Padre Beto, que foi excomungado em abril por ser favorável à união de homossexuais, toma cerveja em barzinho
"Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para
julgá-la?" A frase, dita pelo papa Francisco a 70 jornalistas que
embarcaram com ele a Roma nesta segunda-feira (29), poderia ter mudado o
destino do padre Beto, excomungado da Igreja Católica por se mostrar
favorável à união entre homossexuais.
Roberto Francisco Daniel, 47, padre da Diocese de Bauru (329 km de São Paulo) desde 2001, foi excomungado em 29 de abril, após um vídeo no qual se mostrava favorável à união homoafetiva ter ganhado grande repercussão na internet.
"Acredito que, se houvesse tido essa polêmica comigo depois da vinda do
papa, a igreja em Bauru tomaria talvez uma outra posição ou pensaria
muito bem em tomar uma atitude drástica como essa que ela tomou. Eu
acredito que foi injusta a minha excomunhão. Como não cabe recurso,
então ela não vai chegar às mãos do papa Francisco", disse.
Na época, o ex-sacerdote desabafou ao dizer que, diferentemente dele, padres pedófilos não eram excomungados.
Ex-padre vai entrar na Justiça
Segundo o ex-sacerdote, a declaração de Francisco mostra que a Igreja
Católica passa por um momento de retomada de valores, que prega mais o
diálogo do que a exclusão.
"Aqui vemos dois modelos de igreja bem diferentes: um papa pedindo que
as pessoas devam ser acolhidas, que devemos viver uma teologia do
encontro, que significa o diálogo, nunca a exclusão, e, em
contrapartida, temos um bispo de Bauru que representa uma ala da
hierarquia dogmática e que, se você não reza da cartilha, você não tem
espaço", afirmou.
Para padre Beto, como é conhecido em Bauru, a declaração de Francisco "foi um grande passo", embora evasiva.
"Para um papa, já é um grande passo. Eu gostaria que ele fosse mais
claro, mas não sei se ele pode ser mais claro. Afinal de contas, ele
está dentro de uma estrutura muito retrógrada e não sei se ele pode ter
um posicionamento muito liberal. Mas isso já é muito forte."
A declaração do papa motivou o ex-padre a recorrer contra a excomunhão na Justiça.
"As declarações do papa me motivaram mais ainda. Mas o que realmente me
motivou foi saber que para essa excomunhão não cabe recurso, e, então, a
única alternativa de fato é a Justiça comum. Com isso, quero ensinar às
pessoas que nenhuma instituição, seja qual for, tem o direito de expor
uma pessoa como a Diocese de Bauru me expôs. Eles me trataram como um
adolescente, como alguém que pertence a um colégio interno", afirmou.
Beto contratou um grupo de advogados e deve entrar com uma ação
cautelar de pedido de suspensão da excomunhão já nesta terça-feira (30).
Depois disso, deve entrar com um processo contra a própria Diocese de
Bauru.
"Não se pode exigir demais do papa"
Diferentemente do papa Francisco, que afirmou hoje que "as portas estão
fechadas" para a ordenação de mulheres na Igreja Católica, padre Beto
se mostra favorável a essa mudança. Segundo o ex-padre, o argumento
usado pelo papa e pela igreja é histórico e só fazia sentido na época de
Cristo.
"É claro que Jesus Cristo teve que colocar homens no comando da
pregação da palavra publicamente porque naquela época as mulheres não
eram ouvidas. Se uma mulher fizesse isso, era apedrejada. Jesus nunca
iria expor uma mulher a essa situação", afirmou.
Para Beto, se Cristo vivesse nos dias de hoje e "se fizesse
carne, talvez fosse uma mulher, um homem homossexual ou uma mulher
homossexual", disse.
Apesar de mais uma vez discordar de um dogma católico, Beto afirma que "não se pode exigir demais do papa".
"Ele pede que rezem por ele, porque sabe que vai enfrentar problemas
muito sérios, como o Banco do Vaticano, a burocracia, as questões de
pedofilia e das reformas morais da igreja, que são muito fortes."
"Padre tem de ter cheiro de gente, não de vela"
No entanto, Beto vê com entusiasmo a atitude mais simples de Francisco. Para ele, assim como prega o novo papa, o sacerdote tem de se manter mais próximo das pessoas e viver com mais simplicidade.
O ex-padre critica papas como Bento 16, que diz pertencer a uma geração
de "padres executivos", que mantinham uma "linguagem e tom de voz
clerical".
"Nós padres temos de estar próximos da vida das pessoas, porque nós
somos gente, como todo mundo é gente. Temos de ter cheiro de gente, não
de sacristia, de vela, de incenso. Nosso cheiro deve ser de trabalhador,
de jovem, de quem vai ao supermercado, de quem vai ao barzinho e toma
um chope com o pessoal", afirmou.
(Com informações do UOL)
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