IHU - O
título deste livro pode fazer com que alguém razoavelmente espere uma
espécie de campanha panfletária contra os abusadores e uma lista de
sugestões para novas estruturas e programas para lidar com os abusos. Dom Geoffrey Robinson, no entanto, ousar fazer algo mais fundamentalmente revolucionário em For Christ’s Sake: End Sexual Abuse in the Catholic Church ... For Good [Pelo amor de Cristo: Parem o abuso sexual na Igreja Católica... para o bem].
A reportagem é de Tom Roberts, publicada no sítio National Catholic Reporter, 19-06-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ele se atreve a puxar o fio que desfaz o manto que escondeu a doença
institucional. Nós todos conhecemos os sintomas, dos quais os abusos
sexuais são a parte mais evidente e alarmante. Robinson desenrola o fio
lentamente e, na maior parte, ignora todos os detalhes horríveis e as
depravações incompreensíveis do escândalo dos abusos. Essa parte da
história já está bem documentada.
Em vez disso, como um bom diagnosticador que sabe que compreender uma
doença começa com a compreensão da história do paciente, ele realiza um
exame rigoroso da cultura a partir da qual a crise dos abusos cresceu.
"Há um antigo ditado que diz: 'A corrupção dos melhores é o pior'",
escreve ele na introdução. Dadas as dimensões do escândalo, diz, "já não
podemos mais limitar a nossa culpa aos indivíduos, mas também devemos
olhar para fatores dentro da própria cultura da Igreja que contribuíram
para isso. E, quando tantas autoridades da Igreja tentaram esconder os
abusos, ou trataram as vítimas de abusos como se fossem um inimigo da
Igreja, devemos olhar novamente para os fatores sistêmicos por trás de
tal comportamento, fatores que fazem parte da própria cultura da
Igreja".
Só essas frases já valem o livro, pois elas perpassam as
mistificações, as desculpas e as racionalizações infindáveis que se
tornaram os familiares pontos de discussão hierárquicos.
O que todos nós sabemos agora é que forças externas – inquéritos
estatais, promotores agressivos, vítimas e seus advogados – são capazes,
com graus de sucesso variados, de forçar os detalhes do escândalo a se
desvincularem da cultura. Tudo isso leva a copiosos pedidos de desculpas
(embora nunca se detalhe por quê), novos programas para proteger as
crianças, novos resoluções de que isso nunca deve acontecer novamente.
Esses passos são para o bem, mas eles fazem muito pouco para lidar
com o "porquê" da questão, e é no ponto do "porquê" que Robinson inicia
uma discussão de valor inestimável.
Buscar o "porquê" nos leva a entrar profundamente na história, na
fundação da instituição e na sua própria ideia de Deus. O que
encontramos no fundo, apesar de uma rica linguagem de amor que acompanha
esse caminho, é um deus "furioso" sempre presente, diz Robinson.
"A própria estrutura da Igreja, com um papa monárquico que insiste na
obediência e usa de meios coercitivos para assegurar a conformidade,
significa que o deus irado nunca está longe. (...) Isso criou uma Igreja
em que, apesar da conversa sobre o amor, a prática tem se baseado
demasiadamente no medo, em vez do amor, e as autoridades sempre tiveram o
apoio do deus irado para as suas palavras e ações".
Bispo auxiliar emérito de Sydney, Austrália, Robinson
fala a partir de dentro e, embora ele possa ser marginalizado por causa
da sua crítica, no entanto, ele entende o funcionamento da instituição,
assim como a necessidade de disciplina e de um ensino claro. Ele também
compreende as distorções que podem se acumular quando o medo se torna a
principal motivação para a forma como nos comportamos, assim como a
desorientação que pode surgir quando se remove o medo. O que mantém a
comunidade unida quando o medo não funciona mais?
Ele não é um defensor da graça barata, até mesmo quando ele
inspeciona metodicamente as atitudes da Igreja sobre a moral sexual e a
"importância exagerada" dada a tais ensinamentos. O padre "que ainda
acredita em um deus irado, cujo pensamento moral é confuso e imaturo, e
que vê toda a moral sexual em termos de pecados mortais diretamente
contra Deus", escreve ele, "está vivendo em uma cultura insalubre, uma
cultura a partir da qual muitas ações insalubres diferentes podem, e
irão, surgir".
O ministério pode se deformar, a ponto de chegar aos abusos, por
causa da elevada noção da ordenação que evoluiu ao longo dos séculos, a
diferença "ontológica" que serve para separar os padres do resto da
humanidade. O resultado disso é uma mística que leva a uma sensação de
privilégio e de proteção contra a prestação de contas.
O escândalo é um enorme esgotamento da credibilidade da Igreja
Católica e um dos principais obstáculos para o crescimento em outras
áreas da vida eclesial. Pelo fato de ser enormemente debilitante, ele é
um sintoma de doenças mais profundas. Para superar o escândalo, diz Robinson,
a Igreja "deve olhar para si mesma novamente a partir dos fundamentos, e
isso deve incluir o fato de olhar para as leis e as crenças" que alguns
podem considerar imutáveis.
- Geoffrey Robinson. For Christ’s Sake: End Sexual Abuse in the Catholic Church... For Good. Garratt Publishing.
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