IHU - Nos dias mais tensos do Sínodo dos Bispos que conclui seus
trabalhos no dia 18 de outubro, houve um bilhete que mudou decisivamente
o sentido e, provavelmente, o resultado da discussão. Um bilhete que
permaneceu reservado. Uma mensagem breve, mas fundamental.
A reportagem é de Claudio Tito, publicada pelo jornal La Repubblica, 19-10-2014. A tradução é da IHU On-Line.
O bilhete foi expedido do mosteiro Mater Ecclesiae e chegou até Santa Marta.
Dois lugares que na Santa Sé dos últimos dois anos têm um valor
particular: são, respectivamente, as residências do Papa emérito Joseph Ratzinger e a do Pontífice que governa, Jorge Maria Bergoglio.
O bilhete tem um valor particular porque no debate que se deu entre os 191 padres sinodais, houve um protagonista inesperado: Bento XVI.
Ratzinger não participou dos trabalhos das comissões
e dos encontros convocados por seu sucessor. Mas não esteve ausente.
Colocou-se claramente ao lado de Francisco. “Não
somente na oração – explicam nos corredores do Vaticano – mas também com
a sua figura e estatura de Papa emérito e de maior teólogo vivo”.
Nestes dias, provavelmente, se deu um dos debates mais duros desde o Concílio Vaticano II.
Os temas da família estiveram no centro de um confronto sem
precedentes. A abertura às famílias não tradicionais e aos direitos dos
homossexuais ocasionaram uma discussão acirrada.
Ela começou com o discurso de caráter aberto do cardeal alemão Kasper (também participou o arcebispo de Chieti, Bruno Forte)
no último Consistório que constituiu a base do confronto no Sínodo.
Depois continuou com o documento “tradicionalista” assinado por cinco
cardeais: Müller (prefeito do ex-Santo Ofício), Burke (prefeito da Assinatura Apostólica), Cafarra (arcebispo de Bolonha), Brandmüller e De Paolis. E apoiado substancialmente pelo arcebispo de Milão, Scola.
Portanto, o Sínodo foi precedido e caracterizado pelo
confronto-desencontro que continuou também nas duas semanas do Sínodo. E
entre a fase preparatória e a concreta do evento, o papel de Bento XVI
cresceu de maneira exponencial. Mais. A tensão em alguns momentos
atingiu picos elevadíssimos, criando alarme e preocupação nos
episcopados.
Mas talvez o momento mais crítico ficou até agora esquecido. Foi
quando alguns dos cardeais conservadores que leram e comentaram com
surpresa as teses de Kasper procuraram o Papa emérito no mosteiro Mater Ecclesiae, interrompendo o estilo reservado que Ratzinger se impôs desde o momento da sua renúncia.
Naquele encontro os seus interlocutores tentaram uma operação sem
precedentes: procuraram sensibilizá-lo sobre as teses que seriam
debatidas no Sínodo. Uma operação potencialmente capaz de rachar
verticalmente a Igreja. Seria a organização, de fato, de uma oposição
interna contra o Pontífice. E não em termos do ‘poder real’ ou por
nomeações. Mas no terreno da doutrina.
Mas a resposta de Bento XVI foi clara: “Eu não sou o
Papa. Não me procurem”. Mais. Um pouco antes – como aconteceu várias
vezes nestes dois anos – o Pontífice enviou, reservadamente, um bilhete
para Francisco. O conteúdo é ignorado, mas sabe-se que se trata de uma informação colaborativa.
Mesmo quando a polêmica se tornou mais acesa, quando a ala mais
conservadora do episcopado não fez nada para esconder as suas
perplexidades e as suas críticas a respeito do documento publicado pelo
cardeal Kasper, o Papa emérito se empenhou para evitar fraturas ou correntes. “Cum Petro e sub Petro”, é a síntese que Ratzinger
faz da sua presença no Vaticano. “E quando fala – dizem os observadores
mais atentos da Santa Sé – é sempre para sustentar e apoiar a Francisco”.
Um modo para dizer que ninguém nunca poderá usar Bento contra Bergoglio. De resto, as relações entre o Papa emérito e o seu conterrâneo Kasper não foram interrompidas nestes meses. Como não se interrompeu o diálogo entre Bento XVI e Bruno Forte, arcebispo de Chieti.
Mesmo depois daquele encontro secreto, a componente mais conservadora
não renunciou em evidenciar observações e encontros durante os
trabalhos sinodais. O riscos de um racha evidente e manifesto foi uma
constante nestes dias.
O êxito quase inevitável foi a mediação final. Foi obra de uma constante correção dos textos iniciais. Basta olhar a chamada “Relatio post disceptationem” do cardeal húngaro Erdö,
relator do Sínodo, e os dois documentos finais que foram aprovados.
Ambos, nos seus conteúdos, dão um passo para trás do ponto de vista
dogmático, mas não no campo pastoral. Trata-se de um modo de agir que
evita rachas e divisões.
Isto apesar de que o final, ou seja, as decisões não são o objetivo
do Sínodo 2014, mas do Sínodo 2015. Talvez, no entanto, o resultado
conseguido pelo Pontífice, desta vez, foi, sobretudo, não expor a Igreja
a uma divisão. Sobretudo depois dos esforços de unidade realizados após
os escândalos dos últimos anos.

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