resistência
Diálogo Ecumênico entre Martinho Lutero,
Doutor do Pecado Triunfante, e Satanás,
Príncipe das Trevas e Pai da Mentira
Texto editado originalmente pela Revista Sel de La Terre Avrillé/França
Ia. Edição - Novembro 2005 - 3000 exemplares
Editor: Francisco Almeida Araújo
Obs: O título para este livro foi dado pelo editor.
(Parte I)
N.d.t.: traduzimos para o português a tradução francesa deste documento, tal como foi publicado na revista “Sei de la Terre”, n°4.
N.d.r.: publicamos aqui a tradução francesa da conferência entre Lutero e o diabo, tal como foi publicada, em 1875, por Isidore Lisieux (Paris).
Trata-se de uma reedição da obra publicada, no final do século XVII,
pelo padre de Cordemoy (Paris, 1681, 1684, 1701, in - 12) e reimpressa por Lenglet-Dufresnoy, em 1715, no seu “Recueil de Dissertations sur les Apparitions, les Visions et les Songes”[1] (Paris, 4 vol. in - 12). Esta última edição foi acompanhada de notas de Lenglet-Dufresnoy e
comentários do padre de Cordemoy que confirmaram a veracidade deste
relato e responderam à argumentação que os luteranos tentaram opor a fim
de refutar o texto. Pareceu-nos que nesta época de ecumenismo e “Missa
Nova”, extensamente inspirada nas idéias de Lutero,esta peça deva ser juntada ao respectivo dossiê.
A Conferência entre Lutero e o Diabo
Narrada pelo próprio Lutero, no seu livro “Da missa privada[2] e da piedade dos padres[3].
Aconteceu-me certa vez, acordar-me em sobressalto no meio da noite: Satanás ali estava e, sem perder tempo, abriu uma discussão.
“Escute-me Lutero, doutor sapientíssimo, disse-me ele.
Tu sabes que, durante quinze anos, celebraste missas privadas; que
dirias, se soubesses que essas missas privadas eram uma horrível
idolatria? Que dirias, se o corpo e o sangue de Cristo não estivessem
ali presentes, e, que, não tivesses adorado, e feito adorar, nada mais
do que pão e vinho?”
Eu lhe respondi[4]: “Fui
ordenado padre, recebi a unção e a consagração das mãos do bispo, e fiz
tudo isso em obediência às ordens dos meus superiores. Por que não
teria consagrado, posto que pronunciei seriamente as palavras de Cristo,
e, tenho celebrado essas missas com grande seriedade? Tu bem o sabes”.
“Tudo isso é verdade, disse-me, porém
os turcos, e os pagãos, também fazem essas coisas nos seus templos, por
obediência; eles realizam com muita seriedade suas cerimônias. Os
padres de Jereboão também fizeram todas as coisas com um grande zelo e
conscienciosamente, ao contrário dos verdadeiros padres de Jerusalém.
Que dirias, se tua ordenação e consagração fossem tão falsas quanto as
dos padres turcos e samaritanos, por ser seu culto falso e ímpio?”
“Primeiramente, deves saber – prossegue - que não
tinhas, então, nem conhecimento de Cristo, nem fé verdadeira, e, naquilo
que se refere à fé, não valias mais que um turco. Porque o turco[5], e até mesmo todos os diabos, crêem em aquilo que se conta sobre Cristo: que ele nasceu, foi crucificado, morreu, etc. Mas,
nem o turco, nem nós outros espíritos reprovados, temos confiança na
sua misericórdia, não o reconhecemos como nosso Mediador ou Salvador; ao
contrário, temos horror dele, como de um juiz cruel”.
“Assim era sua fé, tu não tinhas outra[6] quando
recebeste a unção do bispo; e, todos aqueles que dão a unção, como
aqueles que a recebem, pensam assim, e não de outro modo, sobre Jesus
Cristo”.
“É porque, vos afastando de Cristo, como de um juiz cruel, tendes recorrido à Virgem Maria e aos Santos[7]; estes eram vossos mediadores entre Cristo e vós. Eis como arrancaram a glória de Jesus Cristo[8]. É isto que nem tu[9], nem qualquer outro papista poderá negar. Então, vós fostesungidos, consagrados e tonsurados, e sacrificastes na missa como pagãos, e não como cristãos. Como. portanto, pudestes consagrar
numa tal missa, ou celebrar verdadeiramente a missa? Não havia ali
nenhuma pessoa com poder consecratório, e isto não é, segundo vossa
própria doutrina, um vício essencial?”
“Em segundo lugar, foste ordenado padre, e abusaste da
missa contra sua instituição, contra o pensamento e o desejo do Cristo
que a instituiu. Porque Cristo quis que o sacramento fosse distribuído
entre os fiéis que comungam, e, que ele fosse dado à Igreja para ser
comido e bebido. O verdadeiro padre, de fato, é constituído ministro da
Igreja para pregar o verbo e conferir sacramentos, como disseram Cristo
na ceia, e, São Paulo, na sua primeira Epístola aos coríntios (cap.
II), onde trata da ceia do senhor. Vem daí que os antigos a chamaram
comunhão, porque, de acordo com a instituição de Cristo, não é somente o
padre que deve usar o sacramento, mas todos os outros cristãos seus
irmãos, com ele. E tu, durante quinze longos anos, sempre, ao dizer a
missa,guardaste o sacramento para ti somente, não o comunicaste aos outros. Ainda mais, era-te proibido[10] dá-lo completo. Que sacerdócio havia então? Que missa e qual consagração? Que tipo de padre és, que não foste ordenado pela Igreja, mas por ti mesmo? Eis, na verdade, uma unção da qual Cristo nada sabe, e que ele não reconhece”.
“Em terceiro lugar, o pensamento e o desejo de Cristo, suas palavras os
indicam suficientemente, são no sentido de que se fazendo uso do
sacramento, anunciamos sua morte. “Fazei isto”, disse, em memória de
mim, e, como acrescenta São Paulo, até que ele venha. E tu, dizedor[11] de missas privadas, em todas as tuas missas, tu não pregaste ou confessaste, uma só vez, o Cristo; reservaste só para ti o sacramento[12], e, as palavras da ceia, as resmungaste só
para ti, entre dentes, como se as assobiasse. Foi isto que Cristo
instituiu? Seriam estes os atos que fariam ver em ti o padre de Cristo? E
isto se comportar como um padre cristão e piedoso?
Foi para isto que foste ordenado?”
“Em quarto lugar, está claro que o pensamento e o desejo, a instituição,
de Cristo, consistem na participação dos demais cristãos no sacramento.
Mas tu, tu recebeste a unção, não
para distribuir o sacramento, mas para sacrificar, e, contra a
instituição de Cristo, fizeste da missa um sacrifício. É isto mesmo,
aliás, o que significam, claramente, as palavras do ordenador, visto
que, segundo o rito tradicional, quando ele põe o cálice entre as mãos
do novo padre, declara: “Recebe, diz ele, o poder de consagrar e
sacrificar para os vivos e mortos'. Que perversidade, ó infelicidade!
Quanta infâmia nessa unção, nessa ordenação! Eis
uma carne, eis uma bebida que Cristo instituiu para toda a Igreja, para
todos aqueles que o comungam com o padre, e tu realizas, tu, um
sacrifício propiciatório diante de Deus? Ó abominação que ultrapassa todas asabominações!”
“Em quinto lugar, o pensamento e o desejo de Cristo, já o dissemos, são
que o sacramento seja distribuído na Igreja, e aos comungantes, para
levantar e reforçar sua fé contra as diversas tentações do pecado, do
diabo, etc, e, também, para renovar e pregar os benefícios de Cristo.
Mas tu o consideraste como uma coisa muito pessoal, que poderias fazer
sem os outros, ou comunicar-lhes tua fantasia, seja gratuitamente, seja
por dinheiro. Eu te pergunto, o que podes negar de tudo isto? Assim, aí
está o padre que foste, sem Cristo, não a fim de conferir o sacramento aos outros, mas a fim de sacrificar para os vivos e para os mortos! Não, tu não pregaste o Cristo na tua missa, não fizeste, em suma, aquilo que Cristo instituiu. Ora! Não vês que foste ungido e ordenado pelo bispo contra Cristo, não te é evidente que tua unção e
tua ordenação são ímpias, falsas e anticristãs? Eu sustento, pois, que
tu, simplesmente, ofereceu, adorou, e fez adorar pelos outros, pão e
vinho[13].
“Vês agora que, na tua missa falta, primeiro que tudo, uma pessoa que
tenha poder de consagrar, isto é, um homem cristão. Em segundo lugar,
que falta uma pessoa para quem se consagre e a quem se deva conferir o
sacramento, isto é, a Igreja, o resto dos fiéis e o povo. Porém, tu,
ímpio, tu, ignorante do Cristo, estás lá de pé, sozinho[14], e imaginas que é por ti que o Cristo instituiu o sacramento
e que te basta dizer uma palavra na missa para produzir, incontinente, o
corpo e o sangue do Senhor; quando em lugar de seres um membro de
Cristo, és seu inimigo. Em terceiro lugar, falta nela o espírito, a
intenção, o fruto e a prática do sacramento, todas as coisas em vista
das quais Cristo a instituiu. Porque Cristo instituiu o sacramento em
proveito da Igreja para ser comido e bebido, para fortalecer a fé dos
fiéis, para pregar e exaltar, na missa, os benefícios de Cristo. Agora,
dá tua missa para ti. ninguém, no resto da Igreja, nada conhece; tu não
dizes nada, não dás nada a ninguém[15]; sozinho no teu canto, silencioso e mudo, tu
comes só, bebes só, ignorante da palavra de Cristo, incrédulo, indigno,
não fazes comungar ninguém contigo, e, segundo o costume que vos é
caro, a vendes por dinheiro, como se fosse um bom trabalho[16]”.
“Portanto, se não és a pessoa que pode e deve consagrar;
se, do mesmo modo, não há ninguém em tua missa, para receber o
sacramento; se, ainda mais, confundes, destróis ou desnaturas
completamente a instituição de Cristo, o que são, então, a tua unção,
tua missa e tua consagração, senão blasfêmias e tentações a Deus? Donde se deduz que não és padre de verdade, nem o pão é verdadeiramente o corpo de Cristo”.
“Farei uma comparação: suponhamos que se administre lá onde não haja ninguém parabatizar; que um bispo, por exemplo (segundo o costume ridículo[17] que ocorre entre os papistas), ache por bem batizar um sino ou uma campainha, isto é, coisas que não podem e nem devem serbatizadas: dize-me, te peço, seria isso um batismo verdadeiro? Forçosamente hás de convir que não. Porque, quem poderia batizar aquele que não existe[18], ou quando não existe alguma pessoa apta a ser batizada? Que espécie de batismo seria se, vertendo a água, eu pronunciasse aos ares estas palavras: Eu te batizo em
nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo? Quem, pois, neste caso,
receberia a remissão dos pecados, ou o Espírito Santo? O ar ou o sino?
Não há, pois, batismo, é evidente, ainda que as palavras do batismo sejam pronunciadas, ou a água seja vertida, porque faltou uma pessoa que pudesse receber o batismo. Pois
bem, que dirias se na missa ocorresse o mesmo, se pronunciasses
palavras, crendo receber o sacramento, e que, no entanto, não recebesses
senão pão e vinho? Porque, a pessoa que deve receber, a Igreja, está
ausente; e tu, ímpio, tu, incrédulo, não és mais capaz de receber o
sacramento quanto o sino o é de receber o batismo;enfim, tu não és nada quanto ao sacramento[19]”.
“Dirás, provavelmente: é verdade, não confiro o
sacramento aos outros membros da Igreja, mas eu próprio o tomo, eu mesmo
me confiro. E há muitos entre os outros que, quão incrédulos que sejam,
recebem o sacramento ou o batismo; e, no entanto, é um verdadeiro batismo, um
verdadeiro sacramento que eles recebem. Por que, então, não haveria na
minha missa um verdadeiro sacramento? Mas, isto não é a mesma coisa: no batismo, de fato (mesmo quando é conferido em caso de urgência), há, pelo menos duas pessoas: a que batiza e a que deve serbatizada, e, freqüentemente, muitos outros membros da Igreja. E a função daquela que batiza é
tal que ela comunica algo às outras pessoas da Igreja, em vez de
tomá-la por ela somente, em detrimento das demais, como tu fazes, tu, na
tua missa. Enfim, todos os acessórios da obra principal estão aqui,
segundo a ordem e a regra da instituição de Cristo; tua missa, ao
contrário, é oposta à instituição de Cristo[20]”.
“Em segundo lugar, por que não ensinais que se pode batizar a si mesmo? Por que condenais um batismo dessa
espécie? Por que rejeitais a confirmação que, segundo vossos ritos, não
se daria a si mesmo? Por que a ordenação não valeria nada, se qualquer
um se ordenasse padre ele próprio? Por que não haveria absolvição, se se
absolvesse a si mesmo? Por que não haveria unção, se um doente terminal
se desse a si mesmo, de acordo com as formas utilizadas por vós? Por
que não haveria matrimônio, se alguém se
desposasse a si mesmo, ou quisesse forçar uma moça, e pretendesse que
isso seria um casamento, apesar da moça? Porque, eis aí, com a
eucaristia estão os vossos sete sacramentos. Ora, se ninguém pode
produzir nenhum dos vossos sacramentos, nem usá-los para si mesmo, como
explicas que queiras fazer por si só esse sacramento supremo, a
eucaristia?”
“É verdade, sem dúvida, que o Cristo se encontra, ele
próprio, no sacramento, e, que, qualquer ministro que seja, ao
conferi-lo aos outros, se toma por ele. Mas, não o consagra por ele só: toma-o em
comunhão com os assistentes e com a Igreja, e tudo se passa conforme o
verbo de Deus, segundo a ordem e o mandamento de Cristo. Quando falo de
consagração, é para perguntar se um padre pode consagrar e realizar o
sacramento por si só, porque sei muito bem que, uma vez a consagração
feita, ele pode usá-la com os demais: é uma comunhão, e a mesa do Senhor
está aberta a todos. Do mesmo modo, quando perguntei se se poderia dar a
unção e chamar-se a si mesmo, eu sabia, de
resto, que uma vez ungido e chamado, poderia, em seguida, usar da sua
vocação. Do mesmo modo, falando de alguém que violasse uma moça,
perguntei se bastava ao ímpio chamar de casamento essa conjunção; mas,
sei muito bem que se a moça consentir antes em casar-se, a conjunção que se seguir é um casamento”.
Nessa angústia, nesse debate contra o diabo[21], eu queria resistir ao inimigo com as armas que me eram familiares sob o papado; eu lhe objetei com
a intenção e a fé da Igreja, fé e intenção às quais eu me tinha
conformado, celebrando missas privadas. Admitindo, disse, que eu
estivesse enganado na minha fé, e no meu pensamento, assim ele estaria
certo de que a fé da Igreja, o pensamento da Igreja têm sido o que
deveriam ser.
Porém, Satanás, com mais força e veemência:
“Ah, é isto, disse-me, faça-me, então,
ver onde está escrito que um ímpio, um incrédulo, pudesse oficiar no
altar de Cristo e consagrar, realizar o sacramento na fé da Igreja[22]? Onde
foi que Deus prescreveu ou ordenou isso? Como provarás que a Igreja te
comunica sua intenção para que digas tua missa privada? E se, agora, não
possuis o verbo de Deus, se tua doutrina toda não passa de mentira. Que
impudência a vossa! Fizestes tudo isto nas trevas, abusastes do nome da
Igreja; e, depois, quereis defender todas essas abominações pretextando
a intenção da Igreja: a Igreja não crê nada, não pensa nada fora do
verbo e da instituição de Cristo, com muito mais razão ainda contra seu
espírito e sua instituição; é o que tenho dito, e São Paulo disse antes
de mim, na sua primeira Epístola aos Coríntios (cap. II), comovendo a Igreja e a assembléia dos fiéis: “Nós possuímos o espírito de Cristo”.
“Ora, de quem aprenderás que tal ou qual coisa é segundo
o espírito e a intenção de Cristo e da Igreja, senão do verbo de Jesus
Cristo, da doutrina e da confissão da Igreja? Como sabes que, segundo a
intenção, e o espírito da Igreja, o homicídio, o adultério, a
incredulidade, são pecados mortais, como sabes isto e outras coisas do
mesmo gênero, senão pelo verbo de Deus?”
“Agora, se para conhecer a intenção da Igreja, a respeito das boas ou das más ações, é preciso referir-se ao
verbo e ao mandamento de Deus, quanto maior não será a necessidade de
perguntar ao verbo de Deus o que ele pensa da doutrina! Por que, então,
tua missa privada, ó blasfemador! Contrarias as ordens e as palavras
precisas de Cristo? Por que buscar, em seguida, cobrir tua mentira, tua
impiedade, com o nome e a intenção da Igreja? É com essas miseráveis
cores que enfeitas tuas ficções, como se a intenção da Igreja pudessem
ser contrárias às palavras precisas e à instituição de Cristo? Donde te
vem essa prodigiosa audácia de profanar o nome da Igreja com uma mentira
tão impudente?”
“Em suma, és dizedor de missas, e tu não fostes
consagrado assim, pelo bispo, senão para agir na missa privada contra as
palavras precisas e a instituição de Cristo, contra o espírito, a fé e a
confissão da Igreja: então, tua unção é tudo o que existe de mais
profano; nada tem de santa nem de sagrada. Além do mais, ela é mais vã,
mais inútil, e também mais ridícula do que seria obatismo de uma pedra, de um sino, etc.”.
E, para terminar, acrescentou Satanás:
“Fica provado que tu não consagraste, mas somente
ofereceste pão e vinho, como os pagãos; e, que, num tráfico infame,
insultante para a divindade, vendeste tua obra aos cristãos, não
servindo, assim, nem Deus, nem Cristo, mas teu ventre”.
“Qual é, pois, essa abominação, inaudita no Céu e na terra?”
Este é, mais ou menos, o resumo dessa discussão.
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