8, maio, 2013
Armando Valladares (*)
Francisco, o primeiro
pontífice latino-americano, em seu recente discurso ao corpo diplomático
destacou a pobreza física e a pobreza espiritual como dois grandes
males do século XXI, e se compadeceu do “sofrimento” que suas vítimas
enfrentam.
Ao ler esse discurso papal sobre o flagelo da pobreza, não pude
deixar de lembrar dos meus irmãos cubanos, pobres entre os mais pobres
latino-americanos e caribenhos, vítimas de mais de 50 anos de comunismo.
Evoquei tantos lances lamentáveis da diplomacia vaticana para Cuba
comunista nas últimas décadas, que de uma maneira ou de outra
favoreceram a continuidade da ditadura cubana. E me perguntei com
legítima expectativa, enquanto católico cubano, qual será, durante este
novo pontificado, a orientação da diplomacia vaticana para a pobre Cuba,
a outrora “pérola das Antilhas”? Até o momento, não são muitos os
elementos de que se dispõem para levantar uma hipótese sobre o que
poderá ocorrer. Trata-se, sem dúvida, do teste cubano.
A expectativa e até a ansiedade dos cubanos sobre os rumos da
diplomacia vaticana para Cuba comunista se justifica, porque o drama da
ilha-cárcere já se prolonga durante demasiado tempo. Depois da viagem de
João Paulo II a Cuba, em 1997, o então arcebispo de Buenos Aires, Jorge
Mario Bergoglio, publicou o livro “Diálogos entre João Paulo II e Fidel Castro”
(Ed. Ciudad Argentina, Buenos Aires, 1998), [foto] uma edição que
parece estar esgotada, porém que na eventual re-edição poderá dar luz
sobre o pensamento de Francisco sobre o problema cubano.
Diversos comentaristas lembraram o papel do arcebispo de Buenos
Aires, cardeal Bergoglio, como presidente da comissão de redação do
documento da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe
(CELAM), cujos membros se reuniram no Santuário de Nossa Senhora
Aparecida, Brasil, em 13 de maio de 2007. Francisco teria presenteado
tal documento a mandatários recentemente recebidos em audiência pelo
novo pontífice, como foi o caso da presidente argentina.
Em maio de 2007, antes dessa reunião da CELAM, tive oportunidade de enviar“minha
angustiada interrogação, enquanto católico cubano e ex-preso político
nos cárceres comunistas durante 22 anos, a respeito de se esta reunião
da CELAM abordará o drama dos católicos cubanos ou se, mais uma vez,
optará pelo silêncio”. Também constatava que “o
sofrimento espiritual do rebanho católico cubano em relação à atitude
complacente dos pastores ante os lobos vermelhos é dilacerante”. E lembrava que durante a reunião do Encontro Nacional Eclesial Cubano
(ENEC), o então arcebispo de Santiago de Cuba, monsenhor Pedro Meurice,
reconheceu que no começo os fiéis católicos cubanos consideravam os
eclesiásticos desse país como membros de “uma Igreja de mártires”, mas que depois, por essa atitude colaboracionista com a ditadura castrista, “dizem que somos uma Igreja de traidores”. Um resumo dessa mensagem aos participantes da CELAM foi divulgado pela Agência Católica de Informações (ACI): (“Ex-preso político pede que drama cubano não passe desapercebido na 5ª Conferência”, ACI, 06 de maio de 2007).
uma mensagem pública aos membros desse organismo, difundido pela
imprensa e nas redes sociais, e entregue em mãos à boa parte dos altos
eclesiásticos participantes e a seus assessores, no próprio local do
evento, em Aparecida. Nessa mensagem, eu expressava
Lamentavelmente, nessa oportunidade, o silêncio da CELAM sobre o tema cubano foi total.
Dois meses depois, os diretores da CELAM partiram para Havana, para
participar da 31ª assembleia ordinária da entidade eclesiástica.
Apresentava-se outra oportunidade imperdível para que a CELAM rompesse
com o muro do silêncio, da indiferença e da vergonha que asfixia meus
irmãos cubanos, pobres entre os mais pobres, órfãos espirituais entre os
mais órfãos, que sofrem na ilha-cárcere do Caribe.
Antes de começar o encontro eclesiástico em Havana, autoridades da
CELAM haviam recebido comoventes cartas, assim como pedidos de ajuda por
parte de fiéis católicos, de mães e esposas de presos-políticos, sobre
as generalizadas violações de direitos humanos e religiosos aos
habitantes da ilha-cárcere. Depois do encontro eclesiástico houve,
inclusive, uma reunião de duas horas e meia entre representantes da
CELAM e representantes da ditadura cubana. Não obstante, monsenhor
Emilio Aranguren, bispo da diocese cubana de Holguín, se apressou a
esclarecer que nessa reunião simplesmente “nenhum desses temas foi posto na mesa”, porque se havia conversado unicamente “sobre os temas que eram verdadeiramente importantes para os bispos presentes”.
No inferno cubano, a asfixia e o extermínio espiritual e físico do
pobre rebanho, ao que parece não era um tema suficientemente importante.
O bom pastor está disposto a dar a vida por suas ovelhas (Cf. São João,
10,10). O que dizer daqueles pastores que deixam suas ovelhas a mercê
do lobo, parecendo ignorar o drama dos fiéis católicos cubanos, pobres
entre os mais pobres, física e espiritualmente?
Na “ostpolitik” eclesiástica para Cuba, até
o momento foram vários os autores. Entre eles, a secretaria de Estado
da Santa Sé, bispos católicos cubanos, cardeais e bispos católicos
norte-americanos, e cardeais e bispos católicos latino-americanos.
Dediquei ao tema dezenas de respeitosos e sinceros artigos, durante os
últimos anos.
_______________
(*) Armando Valladares, escritor, pintor e
poeta. Passou 22 anos nos cárceres políticos de Cuba. É autor do
best-seller “Contra toda esperança”, onde narra o horror das prisões
castristas. Foi embaixador dos Estados Unidos ante a Comissão de Direitos Humanos da ONU sob as administrações Reagan e Bush. Recebeu a Medalla Presidencial del Ciudadano e o Superior Award do Departamento de Estado. Escreveu inúmeros artigos sobre a colaboração eclesiástica com o comunismo cubano e sobre a “ostpolitik” vaticana para Cuba.
Dois artigos relacionados, escritos por Armando Valladares: Bento XVI, CELAM e “favela” cubana (30 de abril de 2007) CELAM em Cuba: “diálogo cordial” entre lobos e pastores (27 de julho de 2007)
Tradução: Graça Salgueiro
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