terça-feira, 19 de novembro de 2013

O padre que acende uma luz no inferno sírio

IHU - Um tweet em francês – “Papa Francisco: os sírios necessitam do seu apoio para obter a liberdade. Assinem aqui a petição” –  e um mais um conjunto de mensagens para denunciar a propaganda pró-regime sírio de certos ambientes cristãos, depois nada mais.
O comentário é de Enzo Bianchi, monge, prior do Mosteiro de Bose, na Itália, e publicado pelo jornal La Stampa, 16-11-2013.

Depois do dia 25 de julho não se tem mais notícias do padre Paolo Dall”Oglio, jesuíta italiano, há mais de 30 anos trabalhando na Síria, fundador de uma comunidade no mosteiro, reconstruído, de Mar Musa, expulso da Síria, em 2012, pelo governo de Bashar AL-Asad por ter apoiado à oposição.
Raptado depois de entrar clandestinamente na Síria para tentar uma mediação e obter a libertação de outros religiosos sequestrados? Mas quem o sequestrou? Onde ele está? Um silêncio angustiante envolve a sua vida – neste domingo é o seu 59º aniversário... – assim como informações confusas sobre o drama sírio, assim como notícias contraditórias são divulgadas sobre a sorte dos dois bispos cristãos e de outros seqüestrados, para depois voltar tudo à mais tétrica escuridão sobre o que acontece com um povo inteiro martirizado.
Neste contexto vale a pena ler o livro “Cólera e luz. Um padre na revolução síria” que acaba de ser publicado na versão italiana (o original é em francês), com um pósfácio do próprio Dall’Oglio. O livro acabou de ser editado no mês de agosto de 2013, ou seja, quando o seu autor acabara de ser raptado.
Trata-se de um livro que, como o precedente “Innamorato dell’Islã, credente in Gesù” (“Enamorado pelo Islã, crente em Jesus”, em tradução livre), nos fala de um povo, da paixão pelo diálogo, da sede de liberdade, da raiva de indignação, mas também, e precisamente por isso, da luta pela justiça, da espera da luz, da esperança que não morre.
Padre Paolo não busca o consenso universal, não persegue compromissos, não se deixa moderar pela prudência deste mundo: fala e escreve para sacudir as consciências, para que o mundo saiba o que está acontecendo, para que compreenda um pouco, pelo menos, do drama de uma luta pela liberdade que é sufocada no sangue e na indiferença.
A carta ao jovem europeu, que abre o volume, fornece uma chave para compreender o anelo que habita o coração do autor, e presta uma homenagem a tantos jovens sírios – cristãos e muçulmanos – conhecidos e amados pelo padre Dall’Oglio, que venceram o medo que os paralisava e se jogaram numa trágica aventura cuja única meta é a liberdade.
Um livro que fala, sim, da vida e da paixão de um homem, mas também que a partir dos eventos pessoais chega, com lucidez, a falar da esperança de um povo, do sonho de uma humanidade reconciliada, da união impossível entre paz e justiça.
Graças a estas páginas compreendemos algo a mais do complexo drama sírio, mas sobretudo veremos por detrás das notícias os rostos aterrorizados e as palavras de homens e mulheres que não renunciaram à própria humanidade e que buscam, desesperadamente, caminhos de humanização e dias de luz. E saímos do livro com uma pergunta inquietante: nós, tão destemidos – diferentes do autor – em não nos enraivecer, somos também capazes de acender alguma fagulha de luz?

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