"Se conhecêssemos o valor da Missa,
morreríamos. Para celebrá-la dignamente, o sacerdote deveria ser santo.
Quando estivermos no Céu, então veremos o que é a Missa, e como tantas
vezes a celebramos sem a devida reverência, adoração, recolhimento".[1]
No decreto Presbyterorum ordinis, o
Concílio Vaticano II, em perfeita harmonia com a doutrina tomista,
resume de forma admirável a centralidade da Eucaristia na vida
espiritual do sacerdote, como seu principal meio de santificação. Logo
no início, afirma que a Ordem dos presbíteros foi constituída por Deus
"para oferecer o Sacrifício, perdoar os pecados e exercer oficialmente o
ofício sacerdotal em nome de Cristo a favor dos homens".[2]
Recorda, em seguida, que é por meio do
ministério ordenado que o sacrifício espiritual dos fiéis se consuma em
união com o sacrifício de Cristo, oferecido na Eucaristia de modo
incruento e sacramental. E afirma que "para isto tende e nisto se
consuma o ministério dos presbíteros. Com efeito, o seu ministério, que
começa pela pregação evangélica, tira do sacrifício de Cristo a sua
força e a sua virtude".[3] O que equivale a dizer que o sacerdote vive
para a Celebração Eucarística e é dela que deve haurir a força para
progredir na prática da virtude.
Prosseguindo, ressalta o decreto
conciliar: "Os restantes sacramentos, porém, assim como todos os
ministérios eclesiásticos e obras de apostolado, estão vinculados com a
sagrada Eucaristia e a ela se ordenam.[4] Com efeito, na santíssima
Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja,[5] isto é, o
próprio Cristo".[6] E mesmo quem é chamado a uma vocação missionária,
não pode esquecer que a própria evangelização deve ter como meta o
Sacramento do altar e dele nutrir-se: "A Eucaristia aparece como fonte e
coroa de toda a evangelização".[7] Pois no Sacrifício Eucarístico se
exerce a própria obra da Redenção.[8]
Garrigou-Lagrange sintetiza com precisão esta doutrina:
"O sacerdote deve considerar-se ordenado
principalmente para oferecer o Sacrifício da Missa. Em sua vida, este
Sacrifício é mais importante que o estudo e as obras exteriores de
apostolado. Com efeito, o seu estudo deve ordenar-se ao conhecimento
cada vez mais profundo do mistério de Cristo, supremo Sacerdote, e o seu
apostolado deve derivar da união com Cristo, Sacerdote principal".[9]
Royo Marín, ao comentar a exortação do
Pontifical Romano, feita pelo Bispo aos ordenandos, afirma com ênfase
que a Santa Missa é "a função mais alta e augusta do sacerdote de
Cristo".[10] E, conhecedor das múltiplas ocupações pastorais de um
sacerdote, que podem facilmente desviá-lo do cerne da sua vocação de
mediador entre Deus e os homens, reforça a mesma ideia, logo em seguida,
com inflamadas palavras de zelo sacerdotal:
"Esta é a função sacerdotal por
excelência, a primeira e mais sublime de todas, a mais essencial e
indispensável para toda a Igreja, e ao mesmo tempo fonte e manancial
mais puro de sua própria santidade sacerdotal. É-se sacerdote, antes de
tudo e sobretudo, para glorificar a Deus mediante o oferecimento do
Santo Sacrifício da Missa".[11]
Talvez receoso de que suas palavras não
penetrem suficientemente o espírito de seus leitores, irmãos no
sacerdócio, Royo Marín enumera algumas ocupações legítimas que poderiam
servir de pretexto a uma diminuição do zelo eucarístico, insistindo de
novo na centralidade do Sacrifício da Missa:
"Por cima de todas as demais atividades
sacerdotais, por cima inclusive de seu trabalho pastoral voltado para as
almas, deverá colocar sempre em primeiro plano a digna e fervorosa
celebração do Santo Sacrifício do Altar. Tudo quanto o distraia e
estorve nesta função augusta deverá ser afastado pelo sacerdote com
energia, lançando-o para longe de si. Sua função primária, ante a qual
devem ceder todas as demais atividades, consiste - repetimos - na
celebração do Santo Sacrifício da Missa, através do qual recebe Deus uma
glorificação infinita".[12]
Cabe salientar ainda que a Eucaristia
não só confere a graça, como também a aumenta naquele que a recebe com
as devidas disposições:
"O Sacramento da Eucaristia tem por si
mesmo o poder de conferir a graça. [...] A graça cresce e a vida
espiritual aumenta, toda vez que se recebe realmente este Sacramento
[...] para que o homem seja perfeito em si mesmo pela união com
Deus".[13]
Bento XVI, ao tratar da vocação e
espiritualidade sacerdotais, sob uma perspectiva pastoral, afirma que é
por meio da oração que o sacerdote apascenta suas ovelhas. Os
presbíteros, diz ele, têm "uma vocação particular para a oração, em
sentido fortemente cristocêntrico: isto é, somos chamados a ‘permanecer'
em Cristo". E, continua:
"O nosso ministério é totalmente ligado a
este "permanecer" que equivale a rezar, e deriva dele a sua eficiência.
[...] A Celebração Eucarística é o maior e mais nobre ato de oração, e
constitui o centro e a fonte da qual também as outras formas recebem a
"linfa": a Liturgia das Horas, a adoração eucarística, a lectio divina, o
santo Rosário, a meditação".[14]
Novamente, encontramos a Eucaristia no centro da vida sacerdotal.
Por Monsenhor Mons. João S. Clá Dias, EP
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CLÁ DIAS, João. A Santidade do sacerdote
à luz de São Tomás de Aquino. in: LUMEN VERITATIS. São Paulo:
Associação Colégio Arautos do Evangelho. n. 8, jul-set 2009. p. 16-18.
[1]BENTO XVI. Carta para Proclamação do Ano Sacerdotal, 16 jun. 2009.
[2] PO, n. 2.
[3] Idem.
[4]Nota do texto original: "A
Eucaristia é como que a consumação da vida espiritual, e o fim de todos
os sacramentos" (S Th III, q. 73. a. 3 c); cf. S Th III, q. 65, a. 3.
[5] Nota do texto original: Cf. São Tomás, S Th III, q. 65, a. 3, ad 1; q. 79, a. 1 c. e ad 1.
[6] PO, n. 5
[7] Idem.
[8] Cf. idem, n. 13.
[9] GARRIGOU-LAGRANGE, OP, Réginald. Op. cit., p. 38.
[10] ROYO MARÍN, OP, Antonio. Teología de la Perfección Cristiana. Madrid: BAC, 2001. p. 848.
[11] Idem, ibidem.
[12] Idem, p. 849.
[13]S Th III, q. 79, a. 1, ad 1.
[14] BENTO XVI. Homilia no Dia Mundial de Oração pelas Vocações, 3/5/2009.
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