Ricardinho
está em risco de vida. Pode morrer se não receber atendimento médico
adequado, informa a grande manchete de um matutino paulista.
Lendo esses dizeres, pensei que se tratasse talvez de algum jogador
de futebol, em campeonato internacional, talvez na Copa. Mas não: é um
dos cães da linhagem desenvolvida por um em si benemérito instituto de
pesquisas médicas.
“O beagle Ricardinho, de sete anos, um dos patriarcas da
linhagem de cães desenvolvida pelo Instituto Royal, pode morrer se não
receber atendimento médico adequado, afirmam os cientistas da entidade. O
animal tem insuficiência renal e descalcificação óssea decorrente da
doença. Além disso, tem uma prótese no maxilar – o que deixa seus dentes
caninos superiores colados aos inferiores”.1
Coitado! Psicologicamente, ouve-se de todas partes a sirene ou o quo-quo-quo das ambulâncias!
Na verdade, este cão é um serviçal do homem e merece por isso certa
quota de interesse, pois faz parte de um Instituto de Pesquisa Médica.
Nada contra que se tenha cuidado com ele, desde que não seja pelos
motivos que abaixo constam. Reconheço que ele não é um vira-lata
qualquer. Mas é um cachorro.
“Os animais não existem para eles mesmos mas para servir”, já reconhecia o grego Epicteto. Isto eleva seu nível como criatura de Deus. João Pereira Coutinho narra na Folha de S.Paulo2 que o filósofo Roger Scruton escreveu um livro a respeito 3, que ajuda a explicar o tratamento dos cães como humanos, e a defender esta conduta. “O fenômeno explica-se com o declínio da religião
nas sociedades ocidentais: quando os homens acreditavam que eram os
seres superiores da criação, ninguém pensava nos ‘direitos’ ou nas
‘sensibilidades’ dos bichos. Nós, e apenas nós, tínhamos sido criados à imagem e semelhança do Pai. Não havia como confundir um ser humano com um batráquio.”
A que absurdos chegaremos com o declínio da religião? E a coerência como fica?
Desafio um fanático dos direitos dos animais dizer se concorda ou
discorda do seguinte silogismo formal: – Todo animal, dizem os
ecologistas, tem direitos; – Ora, os insetos são animais – Portanto, não
se pode matar mosquitos, baratas, pulgas etc, porque eles têm direito à
vida. Se discorda, onde fica sua coerência? Se concordar., como ficam
os princípios – se é que os têm – da proteção aos animais? Ou os insetos
não são animais? Seriam vegetais ou minerais? Tudo se pode provar a
partir de uma premissa errada.
Ó caro ecologista, se na tua casa tem baratas, não vou lá!
Eis o que em filosofia se chama redução ao absurdo.
Recentemente, a Anvisa decidiu analisar a legislação que trata do uso
de cobaias, e a Câmara dos Deputados acelerou a votação de um projeto
de lei que tipifica como crime todos os atos contra a vida, saúde ou
integridade mental (sic) e física de cães e gatos…
Voltemos a Ricardinho. É claro que é melhor que sobreviva, mas
colocamos este desejo em sua adequada hierarquia. E se morrer, será uma
pena para a pesquisa mas enterre-se sem mais.
Convém esclarecer a esta altura: nada temos contra que o leitor ou a
leitora alimentem em sua residência um fiel Totó ou uma graciosa Mimi. É
apenas uma questão de bom senso, e repúdio ao igualitarismo. Pois é o
igualitarismo que quer estabelecer a igualdade entre os homens e os
animais.
Tudo o que á exagerado é insignificante, dizia um pensador francês. É
o caso dos “direitos” dos animais. Apenas uma observação: falar em direitos não é um exagero, é um absurdo.
Atualmente, é possível encontrar no varejo variedades como
panetones, mufins e até sorvete para cães e gatos, com sabores de
morango, chocolate e bacon. O objetivo, segundo os responsáveis
pelas inovações, é o de gerar espanto para, em seguida, arregimentar o
interesse do consumidor — além de garantir espaço na concorrida gôndola
dos petshops. Nessa mesma linha de negócios,[...] se inaugura no bairro
do Tatuapé uma padaria para cães e gatos, a Gold Gourmet Pet.4
Nunca a simpática categoria dos gourmets foi tão rebaixada! Até onde chegarão seus patronos? Até onde chegará a falta de bom senso?
A essa altura alguém poderá perguntar-me: porque dar tanta
importância a cachorros e insetos? Não seria melhor destinar este espaço
para os grandes problemas do mundo e do Brasil?
Essa questão dos animais nada mais é que um capítulo de um problema
chave: a Revolução das tendências, como a descreve Dr. Plinio em sua
nunca por demais citada obra “Revolução e Contra Revolução”. Ele ensina
que a Revolução tem três profundidades: as tendências, as ideias e os
fatos. E a Revolução tendencial visa “modificar as mentalidades, os modos de ser e os costumes”,
preparando o igualitarismo que existe, por exemplo, em tender a igualar
no trato os animais e os homens. Um dos absurdos de nossa época!
____________
1 – FSP, 25/10/2013.
1 – FSP, 25/10/2013.
2 – FSP, 22/10/2013..
3 – Animal Rights and Wrongs, editora Continuum, 224 págs.
4 – O Estado de S. Paulo, 10 de junho de 2014.
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