“E tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho” Jo 14:13
Em seu livro “Exija seus direitos” RR Soares, líder da Igreja
Internacional da Graça ensina que o crente não deve pedir a bênção, mas
determiná-la ou exigir como um direito. A suposta base bíblica para essa
sua doutrina nefasta é Jo 14:13, muito embora ele a credite a Kenneth
Hagin. Ambos afirmam que “a palavra pedirdes foi mal traduzida” e que
aiteo “deveria ter sido traduzido por exigirdes ou determinardes” (p.
42). Segundo ele “continuar orando, pedindo, suplicando por algo que já é
seu é declarar que a Palavra do Senhor pode não ser a verdade” (p. 45).
Chega ao extremo de dizer que ser paciente e suportar a provação é dar
lugar ao Diabo (p. 78).
No livro ele afirma que não é versado em grego. Mas acreditou
piamente no que Hagin lhe disse. Depois disse que conferiu no dicionário
de Strong e que de fato a palavra aitéo também pode significar exigir,
determinar. A propósito, ele define determinar como “a nossa ação com
base na Palavra de Deus, o que nada mais é do que tomar posse da bênção e
exigir os nossos direitos” (p. 27).
O significado de um termo deve ser buscado no uso que os autores
fizeram dele nas escrituras. E quando examinamos o uso de aiteo nas
Escritura descobrimos que ele jamais é utilizada com o sentido que RR
Soares e Hagin lhe emprestam. E também descobrimos que as palavras
determinar, ordenar, exigir, etc. jamais são utilizadas pelo homem para
obter algo de Deus. Portanto, se Soares valoriza a Palavra de Deus como
diz valorizar, deveria ter o mínimo cuidado para utilizá-la sem
distorcer o seu significado, semeando o erro no meio do povo de Deus.
O significado bíblico de aiteo
As principais traduções e versões bíblicas traduzem aiteo como pedir.
Tomando Jo 14:13. A Tradução Brasileira também fez essa tradução, bem
como a Nova Tradução na Linguagem de Hoje. Estariam todos os tradudores
enganados ou mal intencionados ao esconderem o sentido de ordenar em
suas traduções? Veremos que não.
Antigo Testamento
O termo aiteo e seus cognatos são utilizados no Antigo Testamento 65
vezes na Septuaginta. O sentido é sempre de pedir, implorar, suplicar, e
nunca de ordenar ou determinar. Assim, temos Elias dizendo a Eliseu
“pede-me o que queres” (2Re 2:9); Jabez invocou a Deus dizendo “Oh!
Tomara que me abenções” e Deus lhe deu “o que lhe tinha pedido” (1Cr
4:10); a Salomão Deus disse “pede-me o que queres que eu te dê” (2Cr
1:7) e o próprio Salomão deu à rainha de Sabá “tudo o que ela desejou e
pediu” (2Cr 9:12). Vemos também Esdras dizendo que teve “vergonha de
pedir ao rei” (Ed 8:22), enquanto que Neemias diz “pedi licença ao rei”
(Ne 13:6) para voltar a Jerusalém. Davi não determinou, mas orou “uma
coisa peço ao Senhor” (Sl 27:4), Salomão, mesmo sendo mais ousado disse
“duas coisas te peço” (Pv 30:7). Isaías disse a Acaz “pede ao Senhor,
teu Deus, um sinal” (Is 7:11) e Jeremias observou que durante o cerco de
Jerusalém “os meninos pedem pão” (Lm 4:4). Para que seus três amigos
fossem constituídos sobre os negócios da Babilônia, Daniel não
determinou ao rei, mas fez um pedido (Dn 2:49). Finalmente, Zacarias
disse “pedi ao Senhor chuva no tempo das chuvas serôdias” (Zc 10:1).
Em todas as passagens acima a Septuaginta utiliza aiteo, e em
nenhuma delas a tradução determinar é cabível. Imagine Eliseu exigindo
de Elias a porção dobrada, Jabez ordenando a Deus que alargasse os seus
limites, Salomão determinando que Deus lhe desse sabedoria e a rainha,
em sua visita de cortesia a Salomão ordenasse que este lhe desse o que
ela desejasse! Seria absurdo. Como seria despropositado também que
Esdras, Neemias e Daniel exigissem seus direitos junto ao rei, que Davi,
Salomão e Acaz dessem ordens a Deus e meninos famintos exigissem seus
direitos! Portanto, o uso que os setenta fizeram de aiteo na tradução do
Antigo Testamento para o grego não deixa dúvida que pedir, rogar,
suplicar, etc. é a tradução mais adequada e que qualquer termo que
denote autoridade não é apropriada.
Novo Testamento
Já vimos que no uso que os tradutores da Septuaginta fizeram de aiteo
não cabe o sentido de ordenar, determinar, mandar, exigir ou qualquer
outro que Hagin e seu aprendiz queiram dar. Mas sei que Hagin
principalmente despreza o Antigo Testamento, então vejamos se o Novo lhe
dá algum apoio às suas idéias. A palavra aiteo aparece diversas vezes
nos evangelhos e nos demais escritos do Novo Testamento. Jesus diz que o
Pai sabe o que seus filhos precisam “antes que o peçais” (Mt 6:8),
mesmo assim orienta “pedi, e dar-se-vos-á” (Mt 7:7), pois “qual pai se
porventura seu filho lhe pedir pão lhe dará uma pedra?” (Mt 7:9). Vemos
que a mulher de Zebedeu se aproximou dEle, o adorou e “pediu-lhe um
favor” (Mt 20:20). No verso seguinte ao utilizado como cavalo de batalha
por Soares Jesus diz “se me pedirdes alguma coisa coisa em meu nome eu
vos darei” (Jo 14:14). À porta Formosa, o coxo de nascença pedia esmola
(At 3:2) e Paulo escreveu aos Colossenses “não cessamos de orar por vós e
de pedir” (Cl 1:9). Aos faltos de sabedoria Tiago preceitua “peça-a a
Deus” (Tg 1:5) e João anima com o testemunho de que “aquilo que pedimos,
dEle recebemos” (1Jo 3:22).
Em todas essas passagens e outras não mencionadas, aiteo é utilizada
para mostrar alguém pedindo encarecidamente a alguém que tem autoridade
maior e que poderia conceder o pedido ou não, de acordo com sua vontade.
É um contra-senso pensar que um filho pode determinar o que seu pai
deve lhe dar, que a mãe de Tiago e João poderia adorar a Jesus e em
seguida lhe dar ordem ou fazer exigências ou que um aleijado de nascença
pudesse exigir direito a esmolas, que por isso deixaria de ser esmola. A
esta altura RR Soares diria “Exigir ou determinar a bênção não é dar
ordens ao Senhor” (p. 46). Porém, se aiteo significa determinar,
ordenar, exigir e se aiteo refere-se àquilo que queremos receber de
Deus, então forçosamente a ordem é dada a Deus. Jesus disse “se me
pedirdes” e Tiago escreveu “peça a Deus”. No mínimo RR Soares deverá
explicar porque aiteo em Jo 14:13 significa ordenar, exigir e no verso
seguinte significa pedir, suplicar, etc. O emaranhado que ele se meteu é
tal que a conseqüência lógica de seu raciocínio beira à blasfêmia, pois
ou faz do Diabo a fonte de bênção do crente ou a criatura mete-se a
mandar no Criador!
Jesus e nós
RR Soares afirma que não devemos pedir, pois Jesus não pedia nada ao
Pai, apenas determinava, ordenava, exigia. Escapou-lhe um detalhe que
faz toda diferença: não somos Jesus e embora ele tenha participado de
nossa humanidade nós não participamos de sua divindade. Ele é Senhor, e
nós servos. Jesus não era apenas um homem, era verdadeiro Deus. Mas há
outro detalhe que Soares não percebeu e seu mestre não lhe alertou.
Jesus nunca se referiu a si mesmo como pedindo ao Pai utilizando o termo
aiteo. Por quê? Porque aiteo se refere a um inferior pedindo a um
superior, e Jesus é igual ao Pai. Assim, quando refere-se a um pedido ao
Pai ou quando ora, Jesus utiliza o termo erotao, que é mais usado para
um pedido entre iguais. Na mesma passagem que nos manda pedir (aiteo)
Jesus disse “eu rogarei ao Pai” (Jo 14:16), utilizando erotao. Numa
outra passagem Jesus diz “naquele dia, pedireis (aiteo) em meu nome; e
não vos digo que rogarei (erotao) ao Pai por vós” (Jo 16:26). Mesmo
quando a tradução é pedir, o termo utilizado por Jesus é erotao, como em
Jo 17:15. Então, se aiteo é determinar, temos que Jesus nunca
determinava, enquanto que os discípulos deveriam fazer isso, o que só
faz sentido na mente de Hagin e Soares.
Determinar e ordenar
Apesar de aiteo não significar determinar, ordenar ou exigir, estas
são palavras que ocorrem na Bíblia. Mas não estão relacionadas ao
recebimento de bênçãos de Deus através da oração. Uma das palavras
utilizadas para traduzir determinar é keleuo, traduzida também por
comandar, ordenar. Assim, Jesus “ordenou que passassem para a outra
margem” (Mt 8:18) e Herodes “ordenou que lha desse [a cabeça de João
Batista]” (Mt 14:19). Quando José de Arimatéia pediu (aiteo) o corpo de
Jesus, Pilatos “mandou que lho fosse entregue” (Mt 14:19). Em nenhuma
ocasião keleuo é utilizado para que crentes tomassem posse da bênção.
Outra palavra grega utilizada como determinar é prostasso. Das sete
vezes em que ocorre, em nenhuma refere-se a crente usando de autoridade
para receber bênçãos (Mt 1:24; 8:4; 21:6; Mc 1:44; Lc 5:14; At
10:33,48). Outra palavra às vezes traduzida determinar é paraggello,
como usado em “Jesus ordenara ao espírito imundo que saísse do homem”
(Lc 8:29). Esta mesma autoridade usou Paulo para expulsar demônios (At
16:18), mas isto está longe de ordenar anjos que nos tragam a bênção.
Horizo também pode é traduzido como determinar, como por exemplo em Hb
4:7, porém em nenhuma de suas oito ocorrências refere-se a crentes
determinando a bênção. Como essas, há outras palavras que transmitem a
idéia de determinar, porém nãos e aplicam a crentes obtendo bênçãos de
Deus.
A palavra normalmente traduzida como ordenar, mandar é epitasso.
Jesus mandou que espíritos fossem para o abismo (Lc 8:31), Herodes
mandou que trouxessem a caça de João Batista (Mc 6:27), o sumo sacerdote
mandou que batessem na boca de Paulo (At 23:2) e o próprio Paulo
reconehceu que pdoeria ordenar o que quisesse a Filemon, mas nenhuma
dessas pessoas estavam determinando a bênção para suas vidas!
Conclusão
O autor de “Exija seus direitos” confessou não ser versado em grego.
Eu também não sou. Porém, mesmo para quem falta erudição é patente a
falta de sustentação bíblica para a idéia de que o crente não deve
pedir, e sim determinar, exigir sua bênção. RR Soares semeia um ensino
pernicioso à fé, e como veremos em outros artigos, essa não é apenas uma
filosofia cristã inocente, pois chega ao ponto de tornar Deus obsoleto.
Se eu pudesse determinar alguma coisa, determinaria que ele percebesse o
erro a que está induzindo muitas pessoas, se retratasse e deixasse a
Bíblia dizer o que diz.
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