Uma abertura a novos modos de pensar surgiu como o principal tema do Sínodo dos Bispos para a Amazônia
em seu primeiro dia de trabalho, com o Papa e os cardeais à frente do
evento, que durará três semanas, dizendo aos prelados participantes que
não resistam a novas ideias.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 07-10-2019. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Claramente enunciados entre estas novas ideias: a possibilidade de ordenar homens casados para enfrentar a falta de ministros católicos na região, que abrange nove países no total; e encontrar um novo jeito de a Igreja dar às mulheres da região amazônica uma espécie de trabalho ministerial oficial.
Na verdade, o Cardeal Cláudio Hummes, franciscano, arcebispo emérito de São Paulo, relator-geral do sínodo, sugeriu que estas duas possibilidades sejam consideradas uma de “seis temas nucleares” do encontro, que vai de 6 até o dia 27 deste mês.
Hummes, que proferiu um discurso de abertura de 50 minutos aos 185 prelados e 80 especialistas sem direito a voto participantes da assembleia, também se expressou de uma forma mais ampla. Ele disse que a Igreja global de 1.3 bilhão de membros não pode mais “ficar sentada em casa, cuidando de si mesma, cercada de muros de proteção”.
“Ela precisa abrir as portas, derrubar muros que a cercam e construir pontes, sair e pôr-se a caminho na história”, disse Hummes no salão sinodal, no Vaticano, ambiente decorado com imagens de mártires latino-americanos, entre estes o arcebispo salvadorenho Dom Oscar Romero.
Em aparente referência aos níveis sem precedentes de críticas que o sínodo deste ano tem recebido de uma minoria atuante de católicos conservadores, preocupados especialmente com a ideia de ordenação de padres casados para a região, o cardeal assim disse: “Esse caminhar (…) torna (a Igreja) fiel à verdadeira tradição”.
“Então, não tenhamos medo do novo. Não tenhamos medo de Cristo, o novo”, declarou o cardeal brasileiro. “Este sínodo procura novos caminhos”.
Outro tema que emergiu no primeiro dia do encontro: o cuidado e a proteção das comunidades indígenas da Amazônia.
Em uma ruptura com os sínodos anteriores, a oração da manhã foi celebrada não no Salão Sinodal, mas na Basílica de São Pedro. E não foi uma recitação típica do breviário. Pelo contrário, membros de comunidades indígenas, alguns vestindo cocares multicoloridos e descalços, ficaram de braços dados com os cardeais e bispos cantando em oração com Francisco diante do túmulo de São Pedro.
Em seguida, caminharam em grupo pela igreja antes de se dirigirem para a Praça de São Pedro. Aí, fizeram uma outra caminhada de cinco minutos para dentro do Salão Sinodal, com alguns carregando símbolos da Amazônia, entre eles uma pequena canoa de madeira, remos e redes de pesca.
Em sua fala de 20 minutos na abertura dos trabalhos, proferida em espanhol, Francisco fez questão de defender o direito dos indígenas de observar os seus costumes e vestir roupas tradicionais.
O pontífice falou que ouviu um comentário sarcástico feito sobre a maneira como um dos indígenas estava vestido com um cocar.
“Digam-me: qual é a diferença entre ter penas na cabeça e o chapéu tricórnio usado por certas autoridades em nossos dicastérios?”, perguntou-se o papa em referência ao barrete que padres e bispos usam às vezes na liturgias católicas.
Mais tarde, o pontífice exortou os participantes para que não tenham medo das coisas novas.
“Espírito Santo é o ator principal do sínodo. Por favor, não vamos jogá-lo para fora da sala!”, completou ele, pedindo que bispos deixem que o Espírito se expresse “entre nós (…) apesar de nós”.
Em sua homilia para a ocasião, o pontífice advertiu os prelados participantes: “se tudo continua igual, se os nossos dias são pautados pelo ‘sempre se fez assim’, então o dom desaparece, sufocado pelas cinzas dos medos e pela preocupação de defender o status quo”.
Francisco falou por primeiro na abertura dos trabalhos, no dia 7 de outubro, seguido pelo Cardeal Lorenzo Baldisseri, secretário-geral do Sínodo dos Bispos, o qual foi seguido pelo Cardeal Hummes.
O ex-arcebispo de São Paulo, que conduziu o processo preparatório sinodal deste ano na qualidade de presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM, sugeriu uma ampla gama de temas a serem abordados pelos bispos reunidos.
O cardeal trouxe a questão de um possível clero composto por homens casados e um ministério para as mulheres no contexto da necessidade sacramental dos católicos da Amazônia, além das sugestões levantadas pelas quase 300 assembleias consultivas nacionais e regionais que a REPAM realizou para permitir que as pessoas sugerissem tópicos para o evento.
Hummes disse que nestas consultas “as comunidades locais, missionários e comunidades indígenas pediram que (…) diante da gritante necessidade da imensa maioria das comunidades católicas na Amazônia, ali se abra caminho para ordenação presbiteral de homens casados, que residam nas comunidades”.
O religioso falou também que “diante do grande número de mulheres que hoje dirigem comunidades na Amazônia, se reconheça este serviço e se procure consolidá-lo com um ministério adequado de mulheres dirigentes de comunidade”.
Os outros cinco temas nucleares que Hummes sugeriu ao sínodo são: a necessidade de uma igreja que se põe a caminhar, a inculturação e a interculturalidade, o testemunho contra a destruição ecológica, a urbanização da região amazônica, e a falta de acesso à água potável.
Em particular, Hummes foi franco com respeito à proteção das comunidades indígenas e ao perigo da destruição ecológica contínua, trazida à atenção mundial recentemente depois que incêndios florestais fugiram do controle na região.
“O sínodo se realiza num contexto de uma grave e urgente crise climática e ecológica que atinge todo o nosso planeta”, disse o brasileiro. “A terra não aguenta mais”.
Em um breve comentário à imprensa, no dia 7 de outubro, um bispo participante do sínodo elogiou Hummes por sua visão geral dos problemas que desafiam a Igreja na Amazônia.
“Tudo isso foi resumido de uma forma excelente”, disse Dom David Martinez de Aguirre Guinea, vigário apostólico de Puerto Maldonado, no Peru. “Temos que aceitar estes desafios, e temos que nos comprometer em encontrar respostas”.
A irmã colombiana Alba Teresa Cediel Castillo, que participa do Sínodo dos Bispos como auditora, também elogiou o Cardeal Hummes pelo foco dado ao ministério feminino. Membro das Irmãs Missionárias de Maria Imaculada e de Santa Catarina de Siena, Cediel disse que as mulheres na Amazônia assumem muitas tarefas por causa da falta de padres.
Segundo a religiosa, as mulheres muitas vezes celebram os batismos e testemunham casamentos, inclusive às vezes ouvem confissões. “É claro que não podemos oferecer a absolvição, mas nós ouvimos com humildade”, disse.
A sessão de abertura, em 7 de outubro, será a única sessão do Sínodo disponível ao público via transmissão ao vivo.
O restante dos trabalhos será conduzido por trás de portas fechadas, sem nenhuma divulgação dos textos dos bispos nem as respostas dadas de um para outro participante. A Sala de Imprensa da Santa Sé realizará diariamente atualizações junto à imprensa para divulgar somente os temas gerais discutidos no dia.
Baldisseri explicou que a Assembleia sinodal irá essencialmente se desdobrar em três partes nas próximas três semanas: dois conjuntos de sessões gerais no Salão Sinodal, cada um seguido de encontros em pequenos grupos, e então a redação e reelaboração de um documento final.
Uma primeira versão do documento será apresentada no salão principal em 21 de outubro e, depois, estará aberta ao processo de ajustes até o dia 25. A votação final do documento deverá acontecer no dia 26.
Baldisseri explicou ainda duas novas ideias que o sínodo já está implementando: primeiro, que o Vaticano comprou cerca de 120 acres da floresta amazônica para compensar a pegada de carbono do evento; segundo, em uma outra ruptura com as edições anteriores, os bispos podem agora participar das sessões em roupas clericais, ao invés das batinas formais.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 07-10-2019. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Claramente enunciados entre estas novas ideias: a possibilidade de ordenar homens casados para enfrentar a falta de ministros católicos na região, que abrange nove países no total; e encontrar um novo jeito de a Igreja dar às mulheres da região amazônica uma espécie de trabalho ministerial oficial.
Na verdade, o Cardeal Cláudio Hummes, franciscano, arcebispo emérito de São Paulo, relator-geral do sínodo, sugeriu que estas duas possibilidades sejam consideradas uma de “seis temas nucleares” do encontro, que vai de 6 até o dia 27 deste mês.
Hummes, que proferiu um discurso de abertura de 50 minutos aos 185 prelados e 80 especialistas sem direito a voto participantes da assembleia, também se expressou de uma forma mais ampla. Ele disse que a Igreja global de 1.3 bilhão de membros não pode mais “ficar sentada em casa, cuidando de si mesma, cercada de muros de proteção”.
“Ela precisa abrir as portas, derrubar muros que a cercam e construir pontes, sair e pôr-se a caminho na história”, disse Hummes no salão sinodal, no Vaticano, ambiente decorado com imagens de mártires latino-americanos, entre estes o arcebispo salvadorenho Dom Oscar Romero.
Em aparente referência aos níveis sem precedentes de críticas que o sínodo deste ano tem recebido de uma minoria atuante de católicos conservadores, preocupados especialmente com a ideia de ordenação de padres casados para a região, o cardeal assim disse: “Esse caminhar (…) torna (a Igreja) fiel à verdadeira tradição”.
“Então, não tenhamos medo do novo. Não tenhamos medo de Cristo, o novo”, declarou o cardeal brasileiro. “Este sínodo procura novos caminhos”.
Outro tema que emergiu no primeiro dia do encontro: o cuidado e a proteção das comunidades indígenas da Amazônia.
Em uma ruptura com os sínodos anteriores, a oração da manhã foi celebrada não no Salão Sinodal, mas na Basílica de São Pedro. E não foi uma recitação típica do breviário. Pelo contrário, membros de comunidades indígenas, alguns vestindo cocares multicoloridos e descalços, ficaram de braços dados com os cardeais e bispos cantando em oração com Francisco diante do túmulo de São Pedro.
Em seguida, caminharam em grupo pela igreja antes de se dirigirem para a Praça de São Pedro. Aí, fizeram uma outra caminhada de cinco minutos para dentro do Salão Sinodal, com alguns carregando símbolos da Amazônia, entre eles uma pequena canoa de madeira, remos e redes de pesca.
Em sua fala de 20 minutos na abertura dos trabalhos, proferida em espanhol, Francisco fez questão de defender o direito dos indígenas de observar os seus costumes e vestir roupas tradicionais.
O pontífice falou que ouviu um comentário sarcástico feito sobre a maneira como um dos indígenas estava vestido com um cocar.
“Digam-me: qual é a diferença entre ter penas na cabeça e o chapéu tricórnio usado por certas autoridades em nossos dicastérios?”, perguntou-se o papa em referência ao barrete que padres e bispos usam às vezes na liturgias católicas.
Mais tarde, o pontífice exortou os participantes para que não tenham medo das coisas novas.
“Espírito Santo é o ator principal do sínodo. Por favor, não vamos jogá-lo para fora da sala!”, completou ele, pedindo que bispos deixem que o Espírito se expresse “entre nós (…) apesar de nós”.
Temas fundamentais
O sínodo deste ano, que formalmente leva o título de “Amazônia: Novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”, começou oficialmente em 6 de outubro com uma missa celebrada por Francisco na Basílica de São Pedro.Em sua homilia para a ocasião, o pontífice advertiu os prelados participantes: “se tudo continua igual, se os nossos dias são pautados pelo ‘sempre se fez assim’, então o dom desaparece, sufocado pelas cinzas dos medos e pela preocupação de defender o status quo”.
Francisco falou por primeiro na abertura dos trabalhos, no dia 7 de outubro, seguido pelo Cardeal Lorenzo Baldisseri, secretário-geral do Sínodo dos Bispos, o qual foi seguido pelo Cardeal Hummes.
O ex-arcebispo de São Paulo, que conduziu o processo preparatório sinodal deste ano na qualidade de presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM, sugeriu uma ampla gama de temas a serem abordados pelos bispos reunidos.
O cardeal trouxe a questão de um possível clero composto por homens casados e um ministério para as mulheres no contexto da necessidade sacramental dos católicos da Amazônia, além das sugestões levantadas pelas quase 300 assembleias consultivas nacionais e regionais que a REPAM realizou para permitir que as pessoas sugerissem tópicos para o evento.
Hummes disse que nestas consultas “as comunidades locais, missionários e comunidades indígenas pediram que (…) diante da gritante necessidade da imensa maioria das comunidades católicas na Amazônia, ali se abra caminho para ordenação presbiteral de homens casados, que residam nas comunidades”.
O religioso falou também que “diante do grande número de mulheres que hoje dirigem comunidades na Amazônia, se reconheça este serviço e se procure consolidá-lo com um ministério adequado de mulheres dirigentes de comunidade”.
Os outros cinco temas nucleares que Hummes sugeriu ao sínodo são: a necessidade de uma igreja que se põe a caminhar, a inculturação e a interculturalidade, o testemunho contra a destruição ecológica, a urbanização da região amazônica, e a falta de acesso à água potável.
Em particular, Hummes foi franco com respeito à proteção das comunidades indígenas e ao perigo da destruição ecológica contínua, trazida à atenção mundial recentemente depois que incêndios florestais fugiram do controle na região.
“O sínodo se realiza num contexto de uma grave e urgente crise climática e ecológica que atinge todo o nosso planeta”, disse o brasileiro. “A terra não aguenta mais”.
Em um breve comentário à imprensa, no dia 7 de outubro, um bispo participante do sínodo elogiou Hummes por sua visão geral dos problemas que desafiam a Igreja na Amazônia.
“Tudo isso foi resumido de uma forma excelente”, disse Dom David Martinez de Aguirre Guinea, vigário apostólico de Puerto Maldonado, no Peru. “Temos que aceitar estes desafios, e temos que nos comprometer em encontrar respostas”.
A irmã colombiana Alba Teresa Cediel Castillo, que participa do Sínodo dos Bispos como auditora, também elogiou o Cardeal Hummes pelo foco dado ao ministério feminino. Membro das Irmãs Missionárias de Maria Imaculada e de Santa Catarina de Siena, Cediel disse que as mulheres na Amazônia assumem muitas tarefas por causa da falta de padres.
Segundo a religiosa, as mulheres muitas vezes celebram os batismos e testemunham casamentos, inclusive às vezes ouvem confissões. “É claro que não podemos oferecer a absolvição, mas nós ouvimos com humildade”, disse.
A sessão de abertura, em 7 de outubro, será a única sessão do Sínodo disponível ao público via transmissão ao vivo.
O restante dos trabalhos será conduzido por trás de portas fechadas, sem nenhuma divulgação dos textos dos bispos nem as respostas dadas de um para outro participante. A Sala de Imprensa da Santa Sé realizará diariamente atualizações junto à imprensa para divulgar somente os temas gerais discutidos no dia.
Baldisseri explicou que a Assembleia sinodal irá essencialmente se desdobrar em três partes nas próximas três semanas: dois conjuntos de sessões gerais no Salão Sinodal, cada um seguido de encontros em pequenos grupos, e então a redação e reelaboração de um documento final.
Uma primeira versão do documento será apresentada no salão principal em 21 de outubro e, depois, estará aberta ao processo de ajustes até o dia 25. A votação final do documento deverá acontecer no dia 26.
Baldisseri explicou ainda duas novas ideias que o sínodo já está implementando: primeiro, que o Vaticano comprou cerca de 120 acres da floresta amazônica para compensar a pegada de carbono do evento; segundo, em uma outra ruptura com as edições anteriores, os bispos podem agora participar das sessões em roupas clericais, ao invés das batinas formais.
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