A Igreja é uma unidade de princípios alimentados por uma unidade na verdade.
Brasilia,
(ZENIT.org)
José Barbosa de Miranda
Iniciamos, no artigo anterior, uma
série de reflexões sobre a Igreja e seu mistério. Nele apresentamos uma
síntese das propriedades essenciais da Igreja. Neste artigo veremos a
sua primeira propriedade: A IGREJA É UNA. Apresentaremos seus
fundamentos bíblicos e uma pequena reflexão teológica da unidade.
UMA REFLEXÃO TEOLÓGICA
A Mysterium Salutis faz uma síntese dessa reflexão, a partir
da escatologia, que é o sentido da Igreja como fundamento de sua missão
cristológica. Esta síntese é, na verdade, o resumo da definição da
Igreja: “A Igreja só pode ser retamente compreendida a partir da
escatologia, isto é, começando pelo ponto a que deve chegar ao
realizar-se em total perfeição. O estado da perfeição da Igreja é-nos
conhecido graças à Escritura: ‘Eis aqui a mansão de Deus com os homens’ –
trata-se de uma cidade santa, a nova Jerusalém, formosa como uma jovem
desposada ornada para seu esposo. – Ele terá sua mansão com eles; eles
serão seu povo, e ele, Deus com eles, será seu Deus’ (Ap 21,2-3). Neste
texto está reunida a maior parte das imagens ou das noções de se serve a
revelação para apresentar a Igreja: mansão (que compreende as idéias de edificação e de templo santo), cidade, Jerusalém, esposa, povo de Deus. A estas seria necessário acrescentar as da vinha ou plantação de Deus, família, rebanho e, sobretudo a do Corpo (de Cristo). Convém anotar que nestas diversas expressões e no seu uso bíblico o que se salienta principalmente
é Deus, termo soberano de referência cuja unidade e unicidade se
comunica à casa ou templo que habita, à cidade da qual é o príncipe e o
princípio, à esposa da qual é o esposo e ao povo que ele chama à
existência e se consagra para si criando desta forma sua unidade. Em
última análise, a Igreja é una e única porque Deus é uno e único em si
mesmo”[1].
Como criação divina, a Igreja é a morada de Deus que reúne seu povo,
ou seja, um único e indiviso templo. A Igreja respeita e guarda a
vontade do Pai trabalhando incessantemente para realizar a vontade do
seu fundador: “Que todos sejam um. Como tu, Pai, estás em mim e eu em ti”[2]. Desde
seu início, seguindo a tradição apostólica, a Igreja se mantem nas
formas de unidade na fé, na vida social, no culto e nos sacramentos[3].
UNIDADE NA FÉ
Os Padres escolásticos definem a Igreja como uma congregatio fidelium (reunião na mesma fé). Reunião ou corpo, designando
uma multidão de pessoas dotadas de inteligência, congregadas pelo mesmo
princípio de vida comum a todos para compor uma unidade de princípios e
alimentados por uma unidade na verdade. A fé é uma realidade sobre a
qual se realiza a aliança entre Deus e nós, um intercâmbio de fidelidade
entre esponsais que se entrelaçam, rompendo infidelidades para reatar
alianças duradouras, quebrando fantasias efêmeras: “Pois eu serei
como o orvalho para Israel, ele florescerá como o lírio, lançará suas
raízes como o cedro do Líbano, seus galhos se espalharão, seu esplendor
será como o da oliveira e seu perfume como o do Líbano”[4]. A
fé é fundamental e essencial para a unidade, é o primeiro princípio de
comunhão entre pessoas, por isso a fé é o princípio externo da unidade. A
fé caracteriza a universalidade na missão ouvida e vivida no mandato de
Cristo[5].
NA VIDA SOCIAL
O Corpo eclesial compõe-se de uma comunidade interligada pelo amor,
mesmo objetivo, uma única vontade. A ideia do bem comum constrói o que
denominamos de convergência da mesma fé que vive no mesmo princípio e na
vontade do seu Chefe. Esse princípio é uma proposição a todos os
membros que, formados pelo mesmo desejo e de livre vontade, se dispõem a
seguir os fundamentos essenciais da Igreja, a exemplo do Deus vivo e
tripessoal. O Deus que é Pai, que é Espírito, que é Filho – vida social –
opera em nós o querer e o fazer, difundindo em nossos corações o amor e
distribui para cada um os diversos dons para utilidade e construção de
todo o corpo eclesial. Nesta vida social predomina a diakonia, serviço, ou especificamente ministérios, como São Paulo os enumera[6].
Nesta unidade de caráter social predomina a caridade-comunhão ou
comunicação do amor, o mesmo bem absoluto que abarca a anima todos
aqueles que estão animados pela unidade vital de todo o corpo. Na medida
em que o amor é comunicado pelo mesmo Espírito Santo e pelo próprio
Cristo, a unidade pelo objeto vê-se reforçado pela unidade do sujeito,
desta forma, entre os membros do Corpo de Cristo realiza-se uma
comunidade de vida semelhante a que existe no corpo humano, formando o corpo místico. Assim,
no corpo social da Igreja, existe uma verdadeira comunicação, cada um
atuando com o outro e dentro dos seus limites hierárquicos. É a sintonia
de funções harmônicas compondo o templo eclesial.
UNIDADE NO CULTO
Todo o culto está voltado para a unidade que se expressa a mesma fé.
Nele está a manifestação de um corpo unido por gestos, símbolos e
expressões comunitárias forjadas na mesma consciência e sensibilidade,
alimentando a comunhão de um único Corpo. A liturgia espelha essa
unidade pelos sacramentos. Essa unidade opera uma integração no mesmo
Corpo. A Tradição viu e fazemos memória, de forma uníssona, da água e
do sangue que saíram do lado de Cristo traspassado pela lança, a forma
sacramental que prolongamos na celebração cultual, pelos sacramentos. O
que sobressai nessa unidade de culto é a Eucaristia. A tradição sustenta
que a Eucaristia é o sacramento da unidade e seu efeito espiritual é a
unidade do corpo místico. O simbolismo dos sacramentos corresponde aos
efeitos gratuitos que são dispensados, a sua eficácia. Na Eucaristia o
sinal consiste numa comida, numa nutrição. Pela conversão do pão em
Corpo, do vinho em Sangue, a comida e a bebida é o próprio Verbo de
Deus, alimento celestial. Somos incorporados numa comunhão
divinizadora, pois na Eucaristia o cristão fica ligado a Cristo e à sua
paixão em função da sua eficácia, por isso o culto expressa a mesma
confirmando a Igreja Una.
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