(I) Cristo é plenamente Deus.
Há abundante relato bíblico afirmando a divindade de Cristo. Jesus é apresentado na Escritura como sendo preexistente (Jo 1.3; 1Co 15.47), qualidade logicamente restrita à Deidade. O Senhor também manifestou, mesmo em sua primeira vinda, todos os atributos chamados incomunicáveis, logicamente pertencentes somente a Deus (Jo 17.5; Hb 13.8; Mt 18.20; Jo 2.23; Jo 5.17; etc.)Há aqui um ponto relevante a ser sublinhado: alguns pensam que o fato de Cristo, em sua encarnação, ter se esvaziado e assumido a forma de servo (Fp 2.7) significa que Cristo abdicou de alguns de seus atributos divinos ou, mais grave ainda, abdicou de sua divindade, o que de maneira alguma poderia ser verdadeiro. Em primeiro lugar, a Bíblia relata várias ocasiões em que Jesus deu mostras de seus atributos incomunicáveis. Em segundo, a suposta renúncia de divindade, pela qual alguns incautos explicam a encarnação, seria ontologicamente impossível de ser realizada (como um ente pode deixar de ser o ente que é?), traria implicações gravíssimas à afirmação da imutabilidade de Deus (se Deus pode deixar de ser Deus, então ele pode mudar; e se pode mudar, então não pode ser Deus), e tornaria impossível a redenção do ser humano (só Deus pode redimir o ser humano; se Cristo deixou de ser Deus em sua encarnação, então ele não nos redimiu).
Do fato de Cristo ter, ele mesmo, perdoado pecados (Mt 9.2), aceitado adoração (Jo 13.13), exercido poder sobre demônios e realizado milagres e sinais (Jo 5.21), além de ter declarado explicitamente sua divindade (Jo 10.30), depreende-se também a realidade de sua natureza divina.
Por fim, conforme antecipamos, Cristo é visto como Deus pelo Cânon em virtude do fato de que somente Deus poderia redimir o homem. O ser humano não pode religar a si mesmo a Deus, pois teria que ser livre de pecado (obviamente, o homem não é), teria que cumprir a lei, toda ela, com perfeição (obviamente, nenhum homem pode ou poderia fazer isto), e teria que manifestar força sobre a vida, entregando-a em favor de muitos e tomando-a de volta na ressurreição (mais uma vez, é óbvio que o homem não tem tal capacidade). Assim, vemos claramente que Cristo sempre foi, é, e sempre será o Deus eterno, em quem não há variação ou sombra de mudança (Tg 1.17).
(II) Cristo é plenamente humano.
Tal como a Escritura declara nitidamente a divindade de Cristo, aponta também sua plena humanidade. Esta humanidade pode ser vista no fato de que Cristo chamava a si mesmo por nomes que designam humanidade (Lc 19.10), e foi assim chamado por seus apóstolos (1Tm 2.5).Como homem, Cristo esteve sujeito às limitações condizentes ao ser humano: sentiu fome, sede, se cansou, chorou etc. (Mt 4.2; Jo 19.28; 4.6; 11.35)
Cristo também possuía e possui uma natureza humana completa, isto é, ele não tinha (ou tem) apenas um corpo humano (Lc 2.52), mas também alma e espírito humanos (Mt 26.38; Lc 23.46). Em suma, Cristo, desde sua encarnação, é um ser humano completo. Em Cristo, Deus se fez homem e, novamente, se assim não fosse, não poderia redimir a humanidade. Quem recebeu a promessa de morte não foi o corpo de um ser humano, mas um homem completo, com sua constituição material e imaterial. Logo, somente alguém que possuísse uma natureza humana completa poderia sofrer a penalidade estipulada.
Como vemos, a afirmação correta da plena divindade de Cristo, bem como de sua plena humanidade, tem implicações soteriológicas fundamentais. Cristo é 100% Deus e 100% homem.
Entendemos, assim, alguns dos problemas levantados pela doutrina da união hipostática, as definições iniciais envolvidas nesta doutrina e os fundamentos escriturísticos que sustentam e asseveram a coexistência de duas naturezas na pessoa do Logos. Em posse desse instrumental teórico, portanto, somos agora capazes de esboçar os principais tópicos que estruturam e desenvolvem esta doutrina central do cristianismo.
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