[unisinos]
"Quando as pessoas se preocupam com o futuro da Igreja, muitas vezes
essas preocupações estão relacionadas com as coisas tangíveis: os
edifícios, as escolas, os cheiros e os sinos da liturgia. E a Igreja, de
fato, inclui essas coisas. Mas é muito fácil esquecer que a Igreja
também existe em cada um de nós".
A opinião é de Kerry Weber, editora executiva da revista America, dos jesuítas dos EUA, autora do livro "Mercy in the City". O texto foi publicado por The Huffington Post, 07-05-2015. A tradução é de Claudia Sbardelotto.
Eis o texto.
Não interessa se ele está vestindo um poncho, falando para o
Congresso ou admitindo que é um pouco ludita, parece que não passa um
dia sem que o Papa Francisco seja notícia. E não são
apenas os católicos que parecem estar ligados em cada palavra do Santo
Padre. Pessoas de todas as origens respeitam a preocupação do papa pelos
pobres, sua sinceridade, sua alegria. Nós nunca sabemos a próxima coisa
que o que o Papa Francisco vai fazer. E isso é exatamente o que é tão emocionante.
Francisco lembra-nos em ser abertos ao Deus das
surpresas. E ele usa continuamente a atenção que lhe é dada para levar
seus seguidores de volta a Cristo. Eu já ouvi histórias de muitos jovens
católicos, que antes se sentiam alienados, agora reconsiderando a
relação com a Igreja, graças ao exemplo de Francisco. Mas, embora Francisco
possa tornar a Igreja mais convidativa, ele não é razão suficiente para
fazer as pessoas permanecerem nela. Felizmente, há muitas boas razões
se ter esperanças sobre o futuro da Igreja Católica, e muitas razões
para que os jovens católicos permaneçam por aqui, mesmo depois que
passar o frenesi sobre Francisco. Aqui estão apenas algumas:
Crescente ênfase sobre a natureza global da Igreja.
Graças às maravilhas da Internet, é mais fácil do que nunca para os
jovens se conectarem com pessoas ao redor do mundo, e queremos que a
nossa Igreja reflita essa diversidade. Os 20 novos cardeais nomeados
pelo Papa Francisco representam 18 países diferentes. O
grupo é diversificado tanto geográfica quanto ideologicamente, o que
esperamos possa ajudar a aumentar a conscientização sobre a grande
variedade de desafios enfrentados pelos católicos em diferentes regiões
do globo. Algumas vozes globais já estão ganhando proeminência: bispos
africanos têm manifestado preocupação com temas que vão da pobreza à poligamia ao Boko Haram. E o cardeal Luis Tagle, das Filipinas, chamou atenção recentemente sobre as dificuldades enfrentadas por muitos trabalhadores nas Filipinas.
Parcerias mais fortes entre leigos e ordens religiosas.
Muitas ordens religiosas estão formalmente colaborando com leigos e
leigas, em um esforço para aumentar a consciência dos seus carismas. A
organização "The Jesuit Collaborative", em parte, promove programas de liderança e retiros para jovens que querem enriquecer-se com a espiritualidade inaciana. As Irmãs da Misericórdia estabeleceram o ramo chamado "Mercy Associates"
[Associados da Misericórdia], a qual faço parte. Isso significa que eu
me comprometi a tentar viver os valores de seu ministério, oração e
espiritualidade em minha própria vida de leiga. As Irmãs da Misericórdia
trabalham em estreita colaboração com os Associados, e nos veem como
parceiros na sua missão e ministério. Como muitos jovens continuam a
procurar experiências significativas de vida em comunidade, essas
parcerias podem oferecer uma constante conexão para uma comunidade de
fé, mesmo quando nos mudamos de um lugar para outro, ajudando-nos a
incorporar essa espiritualidade em nossas vidas cotidianas. Além disso,
eu conheço pessoas interessadas na construção de novas comunidades
religiosas em torno da ideia de votos temporários, onde os membros se
comprometem a alguns dos tradicionais votos (pobreza, castidade e
obediência) dentro do contexto de uma comunidade, por um tempo limitado,
em vez de uma vida.
Maior apoio para as mulheres em papéis de liderança da Igreja. Desde o Concílio Vaticano II,
as mulheres têm atuado em um número sem precedentes de cargos de
liderança na Igreja. Elas lideram paróquias, escolas, hospitais e
agências de serviços sociais. Um grande número de mulheres são ministras
leigas, profissionais e teólogas, e algumas ensinam em seminários
católicos. O Papa Francisco está entre aqueles que pedem um papel maior para as mulheres, especialmente em locais de autoridade na Igreja. No entanto, a este respeito, pouco progresso tem sido feito, e o próprio Francisco
usa frequentemente uma terminologia desanimadora quando fala das
mulheres. E embora alguns católicos esperam por uma discussão mais
aprofundada sobre a ordenação de mulheres ao sacerdócio, Francisco
disse que a ordenação de mulheres "não é uma questão aberta à
discussão". No entanto, muitos católicos - homens e mulheres - sugeriram
uma série de maneiras criativas de forma que as mulheres católicas
possam ocupar posições de poder na Igreja, como à frente de uma
congregação ou concílio na Cúria Romana, servindo no corpo diplomático
da Santa Sé, ou como cardeal, diaconisa ou pregadora
leiga. Os jovens católicos acostumados a ver mulheres bem sucedidas no
trabalho terão também a chance de vê-las tornarem-se líderes no ambiente
da fé.
Maiores esforços para ouvir. Os jovens católicos
querem ser ouvidos; e eles têm ideias que vale a pena ouvir. Várias
dioceses fizeram esforços deliberados para coletar as opiniões dos
católicos em nível paroquial antes do Sínodo sobre a Família. Espero que
os líderes da Igreja ouçam a dor daqueles que se sentem alienados e
também os motivos que, por vezes, causaram essa dor. Eu estou
esperançosa de que nossa Igreja está se movendo na direção a uma maior
responsabilização pela tragédia do abuso sexual por parte do clero.
Espero que os líderes da Igreja encorajem, de forma intencional, as
pessoas a serem mais autênticas. O futuro da nossa fé depende da nossa
capacidade de sermos verdadeiramente presentes um ao outro agora.
Um chamado contínuo a amar. Muitos jovens encontram esperança no Papa Francisco,
porque ele constantemente nos lembra aquilo que Cristo nos lembrou:
Amar-nos uns aos outros. Quando as pessoas se preocupam com o futuro da
Igreja, muitas vezes essas preocupações estão relacionadas com as coisas
tangíveis, os edifícios, as escolas, os cheiros e os sinos da liturgia.
E a Igreja, de fato, inclui essas coisas. Mas é muito fácil esquecer
que a Igreja também existe em cada um de nós. Ela existe nos pais
juntando os seus filhos para ir à missa. Ela existe no jovem que duvida
de Deus. Ela existe no homem ajoelhado diante da Eucaristia. Ela existe
nos voluntários que servem comida e conhecem os convidados pelo nome em
sua cozinha comunitária. Ela existe entre os ativistas contra a pena de
morte, nas pessoas em macacões laranja fora da Casa Branca protestando contra a prisão na Baía de Guantánamo.
Ela existe nos avós que rezam terços para os seus netos, e nos netos
correndo em círculos em torno de seus avós. A Igreja existe naqueles que
a deixaram, naqueles que estão com raiva ou tristes por causa dos
pecados da Igreja. Ela existe no perdão dos sobreviventes do genocídio,
pessoas que conheci em Ruanda, e nos homens que conheci quando trabalhei na Prisão de San Quentin.
Ela existe entre as pessoas de todas as classes, raças e identidades
sexuais. Ela não conhece fronteiras políticas ou pastorais. A Igreja vai
para as periferias. Está nas periferias. E está no centro de tudo que
fazemos.
A Igreja é imperfeita. Eu sou apaixonada pela
Igreja, por isso sempre há a possibilidade de ela partir meu coração. E
ela já fez isso com alguma frequência. Mas a minha vulnerabilidade, essa
fragilidade, muitas vezes permite um ponto de entrada para o Espírito
Santo. Embora pesquisa após pesquisa mostre que muitos jovens estão
optando por deixar para trás essa coisa toda de religião, eu descobri
que a melhor maneira para lidar com minhas frustrações com a Igreja é
aprofundar a minha fé. E então, mais e mais, encontro um sinal de
esperança, o Espírito que trabalha, fora de vista, mesmo quando a Igreja
ou o mundo parece estagnado e imutável. Para muitos jovens, de fato, as
lições que aprendemos com a Igreja Católica fundamentaram o nosso
desejo de trabalhar contra as injustiças dentro dela. Eu me importo com
essa bela, controversa, hierárquica, histórica, falha, inspirada,
abençoada e dolorosamente lenta instituição. Eu não sei o que o futuro
reserva para a Igreja. Mas perseverar na incerteza, com esperança, é
exatamente o que significa ter fé.
A Igreja é guiada pelo Espírito. Assim, onde quer
que a Igreja vá, eu vou com ela. E eu estou aqui por opção. Eu estou
aqui porque acredito, e porque todos os dias tenho de enfrentar minha
incredulidade. Eu nem sempre concordo com tudo o que meus líderes da
Igreja dizem. Mas eu confio que Deus quer transformar seus corações ou o
meu. Provavelmente ambos. Esperemos que em breve. Nesse meio tempo,
tudo o que podemos fazer é continuar a trabalhar conjuntamente para
tentar construir o Reino de Deus, mesmo que não consigamos dizer
completamente como ele vai parecer. Porque acreditamos que o Espírito
Santo vai continuar a guiar a Igreja em direção ao que é verdadeiro, bom
e belo. Nós nunca sabemos o que o Espírito Santo vai fazer a seguir. E
isso é exatamente o que é tão emocionante.
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