A nova linguagem do magistério eclesiástico está a ser estudada por especialistas. As mudanças são notáveis e uma delas consiste em expressar-se através de slogans, ou seja, através de frases eficazes, muito expressivas, que atingem o público e provocam emoções. A palavra slogan aqui não quer significar propaganda, mas sim o desejo de atingir os corações dos ouvintes ou dos leitores com frases que deixam uma marca e causam um choque. Duas expressões deste tipo foram utilizadas mais recentemente: «Vacinar-se é um acto de amor» e «o Mediterrâneo é um cemitério». Em ambos os discursos, Francisco não se limitou apenas a dizer estas frases, mas todas as suas considerações foram desse teor e, em qualquer caso, foi isto que acabou por restar das ideias que expressou, foi isto que a imprensa valorizou e será isto que as pessoas recordarão.
Ao lidar com semelhantes problemáticas, o “magistério por slogan” aderiu frequentemente a uma vulga mínima que está muito longe da realidade e muito próxima da versão oficial do poder constituído. Na prática, tudo se limitaria a isto: há uma pandemia, no caso de uma pandemia a única arma é a vacina, aqueles que não se vacinam demonstram egoísmo, vacinar-se é um acto de amor. Não entro aqui no mérito da questão, apenas assinalo a enorme desproporção entre a complexidade da problemática e as posições tomadas pelo “magistério por slogan”. As frases eficazes vistas acima podem atingir neste momento, mas depois secam como a água numa pedra num dia de sol.
O mesmo deve ser dito em relação à questão da migração. Também neste caso a complexidade do problema é evidente. Há o aspecto dos possíveis planos internacionais de desestabilização geopolítica, o do crime organizado e das máfias internacionais que gerem os tráficos, o dos problemas do acolhimento e da inclusão, o da tipologia pessoal e social dos que chegam, o do empobrecimento demográfico e cultural dos países de origem. Existem amplas instrumentalizações do fenômeno, tantas verdades são distorcidas por uma informação frequentemente incorrecta, tantos interesses privados ou sectoriais tiram partido dos fluxos descontrolados e tantas palavras são agora utilizadas num sentido ideológico forçado. Perante este quadro, as frases-slogan contra «os muros do medo» ou aquelas que denunciam que «os campos de concentração ainda hoje existem» sobrepõem-se em vez de nos ajudarem a compreender a realidade.
Poder-se-ia justificar este tipo de comunicação pensando que, evangelicamente, se está a atirar o coração além do obstáculo. No entanto, vendo bem, as frases-slogan impressionam também porque definem políticas concretas. O slogan «vacinar-se é um acto de amor» valida e apoia concretamente as actuais políticas de saúde governamentais e condena a resistência às mesmas. O slogan «o Mediterrâneo é um cemitério» valida e apoia concretamente uma política de acolhimento forçada, que, segundo alguns, é precisamente a razão pela qual o Mediterrâneo é um cemitério. Não se trata, portanto, de atirar com esperança profética o coração além do obstáculo.
A Igreja Católica está hoje muito empenhada em dois conceitos: o de sinodalidade e o de discernimento, que estão intimamente ligados entre si. Mas pergunto-me: que tipo de discernimento pode garantir um “magistério por slogan” como o acima descrito? Discernir significa distinguir, escolher, excluir, interpretar, avaliar, usar de prudência... mas para isso é preciso conhecer a complexidade das questões sociais, também para compreender quando temos de nos comportar de forma apropriada com elas ou quando podemos exercer a discrição.
Fonte - diesirae
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