32. Mani
Mani ou Manes nasceu na Pérsia em torno do ano 215. Seu pai era da
seita judaico-cristã dos alexeítas. Segundo seus seguidores, aos 24 anos
começou a ensinar uma doutrina dualista: existem dois princípios, um
bom e outro mal, que travam um combate eterno e se personificam em Deus e
no demônio. O demônio é um ser divino em pé de igualdade com Deus
(influência do Zoroastrismo). Da tradição indiana, Mani aproveitou o
dogma da reencarnação ou transmigração das almas. Jesus Cristo era Deus,
um mensageiro da luz, a força divina que veio auxiliar o homem na luta
contra o mal.
Seus discípulos seguiam uma disciplina rígida. Proclamavam-se
"eleitos" e "santos". O maniqueísmo se espalhou logo, com a proteção do
rei Sapor II, e chegou ao Império Romano em meados do século III. O
imperador Diocleciano teve de tomar providências para inibir sua
propagação.
Mani morreu no ano 270, na Pérsia, depois de julgado como herege pelo
clero zoroastriano. Segundo alguns acabou seus dias na prisão, segundo
outros foi crucificado e esfolado, tendo sua pele posta como ornamento
em um templo iraniano.
Onde chegou, o maniqueísmo foi perseguido. Nos últimos anos do século III, começou a se tornar um perigo para a Igreja.
33. O algoz se curva diante da cruz
Quando a perseguição de Diocleciano chega ao seu apogeu acontece algo
inesperado. No dia primeiro de março de 305 os dois Augustos,
Diocleciano e Maximiano, renunciam ao seu posto, deixando seus lugares
para os dois Césares, Galério e Constâncio Cloro.
Constâncio Cloro, senhor do Ocidente, era muito tolerante. Quando
assumiu o poder, "as regiões situadas além da Ilíria, ou seja, a Itália
inteira, a Sicília, a Gália e todos os países do Ocidente, a Espanha, a
Mauritânia e a África, depois de terem sofrido a violência da guerra
durante os primeiros anos da perseguição, prontamente obtiveram da graça
divina o benefício da paz" (Eusébio de Cesaréia).
O Oriente, no entanto, teve de enfrentar a ira do César Maximino
Daia, instigado por Galério. Em 306 foi publicado um edito que obrigava
todos os súditos a sacrificarem aos deuses. No Egito a perseguição foi
tão terrível que muitos cristãos, para fugir da desonra, cometeram
suicídio. Os que não morriam eram submetidos a grandes vexações: as
mulheres eram entregues à prostituição, os homens condenados a trabalhos
forçados nas pedreiras e nas minas.
Maxêncio, em Roma, é tolerante. Licínio, que governa as províncias do
Danúbio, também não persegue os cristãos. Constantino, filho de
Constâncio, não tem a menor intenção de atacar a Igreja de Jesus.
Aos poucos o sistema da tetrarquia irá se arruinando. Lutas pelo
poder, legiões revoltadas, batalhas... Os mesmos males que afligiram o
Império no século anterior ressurgirão com vigor. A Igreja atravessará
uma tempestade e tanto, dependendo da índole do Augusto que estiver no
poder. Freqüentemente a tolerância trocará de lugar com a perseguição.
No período que vai do ano 305 até o ano 324, não haverá paz no Império.
Em 311, Galério, levado por uma terrível doença e por remorsos,
assina um edito, rubricado por Licínio e Constantino, encerrando a
perseguição no Oriente: primeiro grande triunfo do testemunho dos
mártires e prenúncio de novos tempos para a Igreja.
Maximino Daia, a contragosto, liberta os prisioneiros cristãos.
Quando Galério morrer, poderá descarregar novamente sua fúria. Medidas
discriminatórias, panfletos cheios de calúnias, confissões forjadas,
todos os meios serão por ele utilizados para destruir a Igreja. Mas o
tempo mostrará a inutilidade de seus esforços.
34. Constantino vencedor
Nascido na Sérvia, por volta do ano 280, Constantino estava destinado
a mudar o rumo da História. Filho de Constâncio Cloro e de Helena,
educado na corte de Diocleciano, depois de passar tempos junto de
Galério, o que não o agradava muito, afastou-se quando seu pai o chamou
para uma expedição na Inglaterra.
Alma complexa, reunia em si características contraditórias: ora
vigoroso e impetuoso, ora desanimado e influenciável. Às vezes cheio de
generosidade e clemência, outras violento e sangüinário, impiedosamente
cruel. Humilde e orgulhoso, instável, instintivo, supersticioso. Foi de
um ser humano assim que a Providência quis se servir para dar a vitória à
Igreja.
Depois que Constâncio Cloro morreu, em 306, as legiões o proclamaram
Augusto. Galério, no entanto, fez dele apenas um César. Constantino
pasou a ser o detentor de todo o poder no Ocidente, provocando a inveja
de Maxêncio, filho de Maximiano.
Constantino se casou com Fausta, irmã de Maxêncio. Advertido por sua
esposa de que o sogro (Maximiano) armava uma conspiração para matá-lo,
deu um jeito de encontrarem o ex-Augusto enforcado em uma prisão.
Em 311, após a morte de Galério, a situação de Roma fica assim: no
Oriente, Maximino Daia e Licínio, no Ocidente, Maxêncio e Constantino.
Maxêncio e Constantino não estavam dispostos a dividir o poder.
Maxêncio, o Augusto, declara-se o único soberano legítimo e sucessor
dos imperadores. Em 312, Constantino parte para a batalha. 40 mil ao seu
lado contra 100 mil de Maxêncio. O filho de Constâncio cruza os Alpes e
toma várias cidades italianas. Em 27 de outubro de 312 já avista de
longe a Cidade Eterna. Um dia depois, as tropas do seu inimigo
atravessam o Tibre pela ponte de Mílvio. O confronto é deflagrado e as
tropas de Constantino saem vitoriosas. O exército de Maxêncio foge em
debandada, enquanto este último perece no meio da confusão.
Durante a batalha, Constantino adere ao cristianismo. Segundo alguns
invocou Jesus Cristo e por isto obteve a vitória. Para Lactâncio,
Constantino teve um êxtase no qual recebeu a ordem de colocar sobre o
escudo de suas tropas um sinal formado pelas letras gregas X (chi) e P
(rô), iniciais de Cristo. De fato, tal monograma foi encontrado em
moedas e inscrições constantinianas.
Eusébio de Cesaréia nos refere outra versão. Instantes antes de
enfrentar Maxêncio, o imperador apelou para o Deus dos cristãos, que lhe
respondeu através de um sinal celeste: uma cruz luminosa acompanhada da
frase: "Com este sinal vencerás". Na noite seguinte, Jesus lhe apareceu
e pediu que fizesse da cruz uma insígnia, o Labarum.
Desde então os exércitos de Constantino usaram o Labarum como estandarte.
Para alguns, a "conversão" de Constantino foi apenas uma jogada
política, uma tentativa de atrair para o Império a força do
cristianismo. No entanto, tal tese é muito simplista. Como a maioria das
pessoas da sua época, Constantino tinha obsessão pelo sobrenatural e
era muito crédulo. Talvez tenha sido movido pelo medo de um fim trágico,
que aguardava todos os que se opunham ao cristianismo. De qualquer
jeito, nunca saberemos com certeza o que levou o jovem e impetuoso
soldado a render-se diante do crucificado. Resta-nos apenas a
constatação dos fatos e de suas conseqüências.
35. O Edito de Milão
Entrando vencedor em Roma, Constantino foi bem acolhido pelo povo e
pelos mais abastados. Mandou matar um filho de Maxêncio e alguns de seus
amigos. Reparou os aquedutos com dinheiro do próprio bolso. Aceitou sem
problemas a bajulação e as honras "divinas" dos seus súditos pagãos,
autorizando inclusive a construção de um templo e a fabricação de uma
estátua a ele dedicados. A transição da tolerância para a intolerância
diante do paganismo será lenta.
Mandou fazer nas moedas o monograma X-P e enviou uma carta a Maximino
Daia "convidando-o" a suspender a perseguição. No inverno de 312-313, o
tesouro contribuiu para que fossem reconstruídos os edifícios de culto e
o papa Milcíades obteve de Fausta o palácio de Latrão.
No começo do ano 313 Constantino se encontra com Licínio em Milão
(Licínio acabara de se casar com Constança, irmã de Constantino).
Durante dois meses eles conversam sobre diversos pontos de suas
políticas e, particularmente, sobre como deve ficar a situação do
cristianismo. Destas conversações nasce um acordo que hoje conhecemos
como o "Edito de Milão".
Não se trata de nenhum documento especial, mas de um conjunto de
cartas de Constantino e Licínio que afirmam o princípio da liberdade
religiosa e, por conseguinte, dão aos cristãos pleno direito de
professar sua fé "sem receio de ser incomodados".
A Igreja, oficialmente reconhecida, passa a ter direitos: seus
lugares de culto, destruídos ou confiscados, devem ser restituídos. As
propriedades devem retornar para as mãos dos seus donos cristãos. O
cristianismo fica em pé de igualdade com o paganismo, uma religião
"lícita". Licet esse Christianos.
Logo chegará o momento, porém, em que o paganismo será definitivamente suplantado pelo cristianismo.
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