O diabo não está em todos os lugares, mas… não o desafiem!
Por Chiara Santomiero
Entrevista exclusiva com o padre exorcista César Truqui

É preciso confessar: exorcismo e possessão diabólica, no geral,
despertam em nossa mentalidade uma reação entre fascínio e aberta
descrença. Coisa de filme, pensamos. Mas a prática de exorcismo é
regulada pela Igreja com o ritual De exorcismis et supplicationibus quibusdam,
adotado em 1998 em substituição do anterior (que também pode continuar
sendo usado). Suas bases são a Sagrada Escritura e a teologia. É um
assunto delicado, que precisa ser tratado com prudência por sacerdotes
preparados e equilibrados (“ornados de piedade, ciência, prudência e
integridade de vida”), expressamente autorizados pelo seu bispo.
Aleteia conversou com o pe. César Truqui, mexicano, hoje exorcista na
diocese de Chur, na Suíça. Ele foi a Roma como palestrante no XI Curso
“Exorcismo e Oração de Libertação”, do Ateneu Pontifício Regina
Apostolorum em parceria com o Grupo de Estudos e Informação
Sócio-Religiosa de Bolonha e com a Associação Internacional de
Exorcistas.
Confira a entrevista.
Aleteia: Que tipo de mal é enfrentado num exorcismo?
Pe. Truqui: Um mal personificado. Paulo VI falou da
“fumaça de Satanás”. Não é a simples “privatio bonis”, privação de um
bem, descrita pela filosofia, mas um mal eficaz, operante. Falamos da
presença de um ente mau. O que é esse ente mau só a fé pode dizer, não a
ciência. A fé nos fala da existência de seres espirituais: os bons são
os anjos, os maus são os demônios.
O mal, entendido como uma entidade que se apossa fisicamente de alguém, é um pouco difícil para as pessoas aceitarem, não?
Pe. Truqui: Sim, é verdade, porque normalmente, na
vida, não se tem esse tipo de experiência. Pelo ministério que eu exerço
há tantos anos, tive a oportunidade de estar com essas pessoas e, para
mim, é mais fácil acreditar que certos fenômenos existem.
Como o senhor começou?
Pe. Truqui: Foi coisa da Providência. Quando eu fui
ordenado sacerdote, 12 anos atrás, participei de um curso com sacerdotes
exorcistas como o pe. Bamonte e o pe. Amorth. É aconteceu que um senhor
francês de 40 anos foi possuído por Satanás e precisava do exorcista,
mas o pe. Bamonte não falava inglês nem francês. Então eles me pediram
para ajudá-los no diálogo preliminar.
Quais são as sensações que o senhor experimenta diante da manifestação do mal?
Pe. Truqui: São sensações que mudam com o tempo. Nas
primeiras sessões de exorcismo em que eu participei, a impressão mais
forte foi a confirmação tangível de que o Evangelho que eu tinha lido e
meditado era verdadeiro. No Evangelho, Jesus luta contra o diabo que se
apresenta com diversos nomes: “meu nome é Legião, meu nome é Satanás”.
No Antigo Testamento, no livro de Tobias, há um demônio chamado Asmodeu.
Esses nomes eu já ouvi de demônios em várias sessões de exorcismo. No
nível espiritual, tem sido uma experiência muito rica porque me permitiu
experimentar na carne, através dos sentidos, a realidade de que Jesus
falou.
E no nível tangível?
Pe. Truqui: No caso do homem francês, eu me lembro
que, durante a manifestação do diabo, eu tinha a impressão de estar
envolto pela soberba, como se fosse fumaça ou neblina. É difícil de
explicar, mas a soberba parecia algo que podia ser tocado; ela enchia a
sala. O exorcista perguntou o nome dele e ele respondeu: “Sou rex”. Não
existe um demônio chamado “rex”, rei. O exorcista insistiu: “Diga o seu
nome”. E ele finalmente respondeu: “Eu sou Satanás, o príncipe deste
mundo”.
Por que se pergunta o nome?
Pe. Truqui: O ritual exige isso por um objetivo
preciso. Dar o nome a uma coisa ou saber o nome significa ter poder
sobre essa coisa. Deus deu a Adão o poder de dar nome às coisas. No
momento em que o diabo revela o seu nome, ele mostra que está
enfraquecido. Se não diz, ele ainda está forte.
Há sinais típicos da possessão?
Pe. Truqui: Os previstos pelo ritual. São quatro: a
aversão ao sagrado, falar línguas desconhecidas ou mortas; ter uma força
extraordinária que vai além da natureza da pessoa; e o conhecimento de
coisas ocultas, escondidas.
As pessoas podem, elas mesmas, se colocar em condições de perigo?
Pe. Truqui: Sim. Aproximando-se de tudo o que tem a ver
com magia, ocultismo, bruxaria, cartomancia. Se para nos tornarmos
santos é preciso ir à missa, rezar, se confessar, se aproximar de Deus,
do mesmo jeito as missas negras, os ritos satânicos, os filmes e músicas
desse tipo têm o efeito de aproximar do diabo. Eu tive o caso de uma
mulher que tinha começado a ler as cartas, como fazem muitos por
brincadeira. Só que ela adivinhava realmente o passado e o presente das
pessoas, e, em alguns casos, o futuro. E, naturalmente, ela fazia um
grande sucesso. Em certo ponto, ela compreendeu de quem dependia o seu
sucesso e parou, mas já era tarde demais: ela estava possuída.
Como é possível “encomendar trabalhos” voltados para o mal?
Pe. Truqui: Da mesma forma que eu posso contratar
alguém para matar uma pessoa, eu posso pedir que um demônio provoque um
dano. Mas atenção: a esmagadora maioria dos ritos realizados por quem se
diz bruxo é enganação, não tem qualquer efeito.
Basta um exorcismo para livrar a pessoa?
Pe. Truqui: É dificílimo. Normalmente, são necessários vários exorcismos.
Funciona como uma terapia?
Pe. Truqui: Sim. O exorcismo é um sacramental, não um
sacramento. O sacramento é eficaz em si mesmo. Se eu dou a alguém a
absolvição na confissão, naquele momento, verdadeiramente, os pecados
dessa pessoa são perdoados. Já o exorcismo é eficaz na medida da
santidade do sacerdote, da fé da pessoa para quem é realizado o
exorcismo e de toda a Igreja. Se hoje os exorcismos são menos eficazes, é
porque toda a Igreja está mais fraca.
Qual é a diferença entre exorcismo e oração de libertação?
Pe. Truqui: Ambos têm o mesmo objetivo: a libertação da
pessoa da influência do mal ou da possessão. O exorcismo em sentido
próprio é um ministério dentro da Igreja, conferido pelo bispo a alguns
sacerdotes. Só pode ser exercido por sacerdotes, não por leigos, e só
pelos que têm uma permissão explícita do bispo. Já a oração de
libertação pode ser feita por qualquer pessoa, homem ou mulher, leigo ou
sacerdote, em virtude do nosso cristianismo, porque Jesus disse: “Quem
crê em mim expulsará os demônios”. O exorcismo, além disso, é um comando
direto ao demônio, enquanto a oração de libertação é uma súplica a Deus
ou à Virgem Santíssima, para que ela intervenha.
Quantas pessoas que procuraram o senhor estavam realmente possuídas?
Pe. Truqui: Pouquíssimas.
E por que elas acham que estão possuídas?
Pe. Truqui: Entre as pessoas que vêm até mim, eu
distingo três casos: o verdadeiro possuído, o não possuído e o caso
problemático. O primeiro e o último são os mais fáceis: você sabe que se
trata de um verdadeiro possuído porque ele manifesta os quatro sinais e
porque, quando você faz as orações, a pessoa entra em transe e reage de
um modo que o exorcista conhece. Poderia ser fingimento, mas é difícil.
No segundo caso, com a experiência de sacerdote e confessor, você
percebe quando há problemas espirituais ou psicológicos e pode descartar
a influência diabólica. O problema é quando você encontra alguém que
parece realmente possuído, mas não está, porque existem traumas
profundos acompanhados de comportamentos de risco, tais como participar
de sessões espíritas ou recorrer a cartomantes. Eu conheci uma moça que
foi estuprada por um homem que se dizia “mago latino-americano” e que
tinha se apaixonado por ela. Um dia ele deu a ela um café com alguma
droga e a violentou: ela estava consciente, mas não conseguia reagir.
Esse trauma enorme a fez pensar na possessão diabólica por meio da droga
ingerida e da violência sofrida. Eu pensei que ela estivesse mesmo
possuída. Mas quando orei e lhe impus as mãos durante o exorcismo, ela
nunca entrou em transe, nem havia traço de outros fenômenos. Então eu
percebi que a causa era outra. É por isso que, nos cursos para
exorcistas, abordamos quadros médicos e psiquiátricos que podem entrar
em jogo nessas situações.
As pessoas realmente possuídas, como elas vivem?
Pe. Truqui: Elas vivem de maneira comum. O diabo não
age continuamente nelas. Vou fazer uma comparação paradoxal para tentar
explicar: se uma pessoa compra um carro, aquele carro fica à disposição
dela, ela o usa quando quer. Acontece o mesmo com a pessoa possuída. Há
momentos em que o diabo age: ele entra no carro e dirige do jeito que
quer. E há outros momentos em que não. O carro tem um dono, mas o dono
não o usa o tempo todo.
Quando é preciso procurar um exorcista?
Pe. Truqui: Quando o que acontece com você escapa do
normal. Eu conheci uma senhora em Roma que era ateia, uma católica só
batizada, que não acreditava em nada. Ela foi possuída, não sei em que
circunstâncias. Começou a ouvir vozes continuamente, que a incitavam a
matar o marido e o filho e depois tirar a própria vida. Ela pensou que
estava louca e foi procurar um psiquiatra, mas ele se viu diante de uma
pessoa muito inteligente, coerente e com muita clareza de ideias. O
psiquiatra não pôde curá-la. Um dia, as traças tinham comido todas as
roupas daquela mulher, mas sem tocar nas do marido, que estavam no mesmo
armário, nem nas do filho. E não foi encontrada traça nenhuma na casa.
Algo inexplicável. Uma amiga aconselhou a mulher a procurar o padre
Amorth e ele descobriu que ela estava possuída. Mas ela não acreditava
nem nos anjos nem nos demônios. Agora ela é uma cristã praticante. Por
que Deus permite isso? Também para o bem das pessoas.
O senhor teve a oportunidade de perguntar a alguém quais foram as suas sensações durante o exorcismo?
Pe. Truqui: Eu perguntei àquele senhor francês, de quem
já falamos, o que ele tinha sentido durante o exorcismo e ele me disse
que sentia como se dentro dele houvesse um campo de batalha. De um lado,
ele sentia os demônios correrem desesperados e falarem entre si; por
outro, quando o padre rezava, ele sentia a luz de Deus que os varria
para fora, mas, em seguida, eles voltavam de novo.
Qual foi o caso que mais o impressionou?
Pe. Truqui: A experiência de um demônio mudo. Jesus
fala disso no Evangelho e diz que eles são os mais difíceis de expulsar e
que eles só saem com a oração e o jejum. É uma raridade um demônio
mudo. Em 12 anos de exorcismo, só me aconteceu uma vez.
O senhor nunca tem medo?
Pe. Truqui: No início, eu tinha. Depois você fica
habituado também a certas manifestações e não se surpreende mais ao
ouvir uma voz que muda: uma mulher que começa a falar com voz fina e de
repente passa para um tom cavernoso. É preciso ficar atento para não
cair na obsessão pelo maligno. O exorcista sabe que o diabo existe, mas
também que ele não está em todos os lugares. Eu entendi, acima de tudo,
que o exorcismo é um ministério de misericórdia: um ato de amor por uma
pessoa que sofre. Só isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário