domingo, 31 de março de 2013

História da Igreja Católica (Parte 6)


27. Clemente de Alexandria e Orígenes
Tito Flávio Clemente é possivelmente originário de Atenas, nascido por volta de 150. Depois de se converter, viajou pela Itália, Síria, Palestina e se estabeleceu em Alexandria, tornando-se aluno de Panteno. Sucedeu o mestre como professor depois do ano 200. Durante a perseguição de Sétimo Severo saiu do Egito e foi para a Ásia Menor, onde morreu antes de 215.
Obras: Exortação aos gentios, O Pedagogo, Seleções (stromata). Clemente atribui uma espécie de caráter sobrenatural à filosofia grega. Procurou fazer uma síntese entre a fé e a filosofia. Ensinava a eternidade da matéria e do mundo, acreditava no caráter sacrifical da eucaristia. 
Orígenes nasceu em Alexandria, em torno do ano 184. Leônidas, seu pai, morreu como mártir em 202. Sentia um forte desejo de ir para o martírio. Foi colocado à frente da Escola de Alexandria em 203, pelo bispo Demétrio. Sua fama se espalhou por toda a parte, atraindo inclusive pagãos para suas palestras. Em 212 visitou Roma. Passou em seguida pela Grécia e pela Palestina, onde recebeu a ordenação. A mãe do imperador Alexandre Severo o chamou até Antioquia, para ouvir seus discursos. Por volta de 232 houve um desentendimento com Demétrio, que o levou a se transferir para Cesaréia, na Palestina. Lá um de seus mais fervorosos discípulos é o futuro São Gregório Taumaturgo. Morreu em 254, por causa dos ferimentos que sofreu durante a perseguição de Décio. Eusébio o apelidou de Adamántios (homem de aço) por causa do rigor de seu ascetismo.
Depois de morto, Orígenes foi condenado várias vezes e teve sua obra parcialmente destruída.
O número de trabalhos e livros que escreveu é vastíssimo, ultrapassando todos os Padres da antigüidade. Alguns exemplos: os Hexapla, onde reunia em seis colunas diversas versões do Antigo Testamento (hebraico, transcrição do hebraico para o grego, tradução de Áquila, de Símaco, dos LXX e de Teodocião), Contra Celso (apologia contra as acusações feitas pelo filósofo platônico Celso, no séc. II), Da oração, Exortação ao martírio, Disputa com Heráclides.Orígenes imaginava a criação como um ato eterno. Era subordinacionista. Afirmou que a fé na presença real de Cristo na eucaristia é a "mais comum entre os cristãos". Atesta, sem dúvida alguma, o caráter sacrifical e expiatório da Santa Missa. Para ele, as almas dos pecadores, depois de algum tempo no Inferno, seriam regeneradas e salvas (apokatástasis pánton).Inspirados em Orígenes e na Escola de Alexandria, muitos escritores cristãos desenvolveram suas obras: Júlio Africano, Amônio, Dionísio de Alexandria, o Grande, Gregório, o Taumaturgo, Firmiliano, bispo de Cesaréia, na Capadócia, Teognostos, Pedro de Alexandria, Pânfilo e Hesíquio.

28. São Cipriano de Cartago  

Thascius Cecilius Cyprianus, nascido de uma família rica e pagã, em Cartago, entre os anos 200-210. Recebeu em 246 o batismo, sendo ordenado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade. Suas atividades pastorais foram interrompidas pela perseguição de Décio (250), que o forçou a se esconder. Quando muitos apóstatas começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja surgiu um cisma.

Em 251, Cipriano volta para Cartago. Num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista e determinou que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade. A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África. Nos últimos anos de sua vida, teve de se preocupar com a questão do batismo dos hereges.Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges. Mesmo com a reprovação do papa Estevão, insistiu em manter seu ponto de vista. Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, sob Valeriano. Pelo martírio certamente foi perdoado de seu erro e foi para junto de Cristo.Escritos de São Cipriano: De ecclesia unitate (c. 251, no qual fica do lado do papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.No aspecto doutrinário, o bispo de Cartago ensinava que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. "Salus extra ecclesiam non est", não há salvação fora da Igreja. "Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?" "Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe". Os recém-nascidos devem receber logo o batismo e a eucaristia. Uma tradição só é válida quando se apóia na "tradição evangélica e apostólica", ou seja, aquela tradição que provém da "autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos". Na questão do batismo, ensina que se a verdade se desvia é preciso retornar para as origens, a tradição consignada nas Escrituras. A origem da verdade cristã é a Tradição, o ensinamento de Jesus e a pregação dos apóstolos (observemos, no entanto, que Cipriano dava muito crédito a revelações e visões particulares). O sacrifício do sacerdote é a repetição do sacrifício de Jesus na ceia: ambos representam o único sacrifício da cruz. A penitência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação. Todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte. O estado intermediário no Hades se aplica aos penitentes somente.

29. Os sacramentos no século III

Sobre a liturgia deste período, temos várias fontes. Hipólito, em sua Tradição Apostólica, fala sobre o batismo, a eucaristia, a ordenação... Vejamos como era:Batismo - Atestação claríssima do batismo de crianças. Logo ao amanhecer, ora-se sobre a água que vai ser usada no batismo. O sacerdote ordena a cada um dos catecúmenos que renuncie a Satanás. Os que renunciam são ungidos com o óleo do exorcismo, consagrado pelo bispo. Depois, na água, aquele que batiza pergunta ao catecúmeno se este crê no Pai, no Filho e no Espírito Santo (profissão de fé já parecida com o símbolo apostólico atual), mergulhando-o a cada resposta afirmativa. Quando saem da água, os neófitos são ungidos com o óleo de ação de graças. Todos se vestem e se dirigem para a igreja, onde recebem a imposição de mãos do bispo e são ungidos (Crisma). Depois de marcar o neófito na testa, o bispo lhe dá um beijo e diz: "O Senhor esteja contigo". O que foi marcado responde: "E com o teu espírito". Todos tomam parte na assembléia depois que recebem o sacramento da Confirmação.Eucaristia - Os diáconos apresentam a oblação ao bispo, que impõe as mãos sobre ela e diz, com o presbitério: "O Senhor esteja convosco". A assembléia responde: "E com teu espírito". "Elevai vossos corações. - Nós os temos voltados para o Senhor. - Demos graças ao Senhor. - É digno e justo". O bispo prossegue dando graças a Deus e lembrando os feitos da História da Salvação (oração eucarística). Invoca o Espírito Santo sobre a oblação e repete as palavras de Jesus na última ceia.Ordenação - O bispo deve ser irrepreensível e é eleito pela comunidade. Feita a escolha, o povo se reúne com o presbitério e outros bispos presentes. Os bispos impõem as mãos sobre aquele que vai ser ordenado, enquanto o presbitério fica imóvel. Todos ficam em oração pedindo a descida do Espírito Santo. Um dos bispos, escolhido por todos, impõe as mãos sobre o que está sendo ordenado e faz uma oração, lembrando os sacerdotes da antiga Aliança e pedindo a vinda do Espírito Santo.
Pede para o novo bispo o poder sacerdotal, o poder de oferecer a eucaristia, perdoar os pecados, dirigir a comunidade, ligar e desligar, pastorear com sabedoria e pureza o rebanho que lhe é confiado. O clero compreende sete classes: bispos, diáconos, subdiáconos, acólitos, leitores, exorcistas e ostiários. Esta divisão, porém, não é rígida, e não exclui a possibilidade de uma pessoa desempenhar mais de uma função.
Penitência - A penitência é pública, e a reparação depende da gravidade do pecado cometido.A Didascália, documento dos primeiros decênios do século III prescreve um jejum de seis dias antes da Páscoa.

30. Celibato e virgindade

Na época da Igreja apostólica, o celibato possui um valor positivo e é reconhecido como estado de vida ao lado do matrimônio. Tanto um como o outro eram vistos como carismas particulares. É possível que tenham havido casos de matrimônios "espirituais", em que homem e mulher viviam juntos como irmãos (Paulo fala de uma situação como esta em sua primeira epístola aos Coríntios, por volta do ano 57). No final do séc. I e no séc. II existem muitos homens e mulheres celibatários (ascetas e virgens) "em honra da carne do Senhor" (Inácio de Antioquia). A princípio, havia uma ambigüidade entre a virgindade e o estado de viuvez permanente. Por volta de 150, Justino se refere a homens e mulheres que se conservaram "incorruptos", alcançando a idade de 60 ou 70 anos. O mesmo diz Atenágoras, em torno do ano 177. Apesar disso, ainda não existe no séc. II uma forma definida para o celibato cristão.Na virada do segundo para o terceiro século, sob influência da gnose e do encratismo, surgem apologias a favor do celibato como estado de vida melhor do que o matrimônio. Clemente de Alexandria defende a santidade do casamento e ensina que a continência só é virtuosa quando vivida por amor a Deus. Aos poucos começa a se impor um novo ponto de vista, que considera a virgindade como uma forma de matrimônio místico com o Senhor. Após o ano 200, as "virgines Deo devotae" usam véu para indicar suas núpcias espirituais (Tertuliano, Sobre a oração, 22, escrito entre 200 e 206). Mas o voto de virgindade não possui caráter de ordenação, como atesta Hipólito em sua Tradição Apostólica.Para Orígenes (que havia se castrado depois de ler Mt 19,12, detalhe peculiar) a virgindade supera o matrimônio porque enquanto este é figura da união de Cristo com a Igreja, aquela é sua realização mística e mais perfeita. Novaciano compara a virgindade com o estado angélico e Tertuliano leva ao extremo a sua exaltação, influenciado pelo montanismo. Cipriano vê a consagração virginal como esponsais com Cristo. Ele é o primeiro a usar o termo "virgindade" para se referir ao celibato masculino. Metódio de Olimpo (+311) fala dos celibatários Elias, Eliseu, João Batista, João Evangelista e Paulo, entre outros.A Igreja síriaca, até o séc. III, conserva o costume do celibato em família (os filhos consagrados permaneciam com os pais). Efrém reagirá contra esta prática. Hilário de Poitiers chamará de caelebs o não casado por razões de fé e de coelibatus o seu estado de vida.Atanásio (295-373), que conhece o ideal monástico de Santo Antão, define o matrimônio como "via mundana", enquanto a virgindade é o caminho mais eficaz para alcançar a perfeição.
Quando se encerrar o terceiro século, o celibato terá finalmente encontrado seu lugar na vida e na espiritualidade cristãs: estado superior ao casamento, comparado com a condição angélica, esponsais com Cristo, núpcias místicas, oferecimento total e perfeito a Deus. O monaquismo lhe dará forte impulso.
No ano 300, o Concílio de Elvira, na Espanha, determina a obrigatoriedade do celibato para os padres e bispos da província. Com o passar do tempo esta disciplina se estenderá a toda a Igreja.

31. O cânone das Escrituras

a) O Antigo Testamento
Retrospecto histórico:
  • Na época de Jesus, os hebreus não possuíam um cânone de livros inspirados. O primeiro esboço de um cânone se acha no prólogo do Eclesiástico: "A Lei, os profetas e os outros escritos". A Lei é certamente a Torá, ou Pentateuco, que provavelmente adquiriu sua forma definitiva no tempo de Esdras. Os profetas incluem Js, Jz, 1Rs, 2Rs, Is, Jr, Ez e os doze profetas menores. Sobre os "outros escritos" não se tem uma ainda uma definição precisa.
  • A versão grega dos Setenta (LXX), feita por judeus em Alexandria entre o séc. III a.C. e o início da era cristã, incluiu os livros que hoje chamamos de deuterocanônicos, e alguns apócrifos. Não se pode dizer, no entanto, que a LXX estabeleceu um cânone normativo (os códices que nos chegaram apresentam diferenças).
  • Na Palestina, por volta de 95, Flávio Josefo (37-100) escreve uma lista que coincide com o cânone hebraico, excluindo os deuterocanônicos. Apesar disso, encontram-se em seu trabalho citações de 1Mc, 1Esd e suplementos de Est. Portanto, não podemos concluir a partir do seu testemunho que o judaísmo já tivesse fixado o seu cânone no final do séc. I.
  • Em Qumrã se encontram todos os livros protocanônicos, exceto Est. Dos deuterocanônicos foram encontrados Br 6, Tb e Eclo. Dos apócrifos, Jubileus, Enoc e o Testamento dos doze patriarcas. Aparentemente não havia uma distinção entre um cânone de livros sagrados e outros textos não-inspirados.
  • Entre os anos 90-100 houve um sínodo de rabinos na cidade de Jâmnia. Uma tese tradicional propõe que a lista definitiva dos livros do Antigo Testamento foi fixada neste sínodo. Mas não há provas concretas de que isto realmente tenha acontecido. Mesmo depois de Jâmnia a canonicidade de alguns livros continuou a ser discutida (Ecl e Ct).
Baseado nessas considerações, Valério Manucci propõe a seguinte explicação para a formação do cânone hebraico:
  • Depois da destruição do Templo, no ano 70, o judaísmo se tornou cada vez mais uma religião "do Livro", o que impôs a necessidade de determinar um cânone definitivo.
  • Várias disputas entre os fariseus e outras seitas judaicas serviram de estímulo para a fixação de um cânone.
  • Ainda que no primeiro século da nossa era houvesse uma aceitação popular de 22 ou 24 livros como inspirados, não existiu um cânone normativo até o final do séc. III.
  • O fato de os cristãos terem adotado a tradução dos LXX pode ter influenciado decisivamente a definição de um cânone mais restrito no judaísmo, excluindo os deuterocanônicos.
De resto, se realmente houvesse um cânone já estabelecido antes do nascimento de Jesus, certamente os judeus de Alexandria, fiéis às orientações dos rabinos da Palestina, não teriam inserido os deuterocanônicos na sua tradução.Entre os cristãos, no Novo Testamento, aparece a tríplice divisão indicada no Eclesiástico (Lc 24,44). Há alusões a livros deuterocanônicos: Sb (Rm 1,19ss; Hb 8,14), Tb (Ap 8,2), 2Mc (Hb 11,34s), Eclo (Tg 1,19), Jt (1Cor 2,10) e nem todos os protocanônicos são citados (Esd, Ne, Rt, Ecl, Ct, Ab, Na, Pr). Também há alusões a livros apócrifos: Salmos de Salomão, 1 e 2 Esdras, 4 Macabeus, Assunção de Moisés e o livro de Enoc.Jesus se serviu do Pentateuco para discutir com os saduceus (que aceitavam apenas esta parte do AT como inspirada, cfr. Mt 22,23-33; Mc 12,18-27; Lc 20,27-40) e, ao que parece, usou a Bíblia hebraica em debates com os fariseus (cfr. Mt 23,34-36; Lc 11,49-51). Esta "adaptação aos interlocutores" não nos permite dizer que Cristo tenha reconhecido um cânone para o AT, e muito menos que este cânone seja o da Bíblia hebraica.Das 350 citações que o Novo Testamento faz do AT, 300 são da LXX. Como não havia, porém, cânone definido no período neotestamentário, os cristãos ainda não possuíam um cânone próprio.Os Padres Apostólicos citam a versão dos LXX. A Didaqué usa Eclo e Sb. Clemente, em sua epístola aos Coríntios, se serve de Jt, Sb, Eclo, Dn e passagens de Est grego. Policarpo cita Tb. O Pastor de Hermas cita Eclo, Sb e 2Mc. Também há citações de apócrifos, como o livro de Enoc.O mesmo se dá com outros autores do fim do séc. II e começo do séc. III, como Ireneu, Clemente de Alexandria, Tertuliano, Hipólito, Cipriano e Dionísio Alexandrino. Á medida, porém, que os judeus determinavam a sua lista, as igrejas que viviam em contato com a comunidade hebraica sofriam sua influência. São Justino, quando entra em polêmica com os judeus, prefere citações apenas dos protocanônicos, mas ensina que todos os livros presentes na tradução dos LXX são inspirados, "mesmo aqueles que os judeus suprimiram arbitrariamente". Melitão de Sardes, no entanto, possui uma lista de livros do AT com quase todos os protocanônicos e nenhum deuterocanônico.O Concílio de Laodicéia (360) defende o cânone hebraico. Mas a carta do papa Inocêncio I a Exupério de Toulouse (405) inclui o cânone completo. Mais tarde, os concílios provinciais de Hipona (393) e Cartago (I e II, 397 e 419, respectivamente) aceitarão oficialmente os deuterocanônicos como parte das Escrituras (mesmo que alguns padres, como Atanásio, Cirilo de Jerusalém, Gregório Nazianzeno, Rufino e Jerônimo, se sintam ainda atraídos pela Hebraica Veritas). No Concílio de Trullo (692) a ambigüidade continua: os cânones de Laodicéia e de Cartago são sancionados ao mesmo tempo!Só no século XV um concílio ecumênico se ocupará do assunto. O Concílio de Florença (1441) enumerará o cânone aceito pela Igreja hoje, e o Concílio de Trento, no século XVI, definirá solenemente o AT com os deuterocanônicos.
b) O Novo Testamento
O desenvolvimento do cânone do Novo Testamento, embora complicado, foi menos tortuoso que o do AT.A segunda epístola de Pedro coloca as cartas de Paulo ao lado das "outras escrituras" (2Pd 3,16). Logo, no final do século I algumas cartas paulinas já são tidas como inspiradas. Em meados do séc. II, São Justino fala dos Evangelhos que são usados nas assembléias litúrgicas e a segunda carta de Clemente aos Coríntios (c. de 150) cita um versículo do Evangelho de Mateus.A seleção que Marcião fez de 10 cartas de Paulo e do Evangelho de Lucas, provavelmente, fez com que os cristãos procurassem reunir sua própria coleção de escritos inspirados.Por volta do ano 170, Melitão de Sardes chama os livros da Bíblia hebraica de "Antigo Testamento", em contraposição ao Novo Testamento da Igreja. Mas o primeiro a usar o termo "Novo Testamento" foi Tertuliano, em torno do ano 200.Nenhum autor do séc. II ou do séc. III cita todos os livros do NT, e há livros que não são citados por ninguém (Fm e 3Jo). A lista mais antiga do NT é o famoso Fragmento Muratoriano, que indica o NT usado pela Igreja de Roma no final do segundo século. Nela não estão incluídos Hb, Tg, 1 e 2Pd, e talvez 3Jo. A lista feita por Orígenes no séc. III levanta dúvidas sobre a inspiração de 2Pd e de 2 e 3Jo. Por volta do ano 310, Eusébio distingue entre "os livros reconhecidos por todos" (emologoumenoi), "os livros discutidos" (antilegomenoi) e "os livros espúrios" (notha). Tg e Jd estão entre os discutidos.O Cânone Claromontano, datado do séc. IV, não menciona Hb. O Cânone Momseniano, de mais ou menos 360, não fala de Hb e Jd. No Ocidente, só com as listas do final do séc. IV, feitas por Atanásio, Agostinho, pelos concílios de Hipona e de Cartago, é que se chega a um consenso. Elas coincidem com o cânone definido do Concílio de Trento. O Códice Sinaítico, do séc. IV, inclui também a carta de Barnabé e o Pastor de Hermas. O Códice Alexandrino, do séc. V, traz 1 e 2 Clemente.As igrejas da Síria e de Antioquia usavam, no séc. IV, um cânone restrito do NT com apenas 17 livros.Alguns livros eram discutidos porque não se podia ter certeza de sua autoria apostólica, por causa de aspectos doutrinários controvertidos ou por sua brevidade.
c) A Igreja discerniu o cânone
Desde os primeiros esboços até a definição solene, a história da evolução do cânone revela, antes de mais nada, a importância da autoridade do Magistério da Igreja, guardião da Tradição Apostólica, que soube discernir infalivelmente, entre inúmeros escritos espúrios, aqueles que o Espírito Santo havia inspirado e que formam a Palavra de Deus.
Escritura, Tradição, Igreja: elementos intimamente conectados e que não se deve separar nunca sem cair em grave erro.

(Continua...)

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