IHU - Na Igreja Católica, assim como no Capitólio,
às vezes você pode quase cheirar uma solução de compromisso para um
problema espinhoso que vai ganhando forma. Esse pode ser o caso agora no
que diz respeito à permissão de que católicos divorciados e em segunda
união recebam os sacramentos, uma das dores de cabeça diante do Papa Francisco durante aquela que promete ser uma semana muito ocupada. Acredite ou não, o conceito classicamente italiano de "mamma-ismo", que significa o controle sobre um casal por parte de uma mãe dominadora, pode desempenhar um papel fundamental nisso.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no jornal The Boston Globe, 17-02-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A partir dessa segunda-feira, Francisco vai participar de três dias de encontros com o seu "G8", o conselho de oito cardeais conselheiros, um órgão do qual o cardeal Sean O'Malley, de Boston, é o único norte-americano. Espera-se que eles examinem as finanças vaticanas e diminuam a burocracia.
Depois, nos dias 20 e 21 de fevereiro, Francisco irá
presidir um encontro da maioria dos cardeais do mundo, pouco antes do
consistório de sábado. Esse é um evento em que o papa vai empossar 19
novos membros no clube mais exclusivo da Igreja, o Colégio dos Cardeais.
A sessão com os cardeais vai pôr a mesa para uma cúpula mundial de
bispos em outubro, para falar sobre casamento e família. Entre as
questões difíceis está se os católicos que se divorciaram e se casaram
novamente sem uma anulação, uma declaração da Igreja que anula o
primeiro casamento, deve ser autorizada para receber a comunhão e os
outros sacramentos da Igreja.
É difícil exagerar a importância da questão no nível de "varejo". Um estudo de 2007 descobriu que, nos Estados Unidos,
cerca de 10% dos católicos são divorciados e se casaram novamente 10
anos depois do seu primeiro casamento, um número que sobe para 18%
depois dos 20 anos.
Encontrar uma maneira para permitir que essas pessoas recebam os sacramentos tem sido adiado por décadas, e Francisco
pareceu abrir a porta para a flexibilização das regras durante um
discurso em julho. Os cardeais mais antigos têm divergido, e o
coordenador do G8 diz que a mudança é possível, mas tanto o czar doutrinal do Vaticano, quanto O'Malley sinalizam que provavelmente não é.
O futuro cardeal alemão Gerhard Müller e O'Malley
argumentaram que, dado o ensino de Cristo sobre o casamento – "o que
Deus uniu, ninguém separe" –, alguém que se casa novamente sem uma
anulação está em desacordo com a fé e, portanto, não pode receber os
sacramentos.
Às vezes ridicularizada como um "divórcio católico", uma anulação é
uma declaração por parte de um tribunal da Igreja de que um casamento
nunca existiu, em primeiro lugar porque uma das condições de validade
não foi cumprida, como o livre consentimento por ambas as partes.
Diante dessa tensão, um compromisso pode estar entrando em foco:
nenhuma mudança na proibição dos sacramentos, mas um processo mais fácil
e mais amplo para a concessão das anulações.
O'Malley levantou essa ideia durante uma recente entrevista ao jornal The Boston Globe, dizendo que, talvez, as anulações poderiam ser aceleradas, ao se eliminar a possibilidade de recurso a Roma,
uma disposição que, muitas vezes, significa que um caso pode se
arrastar por anos, se uma das partes quiser contestar o resultado.
Uma conferência de canonistas da região italiana da Ligúria no dia 15
de fevereiro pareceu apontar para a mesma direção, argumentando que as
bases sobre as quais uma anulação pode ser concedida deveriam ser
expandidas.
Em particular, esses advogados canônicos propuseram o acréscimo do "mamma-ismo"
à lista, ou seja, uma situação em que os cônjuges estão tão
completamente sob o controle de um dos pais – geralmente, de acordo com
os juristas, a mãe – que eles não têm livre-arbítrio.
Quer se entenda o "mamma-ismo" como um conceito jurídico ou
psicológico ou não, ele ilustra como muitas autoridades católicas estão
ávidas para tornar as anulações mais amigáveis.
Eis o porquê.
Muitos conservadores católicos acreditam que agora é o momento errado
para enfraquecer a defesa da Igreja da santidade do casamento,
especialmente à luz do crescente impulso ao casamento gay em todo o
mundo desenvolvido. Como se vê, permitir que os católicos divorciados e
em segunda união voltem aos sacramentos em massa equivaleria a jogar a
toalha.
Liberais e moderados que querem a mudança não podem simplesmente
ignorar esse avanço por parte daqueles preocupados com as implicações
doutrinais e políticas.
Anulações mais rápidas, mais fáceis e mais baratas podem ser uma
maneira de dar a todos, ao menos, um pouco do que querem – defendendo a
indissolubilidade do matrimônio, mas também fornecendo a milhões de
católicos divorciados e em segunda união uma estratégia de saída da sua
forma de limbo.
Saberemos em breve se é assim que pensam os quase 200 cardeais do mundo, que estarão compartilhando as suas opiniões com Francisco nesta semana.
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