Se encontrardes belas e saborosas maçãs num espinheiro, sabei que não
foi esse áspero arbusto que as produziu, mas sim um milagre de Deus. Se
do ovo de uma serpente virdes sair um formoso e cantante rouxinol,
sabei que não foi a serpente que o gerou, mas sim um outro milagre
divino.
Estes pensamentos nos ajudam a entender como, neste século que parece realizar a profecia de Nosso Senhor “quando
virdes estabelecida no lugar santo a abominação da desolação [...] a
tribulação será tão grande como nunca foi vista desde o começo do mundo”
(Mt 24, 15-21), é possível desabrochar de modo inesperado entre
crianças e adolescentes, filhos de pais não religiosos, uma tendência a
pedir o batismo.
O fenômeno é notório na França, e o conhecido jornal “La Croix” dedica-lhe extensa reportagem em seu caderno Religião e Espiritualidade (19-4-14). Logo na epígrafe lemos: “É cada vez maior o número de crianças de mais de sete anos que empreendem um caminho de fé, para surpresa de seus familiares”.
Alguns dados extraídos dessa reportagem, constituem o cerne deste artigo. Vamos a eles.
“‘Para me tornar melhor’. ‘Porque eu sentia necessidade de crescer
com fé’. ‘Para dar um sentido a minha existência e pôr a minha vida nas
mãos de Deus’. É por meio dessas palavras que Alexandre, Vitória e
M’Ballou testemunham o seu percurso. “Juntamente com dez outros de seus
companheiros das capelanias [pastorais escolares] de Vanves et de
Malakoff (Hauts-de-Seine), esses três adolescentes de 14 a 19 anos se
preparam para se tornarem cristãos. Seu desejo de serem batizados não
tem origem em suas tradições familiares.
“Impossível enumerar, entre as 12 mil crianças de 7 a 12 anos e os 5
mil adolescentes de 12 a 18 anos, batizados por ano, quantos
empreenderam um caminho inteiramente pessoal, no qual os pais
absolutamente não intervieram, fossem estes não-crentes, praticantes de
outra religião, ou simplesmente afastados da Igreja.
Os responsáveis constatam que o fenômeno toma grande vulto. “Com uma
mãe não batizada e um pai ateu, aos 14 anos Alexandre, bom aluno do
curso colegial, escolheu abraçar a fé católica, para surpresa dos pais.
“Ao assistir um batismo, M’Ballou, que se prepara hoje em dia para um
concurso de enfermagem, sentiu desejo de se aproximar da Igreja. ‘Eu
cresci livre mas sem fé, entre uma mãe católica e um pai muçulmano. Eu
me dei conta que a fé me fazia falta’, conta a jovem, hoje com 19 anos.
“Para Vitória, 17 anos, olhar claro e blusão de couro preto, em sua
casa nunca se pôs o problema da religião. ‘Meus pais são divorciados.
Minha mãe é batizada, mas nunca foi ao Catecismo, e meu pai tem a imagem
da Ceifadora [representação da morte] tatuada no braço: a religião de
nenhum modo é de seu gosto’. Desde a idade dos 6 anos, a menina vem
pedindo regularmente para ser batizada, mas sem sucesso. Até que ‘aos 15
anos, eu me zanguei verdadeiramente’ e então sua mãe telefonou para a
capelania.
“Em Colommiers (Aude), Benjamin confessa sentir um certo ‘orgulho’
vendo seu filho Maxime, 10 anos, preparar-se para a celebração. ‘Foi por
meio do escotismo que ele desejou frequentar o catecismo, ser batizado e
fazer a Primeira Comunhão. De nosso lado, nem minha esposa nem eu somos
crentes e praticantes. É sua primeira escolha de adulto. Eu o vejo
crescer, ele traça seu caminho, torna-se autônomo’.”
* * *
Que neste século de incredulidade e torpezas possam germinar graças
tão insignes quanto inesperadas, só pode ser atribuído a uma ação do
Divino Espírito Santo, a rogos de Maria Santíssima.
“O vento sopra onde quer; ouves-lhe a voz, mas não sabes de onde
vem, nem para onde vai. Assim acontece com aquele que nasceu do
Espírito” (Jo 3,8).
Um incrédulo poderia perguntar: mas no que vai dar tudo isto? Não tem futuro. Acabará engolido pelas ondas da modernidade.
A resposta é: o Senhor não é o Deus das obras inacabadas. Se Ele
começou a edificar, chegará ao fim, ainda que tenha de remover montanhas
e convulsionar os mares, produzir terremotos e ativar vulcões. Aos que
têm fé, cumpre acompanhar o fenômeno, favorecê-lo quanto lhe for
possível, e sobretudo esperar com toda certeza a vitória final de Deus.
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