30 agosto 2013
A palavra amor encontra-se tão deturpada que, em muitos casos, já não é possível descobrir seu significado
A estratégia do movimento revolucionário em curso segue muito mais
pela via da semântica, que das armas. Cooptar a linguagem e modificá-la
de tal maneira que já não seja possível saber do que se fala, tem sido o
carro-chefe da revolução há pelo menos meio século. E mesmo dentro da Igreja é possível perceber essa discrepância entre a letra e a hermenêutica. Reino de Deus, por exemplo, pode representar desde o paraíso celeste ao mundo melhor desejado pelos socialistas.
A palavra amor também não foge à regra. Usá-la para justificar todo tipo de barbaridade, quer na esfera pública, quer na eclesiástica, tornou-se algo corriqueiro. Com
efeito, aquilo que para os católicos deveria estar no centro de sua fé,
ou seja, a crença no amor de Deus e as exigências que dele decorrem, se
converte em pura superficialidade e experiências sentimentalistas. Daí a
reação ignara de certos meios à qualquer tipo de repreensão ou
correção. Afinal de contas, diriam, o que importa é o amor.
Todavia, uma tal forma de pensamento não é somente absurda, mas
nociva. E os seus frutos provam isso a cada vez que uma criança se
rebela contra a autoridade de seus pais. Ora, “uma característica de
quem ama de verdade é não querer que o Amado seja ofendido”01,
logo, acusar de farisaismo quem, preocupado com a verdade de Cristo, se
propõe a defendê-la abertamente é uma atitude, no mínimo, desonesta.
Não se trata aqui de endossar contendas e comportamentos afetados de
quem está mais interessado em destruir, que converter, mas de
entregar-se sobremaneira à missão de Cristo de ir pelo mundo e fazer
discípulos entre todas as nações.
Assim, instrui São Paulo, “prega a palavra, insiste oportuna e
inoportunamente, repreende, ameaça, exorta com toda paciência e empenho
de instruir.” (Cf. II Tim 4, 2) “Se, porém” – questiona São João
Crisóstomo – “eles pelas obras profanam a fé e não se escondem, cobertos
de vergonha, debaixo da terra, por que se irritam contra nós, que
condenamos com palavras o que eles manifestam com ações?” Não existe
verdadeiro amor pelo bem sem um ódio mortal por aquilo que é mal. O amor
só é verdadeiro se estiver intimamente associado à verdade e à justiça,
e por isso ele é, não raras vezes, motivo de verdadeiro escândalo. E
por isso quando o amor se fez carne o homem o matou numa cruz. O preço
do amor de São João Batista foi sua cabeça servida em uma bandeja.
A palavra amor é banalizada, sobretudo, quando, em nome dela, se opta
por uma vida de pecado desregrado e de mentira. Isso não é amor, é
falta de caráter. O coração do que ama verdadeiramente é impelido a
dizer palavras como as de Santo Antônio de Sant’Anna Galvão: “tirai-me
antes a vida que ofender o vosso bendito Filho, meu Senhor.” Toda ação
missionária da Igreja é norteada por essas mesmas palavras do santo
brasileiro. Uma missionariedade que, apesar das oposições, preocupa-se,
sim, com a conversão dos pecadores, uma vez que foi o próprio Cristo a
exortá-los a serem santos como o Pai é santo.
Dom Eugênio Sales costumava dizer que o problema da Igreja é de
alfaiataria: “tem saia de mais e calça de menos”. O falecido cardeal se
referia à pusilanimidade, à síndrome de Poliana que acredita que tudo é
belo, tudo é bom, tudo é lindo e sem pecado. Uma presunção que arrasta a
Igreja à covardia e à frouxidão, por isso, diametralmente oposta à
virtude do amor. O verdadeiro cristão, contudo, não se alicerça
na covardia, mas na fortaleza, na virilidade, na radicalidade do amor,
com a qual o Papa Pio XI afirmava: “Quando se tratar de salvar alguma
alma, sentiremos a coragem de tratar com o diabo em pessoa”.
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