unidade da Igreja.
Cristo não chamou São Pedro por causa
das suas qualidades naturais; foi a graça de Deus que o converteu numa
rocha firme e sólida. "Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para
vos peneirar como o trigo; mas Eu roguei por ti, para que a tua
confiança não desfaleça" (Lc 22, 31-32).
No seu livro-entrevista recentemente
divulgado, Bento XVI relembrou que a tarefa exercida pelo Romano
Pontífice não foi dada por ele a si mesmo.21 Pelo contrário, é o
Espírito Santo quem escolhe o Papa, usando critérios divinos: "Não
fostes vós que Me escolhestes, mas Eu vos escolhi e vos constituí para
que vades e produzais fruto, e o vosso fruto permaneça" (Jo 15, 16).
A santidade de um Papa, portanto, não é
inerente ao ministério petrino, mas provém do esforço pessoal e,
sobretudo, da ação da graça. As eventuais infidelidades na vida de
qualquer Pontífice Romano serão sempre gravíssimas, mas não abolem sua
autoridade, já que Deus pode servir-Se de instrumentos infiéis, e o
Espírito Santo impedirá com sua assistência que os pecados pessoais
ponham em risco a integridade da Igreja, garantida pela promessa de
Nosso Senhor Jesus Cristo: "As portas do inferno não prevalecerão contra
ela" (Mt 16, 18).
Quis a Segunda Pessoa da Santíssima
Trindade, ao fundar a sua Igreja, estabelecer como chefe supremo um
homem pecável, mas infalível em matéria de Fé e moral. Isto que foi
aceito pelo consensus fidelium sem restrição, forma com a pessoa e o
primado de Pedro uma feliz união fundada na caridade e na fé.
O amor ao elo mais fraco de uma corrente mística que une a Terra ao Céu
O primado de Pedro e sua infalibilidade
são as garantias da invencibilidade da Igreja, de modo que se pode ver
no Papa a expressão da unidade e verdade eclesiais. Mas a sujeição à
autoridade suprema de um homem, não representa uma humilhação para todos
os fiéis?
A esta pergunta dá luminosa resposta um
líder católico de projeção internacional, que teve dois de seus
numerosos livros elogiados pela Santa Sé: o brasileiro Plinio Corrêa de
Oliveira (1908-1995).22 O amor por sua condição de súdito do Papa,
enquanto católico, era um dos principais traços de sua personalidade, e
não perdia oportunidade de manifestá-lo. Porque tal submissão ao Romano
Pontífice, longe de ser humilhante, é motivo de elevação e alegria para
todo o gênero humano.
Afirmou em certa ocasião o insigne
pensador que, assim como todos os relógios da terra precisam se regular
pela hora solar, assim também os católicos devem se orientar por um
outro "sol": a infalibilidade pontifícia, na qual podem depositar toda
sua confiança.
De fato, atingida pelo pecado original, a
razão humana está sujeita a toda espécie de incertezas e erros, dos
quais nascem o caos e a discórdia. Por isso - concluía Plinio Corrêa de
Oliveira -, o Papa, infalível em virtude da assistência do Espírito
Santo e com poder de jurisdição in universo orbe, é o ponto de
referência indispensável para guiar a razão humana em função da Fé.
Assim, a infalibilidade pontifícia e o
primado de jurisdição do Pontífice, necessariamente unidos, devem ser,
para todo católico, alvo de um amor preferencial.
O Professor Plinio Corrêa de Oliveira, na década de 1980 |
Como diz Dr. Plinio, "na gloriosa
corrente constituída pela Santíssima Trindade, Nossa Senhora e o Papado,
este último vem a ser o elo menos vigoroso: porque mais terreno, mais
humano e, em certo sentido, estando envolto por aspectos que o podem
menoscabar. Costuma-se dizer que o valor de uma corrente se mede
exatamente pelo seu elo mais frágil. Assim, o modo mais excelente de
amarmos essa extraordinária cadeia é oscular o seu elo menos vigoroso: o
Papado. É devotar à Cátedra de Pedro, em relação à qual esmorecem
tantas fidelidades, a nossa fidelidade inteira!".23 A essa mesma atitude
de espírito, todos somos convidados pela graça. (Pe. Eduardo Caballero
Baza, EP; Revista Arautos do Evangelho, Fev/2011, n. 110, p. 18 à 25)
__________________________________
1 Curiosamente, as manifestações
contra o primado de jurisdição universal do Romano Pontífice são muito
maiores do que contra a infalibilidade pontifícia. Ambos são dogmas de
Fé definidos solenemente no Concílio Vaticano I (cf. Dz 3050- 3075).
2 Cf. QUASTEN, J. Patrología. Hasta el Concilio de Nicea. Madrid: BAC, 2006, v.I, p.55.
3 Cf. ORLANDIS, J. El Pontificado Romano en la Historia. Madrid: Palabra, 1996, p.36; BEATRICE, P.F., Clemente Romano (Lettere di). In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane. Genova- Milano: Marietti, 2008, p.1073-1077.
4 Santo Ireneu assevera que São João permaneceu na Igreja de Éfeso até o reinado do Imperador Trajano (98-117). (Cf. Adversus hæreses, III, 3, 4).
5 Cf. SANTO IGNACIO DE ANTIOQUÍA. Epístola a los Romanos, III, 1; IV, 3; IX, 1. In: D. RUIZ BUENO. Padres Apostólicos. Madrid: BAC, 1950, p.476-477.480.
6 Cf. SANTO IRINEU DE LYON, op. cit., III, 3, 2-3.
7 Eusébio de Cesareia faz a descrição dessa polêmica. Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA. História da Igreja, l.5, 23- 25. In: Eusebius - The Church History. A new translation with commentary by Paul L. Mayer. Grand Rapids (MI): Kregel, 1999, p.197-200.
8 TERTULIANO. De pudicitia, 21. In: QUASTEN, J., op. cit., p.631.
9 Idem, ibidem.
10 Cf. SESBOÜE, B. - THEOBALD, C. Historia de los dogmas. La Palabra de la Salvación. Salamanca: Secretariado Trinitario, 1997, v.IV, p.59.
11 Também denominada Tomus ad Flavianum, na qual expõe com inspirada clareza a doutrina católica sobre as duas naturezas, divina e humana, de Cristo (cf. TREVIJANO, R. Patrología. Madrid: BAC, 2004, p.314).
12 Cf. CONCILIUM CHALCEDONENSE, Actio II(III), n.23.
13 Cf. DE VRIES, W. Orient et Occident. Paris: Les editions du Cerf, 1974.
14 Cf. Dz 3064.
15"A Sé Primeira não pode ser julgada por ninguém" (CDC, c.1404).
16 Cf. Dz 3059.
17 Cf. Dz 3062; CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.22.
18 Cf. Dz 3063.
19 Cf. Dz 3073-3075.
20 CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.25.
21 Cf. BENTO XVI - SEEWALD, Peter. Licht der Welt. Der Papst, die Kirche und die Zeichen der Zeit. Freiburg-Basel-Wien: Herder, 2010, p.166.
22 As ideias do Prof. Corrêa de Oliveira aqui expostas foram extraídas de palestras e conferências inéditas, pronunciadas nas décadas de 80 e 90.
23 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. "Non prævalebunt". In: Dr. Plinio. São Paulo. N.47 (Fev., 2002); p.2.
24 Cf. J. DRESKEN-WEILAND. Cattedra. In: BERARDINO A. Di (ed.). Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane. Genova-Milano: Marietti, 2008, p.965-969; SAXER, V. - HEID, S. Martirologio. In: BERNARDINO, op cit., p.3098-3101.
2 Cf. QUASTEN, J. Patrología. Hasta el Concilio de Nicea. Madrid: BAC, 2006, v.I, p.55.
3 Cf. ORLANDIS, J. El Pontificado Romano en la Historia. Madrid: Palabra, 1996, p.36; BEATRICE, P.F., Clemente Romano (Lettere di). In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane. Genova- Milano: Marietti, 2008, p.1073-1077.
4 Santo Ireneu assevera que São João permaneceu na Igreja de Éfeso até o reinado do Imperador Trajano (98-117). (Cf. Adversus hæreses, III, 3, 4).
5 Cf. SANTO IGNACIO DE ANTIOQUÍA. Epístola a los Romanos, III, 1; IV, 3; IX, 1. In: D. RUIZ BUENO. Padres Apostólicos. Madrid: BAC, 1950, p.476-477.480.
6 Cf. SANTO IRINEU DE LYON, op. cit., III, 3, 2-3.
7 Eusébio de Cesareia faz a descrição dessa polêmica. Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA. História da Igreja, l.5, 23- 25. In: Eusebius - The Church History. A new translation with commentary by Paul L. Mayer. Grand Rapids (MI): Kregel, 1999, p.197-200.
8 TERTULIANO. De pudicitia, 21. In: QUASTEN, J., op. cit., p.631.
9 Idem, ibidem.
10 Cf. SESBOÜE, B. - THEOBALD, C. Historia de los dogmas. La Palabra de la Salvación. Salamanca: Secretariado Trinitario, 1997, v.IV, p.59.
11 Também denominada Tomus ad Flavianum, na qual expõe com inspirada clareza a doutrina católica sobre as duas naturezas, divina e humana, de Cristo (cf. TREVIJANO, R. Patrología. Madrid: BAC, 2004, p.314).
12 Cf. CONCILIUM CHALCEDONENSE, Actio II(III), n.23.
13 Cf. DE VRIES, W. Orient et Occident. Paris: Les editions du Cerf, 1974.
14 Cf. Dz 3064.
15"A Sé Primeira não pode ser julgada por ninguém" (CDC, c.1404).
16 Cf. Dz 3059.
17 Cf. Dz 3062; CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.22.
18 Cf. Dz 3063.
19 Cf. Dz 3073-3075.
20 CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.25.
21 Cf. BENTO XVI - SEEWALD, Peter. Licht der Welt. Der Papst, die Kirche und die Zeichen der Zeit. Freiburg-Basel-Wien: Herder, 2010, p.166.
22 As ideias do Prof. Corrêa de Oliveira aqui expostas foram extraídas de palestras e conferências inéditas, pronunciadas nas décadas de 80 e 90.
23 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. "Non prævalebunt". In: Dr. Plinio. São Paulo. N.47 (Fev., 2002); p.2.
24 Cf. J. DRESKEN-WEILAND. Cattedra. In: BERARDINO A. Di (ed.). Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane. Genova-Milano: Marietti, 2008, p.965-969; SAXER, V. - HEID, S. Martirologio. In: BERNARDINO, op cit., p.3098-3101.
Nenhum comentário:
Postar um comentário