ihu - “Tomara que esta consulta ao Povo de Deus, iniciada com o questionário, seja o começo de algo habitual, para que nós, os leigos e batizados em geral, possamos participar das tomadas de decisões na Igreja”, escreve Raquel Mallavibarrena, das Redes Cristianas, ao responder o questionário em preparação ao Sínodo Extraordinário sobre a Família. As respostas são publicadas por Religión Digital, 03-12-2013. A tradução é do Cepat.
Nota da IHU On-Line: Redes Cristianas
é uma plataforma formada por mais de 200 grupos, comunidades e
movimentos católicos de base do Estado espanhol. Segundo o sítio de
Redes Cristianas, "desde estes coletivos, pertencentes à base eclesial,
queremos ajudar a responder aos grandes problemas que a sociedade e a
Igreja nos apresentam, hoje".
Eis as perguntas e respostas.
1 – Sobre a difusão da Sagrada Escritura e do Magistério da Igreja a propósito da família
a) Qual é o conhecimento real dos ensinamentos da Bíblia, da
Gaudium et Spes, da Familiaris Consortio e de outros documentos do
Magistério pós-conciliar sobre o valor da família segundo a Igreja
católica? Como os nossos fiéis são formados para a vida familiar, em
conformidade com o ensinamento da Igreja?
O conhecimento é muito pobre em geral, durante alguns anos, após o Concílio,
fomentou-se muito a formação dos leigos (escolas de teologia, etc...),
mas de qualquer forma não foram tantos os que participaram dessas
iniciativas. Se os documentos estivessem redigidos de maneira mais
simples e abordassem os problemas que tantas famílias vivem, dando-lhes
perspectiva e esperança, seguramente teriam maior difusão.
b) Onde é conhecido, o ensinamento da Igreja é aceito
integralmente. Verificam-se dificuldades na hora de o pôr em prática? Se
sim, quais?
Para além de algumas ideias gerais, com as quais é quase impossível estar em desacordo, a impressão que muitos ensinamentos da Igreja
trazem, no que diz respeito à família e, concretamente, à pastoral
familiar, é que partem de uma grande desconfiança no ser humano, ao
invés de uma valorização positiva da sexualidade, com a qual todos nós
nascemos. Parece que é apenas algo necessário para a procriação e um
motivo pelo qual todos nós podemos nos tornar egoístas, apenas buscar
prazer, etc... Assim, é muito difícil a aceitação de uma série de
proibições que não possuem fundamento e que é tarefa árdua cumprir. Em
relação à família, embora não se diga expressamente, com frequência
ainda subjaz um modelo de família tradicional que pode ser válido para
alguns, mas que pode e deve ser compatível com muitos outros modelos,
que estão cada vez mais presentes entre muitas pessoas católicas. Por
outro lado, às vezes, os católicos são tratados como pessoas não
adultas, que não podem tomar suas próprias decisões, inclusive em
assuntos de grande intimidade.
c) Como o ensinamento da Igreja é difundido no contexto dos
programas pastorais nos planos nacionais, diocesano e paroquial? Que
tipo de catequese sobre a família é promovida?
Minha experiência me alegra muito por ter passado por paróquias e
comunidades com mentalidades abertas e positivas sobre as questões da
família, o mesmo posso dizer de meu próprio âmbito familiar. É uma pena
que em questões tão importantes para a vida de uma pessoa, com
frequência não se enfoquem esses programas e catequeses de maneira
sonhadora e que se fomente os cristãos adultos para que conduzam as
rédeas de sua vida familiar e que sejam capazes de acolherem novas
situações que lhes sejam apresentadas à luz do Evangelho. Não vivemos em
uma sociedade apenas de católicos e que não aceita mais do que um
modelo de família. Felizmente, todos nós nos enriquecemos com a
diversidade de pessoas com as quais compartilhamos nossa vida e isso nos
deve interpelar à realidade de cada pessoa e, em definitivo, para que a
família seja algo acolhedor e uma experiência de amor que nos construa
como pessoas.
d) Em que medida – e em particular sob que aspectos – este
ensinamento é realmente conhecido, aceito, rejeitado e/ou criticado nos
ambientes extra-eclesiais? Quais são os fatores culturais que impedem a
plena aceitação do ensinamento da Igreja sobre a família?
O que mais se conhece é o mais polêmico, o que mais se choca com a
mentalidade moderna e com os conhecimentos científicos atuais (existe
uma quantidade de questões em relação às quais a Igreja se nega a
aceitar e que estão em oposição com as evidências científicas que hoje
se tem).
Sempre me pareceu um erro, injusto e em boa medida falso, pensar que
aqueles que não são católicos, que são egoístas, estão equivocados,
etc... Que se insinue ou se diga abertamente que uma pessoa (católica ou
não) que se separou de seu parceiro é egoísta ou inclusive fútil, que
se coloque contra as pessoas homossexuais, que se ofenda e estigmatize a
alguns pais que favorecem a seleção de embriões para seu segundo filho e
assim possa salvar o primeiro que está doente, que se chame de
assassina a uma mulher que aborta... são questões que colidem com a
misericórdia e, além disso, não admitem que se possa viver a sexualidade
e a realidade familiar de maneira honesta, mas seguindo outros padrões e
critérios diferentes dos tradicionais.
2 – Sobre o matrimônio segundo a lei natural
a) Que lugar ocupa o conceito de lei natural civil, quer nos
planos institucional, educativo e acadêmico, quer a nível popular? Que
visões da antropologia estão subjacentes a este debate sobre o
fundamento natural da família?
Acredito que o conceito de lei natural precisa ser revisado e
atualizado, pode ser um conceito vazio o que soa raro se não sabemos
muito bem ao que nós estamos nos referindo e acredito que é isso o que
pode estar ocorrendo em muitos âmbitos.
A realidade familiar é forte na Espanha. Com a crise, está se notando
que os laços e a solidariedade familiar estão sendo muito importantes. A
sabedoria popular, o sentido comum e a experiência nos vão guiando e o
fundamento natural da família, mais do que com palavras muito elaboradas
e distantes, está nesse amor incondicional de todos para com todos os
membros da família, nessa convivência que nos ajuda a saber nos
relacionar e a crescer como pessoas.
b) O conceito de lei natural em relação à união entre o homem
e a mulher é geralmente aceite, enquanto tal, por parte dos batizados?
Sim. É comumente aceito, mas vai se consolidando cada vez mais a
aceitação de uma união entre dois homens ou duas mulheres, e estas
uniões não são vistas como antinaturais.
c) Como é contestada, na prática e na teoria, a lei natural
sobre a união entre o homem e a mulher, em vista da formação de uma
família? Como é proposta e aprofundada nos organismos civis e eclesiais?
O que é aceito socialmente é a união entre um homem e uma mulher para formar uma família. A sociedade vai à frente da Igreja,
não vendo problema em casais que não se casam, mas que convivem e
formam uma família, casais que rompem e dão lugar a outros, etc... Como
disse antes, as legislações e a sociedade aceita cada vez mais as
famílias formadas por casais homossexuais, coisa que a Igreja rejeita.
d) Quando a celebração do matrimônio é pedida por batizados
não praticantes, ou que se declaram não-crentes, como enfrentar os
desafios pastorais que disto derivam?
Acredito que a primeira coisa é estabelecer um diálogo sincero que
permita discernir os motivos reais pelos quais essas pessoas querem se
casar na Igreja, e ver se isso faz sentido. Existe o matrimônio civil e,
portanto, casar-se na Igreja não é obrigatório. Não há que desvirtuar
ou trivializar o sacramento, mas, tampouco deve se excluir alguém que
sinceramente queira se comprometer em matrimônio mediante a celebração
católica.
3 – A pastoral da família no contexto da evangelização
a) Quais foram as experiências que surgiram nas últimas
décadas em ordem à preparação para o matrimônio? Como se procurou
estimular a tarefa de evangelização dos esposos e da família? De que
modo promover a consciência da família como “Igreja doméstica”?
As perguntas parecem indicar que a preparação para o matrimônio deve
insistir em que a família será cristã, que deve evangelizar, etc... e
disso não se pode discordar, mas para mim o importante da preparação
para o matrimônio é conseguir que os futuros esposos não o tomem como
um trâmite que é preciso passar, mas como algo que lhes será
verdadeiramente útil. Em primeiro lugar para clarificar e consolidar sua
decisão de contrair matrimônio e, depois, para situar essa nova vida
que irão empreender em comum dentro de sua vida de crentes na fé
católica, que não caminhe cada coisa por um lado, mas que seu ser de
crentes atinja a todos os âmbitos da vida e, neste caso, atinja a sua
vida matrimonial e familiar. Há muitos lugares nos quais a preparação
para o matrimônio é feita com estes objetivos e então, sim, vale a pena.
b) Conseguiu-se propor estilos de oração em família, capazes de resistir à complexidade da vida e da cultura contemporânea?
Não tenho muita informação a esse respeito, mas em todo caso as
dificuldades são grandes devido aos horários e a complexidade do
cotidiano de tantas famílias.
c) Na atual situação de crise entre as gerações, como as
famílias cristãs souberam realizar a própria vocação de transmissão da
fé?
O testemunho sincero de viver o mais coerentemente possível diante
dos filhos é na minha avaliação algo essencial na transmissão da fé.
Porém, é preciso admitir que com bastante frequência os filhos aceitam e
herdam os valores humanos, mas não a fé de seus pais, que às vezes
pensam que cometeram algum erro e se sentem culpados.
d) De que modo as Igrejas locais e os movimentos de espiritualidade familiar souberam criar percursos exemplares?
É delicado falar de caminhos exemplares neste assunto. Esses
movimentos costumam ser muito conservadores e apresentam um modelo de
família tradicional que não se encaixa com muitas realidades antigas.
Pode-se e deve-se criar referências, mas não se deve sacralizar um
modelo de família concreto, a não ser algumas atitudes básicas que os
membros de uma família (seja esta qual for) devem ter como crentes.
e) Qual é a contribuição específica que casais e famílias
conseguiram oferecer, em ordem à difusão de uma visão integral do casal e
da família cristã, hoje credível?
Como se prega com o exemplo, há muitos casais e famílias que
contribuem com sua experiência de vida em comum, seguindo os valores do
Evangelho. Não há um único modelo, o comum é essa vivência dos valores
do Evangelho que pode se concretizar de diversas maneiras.
Que atenção pastoral a Igreja mostrou para sustentar o caminho dos casais em formação e dos casais em crise?
A atenção oferecida vai, especialmente, na linha de que o casal não
termine, o que pode ter sentido e é bom em muitos casos, mas em outros
talvez a melhor solução é a ruptura. Posso dizer que a paróquia na qual
está minha comunidade de base tem, há muitos anos, uma pastoral para
separados e seria muito positivo que esta pastoral se estendesse para
outras paróquias.
4 – Sobre a pastoral para enfrentar algumas situações matrimoniais difíceis
a) A convivência ad experimentum é uma realidade pastoral
relevante na Igreja particular? Em que porcentagem se poderia
calculá-lo numericamente?
É cada vez mais frequente que um casal conviva antes de se casar,
embora não “seja permitido aos católicos”, isso não é obstáculo para que
se dê essa convivência prévia antes de formalizar a relação com o
matrimônio. Esta convivência prévia pode ser mais ou menos prolongada e
estar fundamentada ou menos segundo alguns delineamentos cristãos.
Acredito que a pastoral deveria entrar em diálogo com esta realidade
antes de se lançar a condená-la e ver quais motivações conduzem a ela e
se são compatíveis com as convicções cristãs. Consta-me que algumas
paróquias assumem que essa realidade ocorre, no momento de planejar os
cursos de preparação para o matrimônio.
b) Existem uniões livres de fato, sem o reconhecimento religioso nem civil? Dispõem-se de dados estatísticos confiáveis?
Eu não tenho dados, mas cada vez são mais frequentes essas uniões.
c) Os separados e os divorciados recasados constituem uma
realidade pastoral relevante na Igreja particular? Em que porcentagem se
poderia calculá-los numericamente? Como se enfrenta esta realidade,
através de programas pastorais adequados?
Pertenço a uma paróquia em que há, desde muitos anos, uma pastoral de
separados e divorciados, temo que não seja assim na maioria das
paróquias. A atenção e o acompanhamento às pessoas que sofrem com uma
separação e que quando decidem refazer sua vida encontram a rejeição do
magistério da Igreja é muito importante. É urgente revisar, à luz do
Evangelho, a indissolubilidade do matrimônio, o que tem de genuinamente
cristão e o que há do transcorrer da História. Não cabe na mentalidade
moderna que o fracasso de uma relação do casal impeça que essas pessoas
possam ser felizes em outra relação. Além disso, os processos de
nulidade (única possibilidade para um segundo casamento) são muito
controvertidos e dolorosos para as pessoas que acorrem a eles com boa
fé, sem querer exagerar ou forçar argumentos para conseguir a anulação
de seu matrimônio.
d) Em todos estes casos: como vivem os batizados a sua
irregularidade? Estão conscientes da mesma? Simplesmente manifestam
indiferença? Sentem-se marginalizados e vivem com sofrimento a
impossibilidade de receber os sacramentos?
Há diferentes situações e processos, desde os que se afastam da Igreja,
passando pelos que podem viver sua situação com sentimento de culpa,
até os que conseguem ter paz interior e viver “sua irregularidade” com o
convencimento de que é o que devem fazer segundo sua consciência. É
necessária e urgente uma pastoral de acompanhamento e de acolhida para
estas pessoas.
e) Quais são os pedidos que as pessoas separadas e
divorciadas dirigem à Igreja, a propósito dos sacramentos da Eucaristia e
da Reconciliação? Entre as pessoas que se encontram em tais situações,
quantas pedem estes sacramentos?
Volto a insistir na necessidade urgente de acompanhar e acolher as
pessoas católicas que sofrem ou sofreram por sua separação matrimonial,
que ao refazer sua vida com outra pessoa encontram a rejeição da Igreja
por sua situação “irregular”. São felizes as que encontram comunidades e
paróquias nas quais podem viver sua fé nessa nova etapa de sua vida,
lamentavelmente não é assim em geral.
f) A simplificação de praxe canônica em ordem ao
reconhecimento da declaração de nulidade do vínculo matrimonial poderia
oferecer uma contribuição positiva real para a solução das problemáticas
das pessoas interessadas? Se sim, de que forma?
Minha opinião é a de que é preciso revisar o que se entende por
matrimônio nulo e evitar, em todo caso, a situação de “divórcio
encoberto”, que na minha avaliação ocorre, de fato, quando vemos como
casamentos de vários anos, com filhos, etc... conseguem a anulação de
seu matrimônio com argumentos de falta de maturidade, etc... Os
processos de nulidade são motivo de grande sofrimento para os que querem
ver anulado seu matrimônio. Com frequência, precisam forçar situações e
declarar coisas que se não faltam à verdade se aproximam muito disso,
para conseguir que o matrimônio seja declarado nulo. Acredito que é
preciso revisar o que significa a indissolubilidade do matrimônio e
levar em conta o sentido que pode ter a manutenção, a todo custo, de um
matrimônio que realmente não existe como tal.
g) Existe uma pastoral para ir ao encontro destes casos? Como
se realiza esta atividade pastoral? Existem programas para este
propósito, nos planos nacional e diocesano? Como a misericórdia de Deus é
anunciada a separados e divorciados recasados e como se põe em prática a
ajuda da Igreja para o seu caminho de fé?
Conheço os casos de algumas paróquias em Madri que já possuem muitos
anos nessa direção de acolhida e misericórdia (volto a dizer que a
palavra misericórdia pode levar a pensar que essas pessoas cometeram um
erro que se deve perdoar e em muitíssimos casos não é assim), mas
acredito que são excepcionais.
5 – Sobre as uniões de pessoas do mesmo sexo
a) Existe no vosso país uma lei civil de reconhecimento das
uniões de pessoas do mesmo sexo, equiparadas de alguma forma ao
matrimônio?
Sim, desde 2005.
b) Qual é a atitude das Igrejas particulares e locais, quer
diante do Estado civil promotor de uniões civis entre pessoas do mesmo
sexo, quer perante as pessoas envolvidas neste tipo de união?
A hierarquia da Igreja Católica e os setores
conservadores católicos mostraram uma grande falta de compreensão e
sentido cristão para com estas uniões, com suas manifestações e opiniões
à sociedade. Algumas declarações poderiam ser tachadas, inclusive, de
inconstitucionais por sua falta de respeito às leis aprovadas pelo
Parlamento e por seu ataque a pessoas que não fizeram nada de ruim e que
tem os mesmos direitos que qualquer um. A ignorância sobre os estudos
científicos, que foram feitos acerca da homossexualidade, também se
manifesta nessas declarações.
c) Que atenção pastoral é possível prestar às pessoas que escolheram viver em conformidade com este tipo de união?
Apesar da marginalização a que são submetidos, há muitos homossexuais
cristãos que se sentem plenamente crentes e vivem sua fé como qualquer
batizado, com enormes dificuldades para encontrar espaço dentro de uma Igreja
que como instituição os marginaliza, mas que por sua vez mantém uma
grande hipocrisia ao ocultar a homossexualidade de um número não pequeno
de membros do clero e de congregações religiosas.
d) No caso de uniões de pessoas do mesmo sexo que adotaram
crianças, como é necessário comportar-se pastoralmente, em vista da
transmissão da fé?
A primeira coisa para mim é considerar que as crianças não devem
pagar as consequências das decisões que tenham tomado seus pais e a Igreja. Por outro lado, acredito que a aceitação de que há diferentes tipos de famílias cristãs é um processo que a Igreja
deve empreender o quanto antes. A sociedade já faz isso e nos passou
com acréscimos. É difícil entender uma postura tão fechada da Igreja para outros tipos de família, quando socialmente algo é visto com normalidade em setores cada vez mais amplos.
6 – Sobre a educação dos filhos no contexto das situações de matrimônios irregulares
a) Qual é nestes casos a proporção aproximativa de crianças e
adolescentes, em relação às crianças nascidas e educadas em famílias
regularmente constituídas?
Não tenho dados concretos, mas imagino que é muito baixa.
b) Com que atitude os pais se dirigem à Igreja? O que pedem?
Somente os sacramentos, ou inclusive a catequese e o ensinamento da
religião em geral?
O importante é o acompanhamento e a acolhida, acredito que isso é o
que pedem fundamentalmente, caso se dê esse clima positivo, os
sacramentos e a catequeses serão algo natural, de outro modo será
construir em falso.
c) Como as Igrejas particulares vão ao encontro da
necessidade dos pais destas crianças, de oferecer uma educação cristã
aos próprios filhos?
Minha impressão é que essa aproximação se dá apenas em casos contados.
d) Como se realiza a prática sacramental em tais casos: a preparação, a administração do sacramento e o acompanhamento?
Nos poucos casos em que se desenvolve é importante a normalização da
situação, não se parte de uma situação de culpa dos pais e se procede
como nos demais casos.
7 – Sobre a abertura dos esposos à vida
a) Qual é o conhecimento real que os cristãos têm da doutrina
da Humanae Vitae a respeito da paternidade responsável? Que consciência
têm da avaliação moral dos diferentes métodos de regulação dos
nascimentos? Que aprofundamentos poderiam ser sugeridos a respeito desta
matéria, sob o ponto de vista pastoral?
Nas gerações mais jovens o conhecimento da encíclica é pequeno e
geral. Lamentavelmente, o que se percebe é a proibição da utilização de
métodos anticonceptivos que socialmente são aceitos sem nenhum problema.
É uma questão fundamental e acredito que a Igreja Católica
ficou completamente defasada em suas concepções. Felizmente, sempre
houve setores do clero que viram as coisas com maior abertura e isso
beneficiou muitos católicos e católicas que puderam tomar decisões sem
arrastar sentimentos de culpabilidade.
É preciso colocar em dia a doutrina da Igreja,
levando em conta os conhecimentos científicos e as opiniões do campo da
bioética em sua pluralidade, não vale atender somente a determinados
posicionamentos ideológicos.
b) Esta doutrina moral é aceite? Quais são os aspectos mais
problemáticos que tornam difícil a sua aceitação para a grande maioria
dos casais?
Desde a publicação da Humanae Vitae, houve muita
rejeição e descumprimento, não se entende a razão pela qual um casal que
pode ter filho não pode utilizar métodos não abortivos para ser
responsáveis em suas decisões e, por sua vez, desfrutarem sadiamente da
sexualidade sem o risco de gravidezes frequentes e não desejadas.
c) Que métodos naturais são promovidos por parte das Igrejas
particulares, para ajudar os cônjuges a pôr em prática a doutrina da
Humanae Vitae?
Os métodos naturais costumam ser muito pouco confiáveis e, portanto, o
risco de que se produza uma gravidez aumenta. Não sei se compreendo o
problema que há com outros métodos já que, como disse antes, a abertura
para ter filhos não precisa se dar em todo ato sexual. A não ser como
uma visão geral, a doutrina da Humanae Vitae é, desde a sua publicação, muito contestada nesse aspecto.
d) Qual é a experiência relativa a este tema na prática do sacramento da penitência e na participação na Eucaristia?
Não posso responder diretamente a pergunta, mas volto a insistir na
revisão do que pode se considerar como pecado em relação às perguntas
anteriores. A decisão com a consciência responsável na utilização de
métodos anticonceptivos não abortivos não é motivo, na minha avaliação,
para um afastamento da eucaristia ou da necessidade de confissão.
e) Quais são, a este propósito, os contrastes que se salientam entre a doutrina da Igreja e a educação civil?
Já disse, antes, que a doutrina da Igreja nestes aspectos está completamente inadequada e defasada em relação ao que se aceita na sociedade civil.
f) Como promover uma mentalidade mais aberta à natalidade? Como favorecer o aumento dos nascimentos?
Não se pode pedir a uma família com dificuldades econômicas e de trabalho que tenha muitos filhos. A Igreja
deveria ser muito mais crítica com as políticas sociais e econômicas
que levam a tantos casais jovens a situações de precariedade no
trabalho, que lhes impedem de ter uma casa e de se estabelecer em
condições adequadas para ter filhos de maneira responsável. Não é
somente uma questão de egoísmo e de não querer complicar a vida.
8 – Sobre a relação entre a família e a pessoa
a) Jesus Cristo revela o mistério e a vocação do homem: a família é um lugar privilegiado para que isto aconteça?
Acredito que sim.
b) Que situações críticas da família no mundo contemporâneo podem se tornar um obstáculo para o encontro da pessoa com Cristo?
As dificuldades na convivência, crise, separações, problemas econômicos e no trabalho, problemas com os filhos...
c) Em que medida as crises de fé, pelas quais as pessoas podem atravessar, incidem sobre a vida familiar?
Logicamente, uma crise de fé afeta a pessoa em seu aspecto mais
íntimo, em suas convicções e no enfoque de sua vida, portanto terá
repercussões nas relações familiares. As consequências serão mais
positivas ou mais negativas em função da forma como se resolve a crise.
9 – Outros desafios e propostas
Existem outros desafios e propostas a respeito dos temas
abordados neste questionário, sentidos como urgentes ou úteis para parte
dos destinatários?
Acredito que o tema do aborto e as questões de reprodução assistida
ou de novas técnicas de implantação de embriões para evitar enfermidades
têm muito a ver com a família e não foram tratados no questionário.
Novamente, a Igreja mantém uma postura de rejeição absoluta, sem escutar
toda a comunidade científica e não apenas um setor da mesma. E o mesmo
pode se dizer a respeito dos especialistas em bioética. A aproximação
com a realidade humana das pessoas que tomam decisões nestes campos, com
a mais boa vontade de acertar, é algo urgente que deve se fazer antes
de manter posturas rígidas de condenação.
Finalmente, parece-me importante que este questionário tenha chegado à base da Igreja,
concretamente, para nós que formamos família, não ficando reservado à
hierarquia (homens celibatários, por mais experiência pastoral que
possam ter) ou a grupos selecionados por ela.
Tomara que esta consulta ao Povo de Deus, iniciada
com o questionário, seja o começo de algo habitual para que nós, os
leigos e batizados em geral, possamos participar nas tomadas de decisões
na Igreja.
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