19 de março de 2014
As
bases bíblicas do culto aos Santos estão desde o Antigo Testamento. Até
o século II a.C. os judeus acreditavam na existência do Hades ou Cheol e
no adormecimento da consciência dos defuntos num lugar subterrâneo,
incapazes de serem punidos ou contemplados. Mas a partir do século II
a.C. esta concepção foi abandonada pelo povo de Israel, passando a crer
que a consciência dos irmãos falecidos continuava lúcida e que eles
vivem como membros do seu povo, e solidários com os fiéis peregrinos na
terra, e intercedendo por eles.
Pode-se ver isto claramente, por
exemplo, no texto de Macabeus (II Mac 15, 7-17). Vemos nele que
Jeremias, o profeta falecido no século VI a.C., aparece a judas Macabeu
no século II a.C., juntamente com o Sumo Sacerdote Onias (também já
falecido), como “o amigo de seus irmãos, aquele que muito ora pelo povo,
pela cidade santa, Jeremias, o profeta de Deus” .
Diz a “Bíblia de Jerusalém” em nota de
rodapé a 2Mc 15, 14: “Esse papel conferido a Jeremias e a Onias é a
primeira atestação da crença numa oração dos justos falecidos em favor
dos vivos”.
No Novo Testamento esta consciência da
intercessão dos santos é fortalecida. Na epístola aos Hebreus, o autor
recorda os justos do Antigo Testamento, e mostra a sua solidariedade com
os ainda vivos na terra. Ele imagina esses justos colocados num
estádio como que a torcer pelos irmãos ainda existentes neste mundo;
constituem uma densa nuvem de torcedores interessados. São testemunhas
que nos acompanham nesta luta de hoje:
“Portanto também nós, com tal nuvem de
testemunhas ao nosso redor, rejeitando todo fardo e o pecado que nos
envolve, corramos com perseverança para o certame que nos é proposto”
(Hb 12,1).
Os mortos não estão dormindo Os
protestantes em sua maioria ensinam que os mortos estão “dormindo” e que
somente na volta de Jesus haverá a ressurreição de todos; portanto,
para eles, não há ninguém no Céu ainda, mesmo que seja apenas com a
alma, como ensina a Igreja Católica. Ora, desde os primórdios da Igreja
ela acredita na imortalidade da alma, e que cada pessoa é julgada por
Deus, imediatamente após a morte, recebendo já o seu destino eterno. E
isto é muito claro nas Sagradas
A Carta aos Hebreus diz claramente,
“como está determinado que os homens morram uma só vez, e logo em
seguida vem o juízo”. (Hb 9,27)
Isto foi definido como dogma de fé pelo
Papa Bento XII em sua Constituição “Benedictus Deus” no ano de 1336, e o
Concílio universal de Florença, na Itália, as reafirmou em 1439, na
seguinte declaração:
“As almas daqueles que, depois do
Batismo, não se tiverem manchado em absoluto com alguma mancha de
pecado, assim como as almas que, depois de contraída alguma mancha de
pecado, tiverem sido purificadas ou no corpo ou fora do corpo., essas
almas todas são recebidas no céu e vêem claramente o próprio Deus em sua
Unidade e Trindade, como Ele é; umas, porém, vêem mais perfeitamente do
que outras, conforme a diversidade de méritos de cada qual. Quanto às
almas daqueles que morrem com pecado atual e mortal. sem demora são
punidas no inferno por penas que variam para cada qual”. (Denzinger ,
Enquiridio 693).
O Concílio Vaticano II pela Constituição dogmática “Lumen Gentium” confirmou esta doutrina:
“Até que o Senhor venha na sua majestade
e todos os anjos com ele (cf Mt 25,31), e até que lhe sejam submetidas,
com a destruição da morte, todas as coisas (cf. 1Cor 15,26-27), alguns
dos seus discípulos peregrinam na terra, outros, já passados desta vida,
estão se purificando, e outros vivem já glorificados, contemplando
“claramente o próprio Deus, uno e trino, tal qual é”; todos, porém,
ainda que em grau e de modo diversos, comungamos na mesma caridade para
com Deus e para com o próximo, e cantamos o mesmo hino de glória ao
nosso Deus.
Em virtude da sua união mais íntima com
Cristo, os bem-aventurados confirmam mais solidamente toda a Igreja na
santidade, enobrecem o culto que ela presta a Deus na terra e muito
contribuem para que ela se edifique em maior amplitude (cf. 1Cor
12,12-27). Porque foram já recebidos na Pátria e estão na presença do
Senhor, (cf 2Cor 5,8) – por ele, com ele e nele – não cessam de
interceder em nosso favor junto do Pai, apresentando os méritos que –
por meio do único Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, (cf. l
Tm 2,5). Na verdade, a solicitude fraterna dos bem-aventurados ajuda
imenso a nossa fraqueza.” (LG, 49)Em Mateus 10,28 Jesus diz: “não temais
os que matam o corpo, mas não podem matar a alma (‘psyché”); temei,
antes, aquele que pode fazer perecer na geena o corpo e a alma”.
A palavra grega “psychè” significa alma;
então, o texto afirma a sobrevivência da alma após a destruição do
corpo da pessoa. Em Lucas 16,19-51, na parábola do rico e do pobre
Lázaro, Jesus apresenta a sobrevivência consciente tanto dos justos como
dos injustos. O rico após a morte vai para um lugar de tormento; e o
pobre para um lugar de gozo. Isto enquanto a vida continua na terra,
quer dizer, antes da volta de Jesus. O rico tinha cinco irmãos que
poderiam também se perder também; e mostra que os defuntos sobrevivem
após a morte e recebem já o prêmio ou o castigo.
Não se pode dizer que esta parábola é
apenas mera ornamentação; ao contrário, traz um ensinamento religioso e
doutrinário fundamental.
A ressurreição da carne no último dia,
na consumação da História com a volta de Jesus, darão algo mais à
felicidade dos justos cujas almas já estão no gozo da presença de Deus.
Essas almas se unirão a seus corpos ressuscitados e viverão na plenitude
de suas pessoas. A ressurreição da carne completará a ordem e a
harmonia que a alma santa já desfruta após a morte.
Vemos em Ap 6, 9-11 que as almas do
justos martirizados aspiram, na presença de Deus, à plena restauração da
ordem e da justiça violadas pelo pecado; e assim, esperam algo que
ainda não aconteceu, e que vai acontecer só na Parusia. Embora elas já
estejam revestidas de vestes brancas, que é símbolo da vitória final e
da bem-aventurança, continuam a acompanhar a nossa história, aguardando
com expectativa o julgamento do Senhor.
“Quando abriu o quinto selo, vi debaixo
do altar as almas dos homens imolados por causa da palavra de Deus e por
causa do testemunho de que eram depositários. E clamavam em alta voz,
dizendo: Até quando tu, que és o Senhor, o Santo, o Verdadeiro, ficarás
sem fazer justiça e sem vingar o nosso sangue contra os habitantes da
terra? Foi então dada a cada um deles uma veste branca, e foi-lhes dito
que aguardassem ainda um pouco, até que se completasse o número dos
companheiros de serviço e irmãos que estavam com eles para ser mortos.”
(Ap 6,9-11)
Do livro: A Intercesão e o Culto dos Santos – Imagens e relíquias
Prof. Felipe Aquino
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