IHU - Não é por acaso que a prisão do monsenhor Nunzio Scarano, o padre ex-banqueiro até um mês atrás a serviço daquele dicastério vaticano que gerencia o patrimônio econômico da Santa Sé, a APSA,
aconteceu apenas dois dias depois do lançamento do quirógrafo papal que
anuncia a instituição de uma comissão encarregada de examinar de cima a
baixo o que está errado no banco vaticano, a fim de fornecer a Francisco as bases para uma reforma.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 29-06-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A Procuradoria de Roma, de fato, parece ter atrasado
em alguns dias a prisão em sinal de cortesia para um papa que decidiu
levar adiante uma ação de transparência e de limpeza nunca ocorrida
antes. Uma linha que, dentro dos sagrados muros, chamam de "colaboração"
e de "conexão" entre o próprio Vaticano e Roma, cujo último fiador dentro do muros leoninos é o próprio papa.
Não por acaso, nas cartas da Procuradoria, destaca-se o fato de que o Vaticano não opôs nenhuma resistência à prisão de Scarano,
ocorrida, dentre outras coisas, depois que o monsenhor foi suspenso
temporariamente pelos seus superiores (dentro dos sagrados muros, eles
estavam bem informados).
Há quem se lembre de que uma colaboração semelhante entre as duas margens do Tibre só teve um precedente, ou seja, o chamado "Acordo de Genebra", graças ao qual, nos anos 1980, o então secretário de Estado vaticano, Agostino Casaroli, deu fim ao caso Calvi,
tratando diretamente com o Estado italiano. Hoje, todavia, a "conexão"
parece estar acontecendo em um canal bem diferente. É o papa que
garante, coadjuvado pelos homens de sua confiança inseridos na comissão
do IOR anunciada há poucos dias, a vontade de fazer
limpeza, de uma vez por todas, passando por cima da cúpula do próprio
IOR, entrelaçados com a velha governança da Cúria Romana.
Francisco parece não só não ter engolido totalmente a nomeação como presidente do banco de Ernst von Freyberg, ocorrida por vontade do secretário de Estado vaticano, Tarcisio Bertone, quando Bento XVI
já havia anunciado a renúncia ao pontificado. Ele também parece não ter
digerido aquela campanha midiática, posta em campo através do apoio da
sociedade internacional Spencer Stuart, que levou a
cúpula da própria instituição bancária a dizer nos últimos dias que é
"necessário" para a Igreja ter um banco. Palavras em contradição com uma
recente homilia do papa que disse: "O IOR é indispensável, mas até um certo ponto".
Não são dias fáceis do outro lado do Tibre. Na terça-feira passada, Francisco saiu da residência de Santa Marta para ir jantar na casa do cardeal Jean-Louis Pierre Tauran, diplomata de prestígio, um dos membros da comissão sobre IOR.
Um debate sobre a decisão de instituir a própria comissão, depois que,
evidentemente, as duas surpreendentes medidas anteriores tomadas para
marcar uma distância da atual liderança do IOR foram consideradas não
totalmente suficientes: não só a nomeação de um prelado de sua confiança
dentro do banco, mas sobretudo a decisão de abolir
os chamados "Gentis-Homens de Sua Santidade", ou seja, personalidades
da economia, das finanças e da administração pública que, por anos,
puderam abrir contas no banco do outro lado do Tibre ainda hoje
offshore.
Nesse sábado, festa dos santos Pedro e Paulo,
o papa almoçou com os bispos aos quais, no mesmo dia, impôs o pálio, e é
possível que ele possa ter lhes explicado algumas das recentes decisões
tomadas. Ao mesmo tempo, poderá haver novas disposições, não por último
a de dar forma jurídica àquele Conselho da Coroa encarregado de dar
substância à reforma da Cúria, incluindo as finanças.
Insistir-se-á no fato de que o conselho responde a uma ideia de colegialidade bem enucleada pelo Concílio Vaticano II,
mas ao mesmo tempo permanecerá firme o conceito de que não há
colegialidade sem o primado de Pedro. Os oito cardeais aconselharão,
certamente, mas no fim será Bergoglio quem vai decidir.
A cúpula do IOR – de von Freyberg ao diretor-geral Paolo Cipriani – vivem nestas horas o mesmo estado de espírito da maioria dos chefes de dicastério da Cúria. Reconfirmados "ad interim",
o destino deles também parece marcado pela vontade papal de reformar o
IOR zerando todos encargos. O caminho parece ser o de sacudir a
instituição bancária nos seus estatutos, constituindo uma fundação
externa, composta por sócios diversos, que responda ultimamente ao papa,
mas cuja responsabilidade não seja do próprio papa.
Na cúpula do IOR, ainda paira, dentre outras coisas, a investigação da Procuradoria de Roma que levou, em setembro de 2010, a uma apreensão de 23 milhões de euros (depois restituídos ao IOR) e à inscrição no rol dos investigados da cúpula de então, o presidente Ettore Gotti Tedeschi (agora demitido) e Cipriani, ainda no cargo. Ambos foram acusados de violação da normativa antilavagem de dinheiro.
Tanto que, agora, a pergunta que muitos se fazem é uma só: o que
acontecerá se a Procuradoria não arquivar, mas sim enviar a julgamento? É
difícil que o papa peça antecipadamente que a atual cúpula se demita,
mas a ideia de um congelamento dos cargos até que toda acusação seja
esclarecida continua sendo viável.
A nomeação da comissão interina parece um primeiro passo nesse
sentido, mas é possível que, até o fim de julho, o papa não peça novos
passos a uma dirigência que, com a grande reforma dos próximos meses,
poderia ser totalmente desautorizada.
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