Papa Francisco embarca para a Roma na Base Aérea do aeroporto Galeão, no Rio, após participar da Jornada Mundial da Juventude
Em conversa com jornalistas a bordo do avião que o levou de volta do
Brasil para Roma na noite de domingo (28), o papa Francisco afirmou que
os gays não devem ser julgados ou marginalizados, e que devem ser
integrados à sociedade. Ele ainda se manifestou a favor de um maior
papel das mulheres dentro da Igreja, mas rejeitou sua ordenação como
sacerdotisas.
"Não se pode imaginar uma Igreja sem mulheres ativas", disse o papa,
depois de lembrar que a entidade já se pronunciou contra esta opção.
"Esta porta está fechada." Foi a primeira vez que Francisco falou
publicamente sobre o tema. "Não podemos limitar o papel das mulheres na
Igreja ao de coroinha ou de presidente de uma entidade beneficente, deve
haver mais", disse, respondendo a uma pergunta durante uma conversa
notavelmente franca com os jornalistas.
A Igreja Católica prega que não pode ordenar mulheres porque Jesus
escolheu apenas homens como apóstolos. Defensores do sacerdócio feminino
dizem que Jesus agiu de acordo com os costumes de seu tempo. Muitos
dentro da Igreja, mesmo aqueles que se opõem à ordenação de mulheres,
dizem que elas devem ter papéis de liderança tanto na Igreja como na
administração do Vaticano.
Ciática
O papa Francisco contou que sofreu com uma ciática em seu primeiro mês
de pontificado, devido à má postura, e disse que está bem no Vaticano,
mas que em alguns momentos se sente "enjaulado". Ele foi questionado
sobre qual foi o melhor e o pior momento em seus quatro meses de
pontificado. O papa respondeu que viveu muitos momentos bons, e que os
piores foram quando viajou à ilha italiana de Lampedusa para se reunir
com imigrantes ilegais."É de chorar, quando chegam essas barcas e os deixam a algumas milhas
do litoral, e depois eles devem sozinhos chegar com a balsa. Senti dor
ao ver essas pessoas que são vítimas do sistema socioeconômico mundial",
afirmou. E acrescentou: "A pior coisa, no âmbito pessoal, foi uma
ciática que tive no primeiro mês do pontificado".
Francisco disse que, nos últimos meses, encontrou muitas pessoas boas
no Vaticano e que isso lhe traz alegria. "Quantas vezes tive vontade de
sair pelas ruas de Roma, eu gosto de estar na rua e nesse contexto me
sinto um pouco enjaulado. Em Buenos Aires todos me conheciam como o
padre andarilho", afirmou.
Perguntado sobre por que prefere ser chamado de bispo de Roma ao invés
de papa, Francisco respondeu que é o bispo de Roma e, como tal, sucessor
de Pedro e vigário de Cristo. Também disse que o trabalho de bispo é
lindo e que se sente muito feliz como papa.
Lobby gay
Francisco defendeu os gays contra a discriminação, mas também fez
referência ao catecismo universal da Igreja Católica, que diz que a
orientação homossexual não é pecado, mas os atos homossexuais, sim.
O papa condenou o chamado "lobby gay" do Vaticano. "Nenhum lobby é
bom", afirmou o papa argentino. "O problema não é ter essa orientação.
Precisamos ser irmãos. O problema é o lobby por essa orientação, ou
lobbies de pessoas ambiciosas, lobbies políticos, lobbies maçônicos,
tantos lobbies. Esse é o pior problema", afirmou.
"Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?",
disse Francisco, em italiano. "O catecismo da Igreja Católica explica
isso muito bem. Diz que eles não devem ser marginalizados por causa
disso (orientação sexual), e sim que devem ser integrados à sociedade."
Banco do Vaticano
Francisco afirmou que não notou "resistência" dentro do Vaticano com
relação à reforma da Cúria e que não sabe como acabará a reforma do IOR
(Instituto para Obras da Religião), o chamado banco vaticano, mas que o
importante "é a transparência e a honradez".
O Vaticano está realizando reformas em seu banco, cuja reputação foi
maculada por três décadas de escândalos. O papa disse que vai ouvir o
conselho de uma comissão formada para determinar se a instituição pode
ser reformada ou deve ser fechada.
O Vaticano anunciou nesta segunda-feira (29) que assinou um acordo
sobre a troca de informações financeiras e bancárias com a Itália para
combater a lavagem de dinheiro.
Conversando com os jornalistas presentes no avião, Francisco falou
sobre o escândalo que envolveu dom Nunzio Scarano, preso sob acusação de
transportar cerca de 20 milhões de euros (cerca de R$ 60 milhões) da
Suíça para a Itália em um avião particular para depositá-los em contas
do IOR. "Temos esse monsenhor que foi para a prisão. Vocês acham que foi
na prisão porque parecia a beata Imelda [expressão espanhola para dizer
que uma pessoa não é santa]? É um escândalo, uma coisa que faz mal",
afirmou o Papa.
Vatileaks
Em relação a outro escândalo, o da divulgação de informações sigilosas
do Vaticano, conhecido como Vatileaks, Francisco disse que "é um grande
problema". "Quando eu fui falar com papa Bento 16, ele me apresentou uma
caixa com todas as declarações das testemunhas, mas, me disse, 'o
resumo e o juízo final estão nesse envelope', e tinha tudo gravado na
cabeça. Ele lembrava de tudo", afirmou o pontífice.
O papa também esclareceu que não encontrou "resistências" na Cúria
Romana em seu desejo de mudança e de reformas. "Ainda não as vejo. Pode
ser que existam, mas em quatro meses não podem se encontrar muitas. Eu
achei ajuda, gente leal, mas não gosto que sejam sempre de acordo
comigo", afirmou Francisco. "Um verdadeiro colaborador é aquele que sabe
te dizer se não está de acordo.""Em geral, eu vejo que muitas vezes na Igreja estão sendo caçados
pecados de um padre. Mas se ele pecou, o Senhor perdoa, o Senhor
esquece, e isso é importante. O senhor esquece, se nos não esquecemos
corremos o risco que o Senhor se esqueça de nós", afirmou Francisco.
"São Pedro fez um dos piores pecados, renegar Cristo, e com isso o
fizeram papa."
Mala preta
Aqui dentro "não tem a chave da bomba atômica", brincou o papa,
respondendo a uma pergunta de um jornalista sobre o conteúdo da mala
preta que ele estava carregando na entrada no avião em Roma. "Eu a levei
comigo porque eu faço isso sempre. Faço isso quando estou viajando, tem
o barbeador, o breviário, uma agenda, um livro para ler, esse era sobre
santa Teresina", explicou Francisco, ressaltando que sempre levou a
mala dessa forma durante as viagens. "É normal, precisamos ser normais, é
um pouco estranho o que você me pergunta. É normal, precisamos nos
acostumar a normalidade da vida. Nesse avião não tem equipamentos
especiais", disse. "Há um assento agradável, mas comum. Eu fiz um
telefonema para dizer que eu não queria nenhum equipamento especial."
(Com agências)
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