segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Homilia do Papa Francisco na missa de abertura do Sínodo da Amazônia

[aciprensa]
Por Redação da imprensa ACI

Papa Francisco durante a missa.


O Papa Francisco presidiu neste domingo, 6 de outubro, na Basílica de São Pedro, no Vaticano, a missa de abertura da Assembléia Especial do Sínodo dos Bispos para a região do Panamá, também conhecida como Sínodo da Amazônia, que ocorrerá no Vaticano até o próximo dia 27 de outubro. Na missa, na qual também participaram os 13 novos cardeais criados na sessão realizada ontem, sábado, 5 de outubro, o Santo Padre rebateu o fogo de Deus "que ilumina, aquece e dá vida" ao fogo do mundo "isso destrói".
O Santo Padre ressaltou a importância do Sínodo "para renovar os caminhos da Igreja na Amazônia, para que o fogo da missão não se apague". Ele também lembrou que “muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam pesadas cruzes e aguardam o consolador libertador do Evangelho e a carícia de amor da Igreja. Para eles, com eles, vamos caminhar juntos.”

A seguir, a homilia completa do Papa Francisco:

O apóstolo Paulo, o maior missionário da história da Igreja, nos ajuda a "fazer o Sínodo", a "andar juntos". O que Timóteo escreve parece se referir a nós, pastores a serviço do povo de Deus.
Acima de tudo, ele diz: "Lembro-lhe que você reacende o dom de Deus em você pela imposição das minhas mãos" (2 Tm 1,6). Somos bispos porque recebemos um presente de Deus. Não assinamos um acordo, eles não nos deram um contrato de trabalho “em nossas próprias mãos”, mas a imposição de mãos na cabeça, de modo que também somos mãos que se levantam para interceder e estender aos irmãos.
Recebemos um presente para ser presentes. Um presente não é comprado, não é alterado e não é vendido: é recebido e doado. Se tiramos vantagem disso, se nos colocamos no centro e não no presente, deixamos de ser pastores e nos tornamos funcionários públicos: tornamos o presente uma função e a gratificação desaparece, e por isso acabamos usando a Igreja para servir a nós mesmos. Nossa vida, no entanto, pelo presente recebido, é servir. O Evangelho lembra-se disso, que fala de "servos inúteis" (Lc 17,10).
É uma expressão que também pode significar "servidores sem utilidade". Isso significa que não nos esforçamos para obter algo útil para nós, um benefício, mas que damos livremente porque o recebemos de graça (cf. Mt 10,8). Toda a nossa alegria será servir porque fomos servidos por Deus, que se tornou nosso servo. Queridos irmãos, nos sintamos convocados aqui para servir, colocando o dom de Deus no centro.
Para ser fiel ao nosso chamado, à nossa missão, São Paulo nos lembra que o presente é revivido. O verbo que ele usa é fascinante: reavivar literalmente é "dar vida ao fogo" [anazopurein]. O presente que recebemos é um fogo, é um amor ardente por Deus e pelos irmãos. O fogo não se alimenta, morre se não for mantido vivo, apaga-se se as cinzas o cobrirem.
Se tudo permanece como está, se nossos dias são marcados por "sempre foi feito dessa maneira", o presente desaparece, sufocado pelas cinzas dos medos e pela preocupação de defender o status quo. Mas "a Igreja não pode se limitar de maneira alguma a uma pastoral de" manutenção "para aqueles que já conhecem o Evangelho de Cristo. O impulso missionário é um sinal claro da maturidade de uma comunidade eclesia" (BENTO XVI, Exortação. Apost. Apost. Postsin. Verbum Domini, 95). Porque a Igreja está sempre a caminho, sempre a caminho, nunca fecha em si mesma. Jesus não veio para trazer a brisa da tarde, mas o fogo na terra.
O fogo que revive o presente é o Espírito Santo, que dá presentes. Por isso, São Paulo continua: "Vigia o precioso depósito com a ajuda do Espírito Santo que habita em nós" (2 Tm 1,14). E também: "Deus não nos deu um espírito de covardia, mas de força, amor e prudência" (v. 7).
Não é um espírito covarde, mas de prudência. Alguns pensam que a prudência é um costume, uma virtude que impede tudo para evitar erros. Não. A prudência é virtude cristã, é virtude da vida. É também a virtude do governo. Paulo opõe prudência à covardia. Qual é então essa prudência do Espírito? Como ensina o Catecismo, a prudência "não se confunde com a timidez ou o medo", mas "é a virtude que fornece uma razão prática para discernir nosso verdadeiro bem em todas as circunstâncias e escolher os meios certos para fazê-lo" (n 1806). Prudência não é indecisão, não é uma atitude defensiva.
É a virtude do pastor que, para servir com sabedoria, sabe discernir, sensível à novidade do Espírito. Portanto, reviver o dom no fogo do Espírito é o oposto de deixar que as coisas sigam seu curso sem fazer nada. E ser fiel à novidade do Espírito é uma graça que devemos pedir em oração. Que Ele, que renova todas as coisas, nos dê sua ousada prudência, inspire nosso Sínodo a renovar os caminhos da Igreja na Amazônia, para que o fogo da missão não se apague.
O fogo de Deus, como no episódio da sarça ardente, queima, mas não é consumido (cf. Ex 3,2). É um fogo de amor que ilumina, aquece e dá vida, não fogo que se estende e devora. Quando povos e culturas se devoram sem amor e sem respeito, não é o fogo de Deus, mas do mundo. E, no entanto, quantas vezes o dom de Deus não foi oferecido, mas imposto, quantas vezes houve colonização em vez de evangelização. Deus nos afasta da ganância dos novos colonialismos.
O fogo aplicado pelos interesses que eles destroem, como o que devastou recentemente a Amazônia, não é o do Evangelho. O fogo de Deus é o calor que atrai e reúne. Alimenta-se de compartilhamento, não de benefícios. O fogo devorador, por outro lado, se estende quando você deseja avançar apenas suas próprias idéias, formar seu próprio grupo, queimar o diferente para tornar todos e tudo uniforme.
Reacenda o presente; acolhe com satisfação a ousada prudência do Espírito, fiel à sua novidade; São Paulo dirige uma última exortação: «Não tenha vergonha do testemunho [...]; Antes, ele participa dos sofrimentos do evangelho, segundo a força de Deus” (2 Tim 1.8). Peça para testemunhar o Evangelho, sofrer pelo Evangelho, em uma palavra, viver pelo Evangelho. A proclamação do Evangelho é o primeiro critério para a vida da Igreja. É sua missão, sua identidade. Logo após Paulo escrever: "Pois estou prestes a ser derramado em libação" (4,6).
Anunciar o Evangelho é viver a oferta, é testemunhar até o fim, é fazer tudo por todos (cf. 1 Cor 9,22), é amar até o martírio. Agradeço a Deus porque no Colégio dos Cardeais há alguns irmãos mártires, que experimentaram na vida a Cruz do Martírio. De fato, sublinha o apóstolo, o Evangelho é servido não com o poder do mundo, mas com o único poder de Deus: permanecendo sempre no amor humilde, acreditando que a única maneira de realmente possuir a vida é perdê-la por amor.
Queridos irmãos, Olhemos juntos para Jesus crucificado, seu coração trespassado por nós. Vamos começar a partir daí, porque daí surgiu o presente que nos gerou; daí o Espírito Santo que renova foi infundido (cf. Jo 19,30). A partir daí, vamos nos sentir chamados, todos e cada um, a dar nossas vidas.
Muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam cruzes pesadas e aguardam o consolador libertador do Evangelho e a carícia de amor da Igreja. Muitos irmãos e irmãs na Amazônia deram a vida.
Permita-me repetir as palavras do nosso querido cardeal Hummes, quando ele chega nas pequenas cidades da Amazônia, ele vai aos cemitérios, para procurar as tumbas dos missionários. Um gesto da Igreja por parte de quem deu a vida na Amazônia. E então, com um pouco de malícia, ele diz ao papa: 'Não os esqueça. Eles merecem ser canonizados.
Para eles, para aqueles que deram suas vidas, com eles, vamos caminhar juntos.

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