[unisinos]
Quando o Papa Francisco
emitiu um decreto em janeiro que afirmava que o rito de lava-pés da
Quinta-Feira Santa não mais deveria se limitar a homens, ele desencadeou
um debate generalizado e levou a um esclarecimento por parte da
principal autoridade vaticana para a liturgia, segundo o qual a inclusão
das mulheres no ritual é uma opção e não uma obrigação.
A reportagem é de Nirmala Carvalho, publicada por Crux, 30-03-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Nas 22 igrejas orientais em comunhão com Roma,
no entanto, o debate tomou um rumo ligeiramente diferente, focando-se,
em primeiro lugar, sobre a questão de se o édito papal se aplica também a
elas.
Em entrevista ao Crux, o Pe. Paul Thelakat, editor da revista Light of Truth e ex-porta-voz da Igreja Católica Siro-Malabar, na Índia,
observou que “o papa fez uma alteração no ritual da Igreja Latina. Mas
até onde diz respeito aos católicos orientais, as mudanças rituais não
são feitas pelo papa, mas pelo Sínodo dos Bispos da igreja particular.
Thelakat afirmou que esta é a posição das duas igrejas orientais na Índia, incluindo a sua própria e a Igreja Católica Siro-Malancar.
Um outro sacerdote indiano, membro dos Franciscanos Capuchinhos chamado Pe. Nithiya Sagayam, acredita que as igrejas deveriam seguir o que diz o Papa Francisco.
“A intenção da mudança proposta na cerimônia de lava-pés
é remontar à mente e ao coração de Jesus, quer dizer, tornar-se um
servo”, disse ele. “A Igreja tem de reviver-se para se tornar cada vez
mais significativa no seguimento de Jesus. Quando convém, estamos
prontos a alterar qualquer coisa. Mas quando a mudança toca as nossas
vidas no sentido da conversão, daí encontramos uma série de filosofias
para escapar”.
O Cardeal Mar Baselios Cleemis,
líder da Igreja Católica Siro-Malancar, reeleito no começo deste mês
como presidente da Conferência dos Bispos Católicos da Índia – CBCI,
declarou que, para o rito da Quinta-Feira Santa deste ano, a sua igreja
manteve-se junto à tradição oriental, incluindo apenas homens.
Cleemis disse que iriam
ser consultadas outras igrejas orientais antes de se tomar uma decisão
sobre a alteração sugerida pelo Vaticano, acrescentando que o papa
apenas sugeriu a inclusão de mulheres no rito e que isso não equivalia a
um decreto.
Em Kerala, o Cardeal George Alencherry, representante da Igreja Católica Siro-Malabar, lavou somente os pés de homens na Quinta-Feira Santa.
Sagayam, enviado pelo Papa Francisco
como um “Missionário da Misericórdia” durante este Ano Jubilar
especial, afirma que atitudes de domínio masculino e desigualdade de
gênero permanecem presentes nas estruturas da Igreja indiana.
Sagayam, que atuou nas comissões de Justiça e Paz nas conferências episcopais da Índia e da Ásia,
também aponta para o que considera uma “discriminação com base em
castas” presente no clero e nas congregações religiosas masculinas e
femininas, tais como a eleição dos Superiores Gerais com “votos de
casta”.
“A Igreja, conhecida por sua postura
radical contra as estruturas injustas, não tem se mostrado forte o
bastante quando se trata de males sociais, tanto dentro quanto fora da
Igreja”, disse Sagayam.
“Nós devemos conhecer a história do dom
concedido àqueles cujos pés foram lavados e beijados”, continuou,
citando a tradição de um bispo que lavava, secava e beijava os pés de
“Treze” empobrecidos após tê-los vestido, alimentado e lhes dado uma
doação de caridade, dizendo que o ritual carrega com isso a ideia de
aliviar os pobres, abandonados e oprimidos.
“Foi uma vergonha para nós, líderes eclesiásticos, bloquear o santo espírito”, declarou Sagayam, referindo-se à não inclusão de mulheres
na cerimônia este ano. Ele observou que o governo indiano tomou
recentemente medidas para aumentar a representatividade feminina nas
estruturas de poder, mas que, até agora, passos semelhantes não foram
dados pela Igreja.
“Se o governo pode fazer isso, o que
mais precisa para a Igreja Católica assumir uma postura contracultural
que decorre da justiça bíblica?”, perguntou-se.
“Essa tradição profética parece estar em
falta na vida cristã indiana hoje”, segundo ele, “já que há uma maior
tentação para se administrar instituições de prestígio do que para
absorver o espírito dos evangelhos, que dá a Boa Nova aos pobres e
oprimidos”.
“Os pobres estão nas nossas áreas rurais, buscando por uma resposta aos seus clamores”, disse. “A Madre Teresa de Calcutá, que em breve será santificada, e muitos outros não falaram de uma acomodação cultural, mas criaram uma contracultura”.

Nenhum comentário:
Postar um comentário
Só será aceito comentário que esteja de acordo com o artigo publicado.