Parece que as mais novas gerações de adultos finalmente estão compreendendo que as redes sociais são perniciosas. Ao longo dos últimos quinze anos, vimos que Facebook, Twitter, Snapchat, Instagram e TikTok chegaram ao apogeu. Todas essas redes sociais ainda são muito populares, e atualmente o TikTok lidera o ranking de popularidade. Porém, enquanto um vasto número de adultos limita o tempo gasto em redes sociais, o tempo gasto diante das telas tem aumentado entre certo segmento demográfico: as crianças. É possível que estejamos começando a abandonar as redes sociais, mas as crianças estão apenas começando a usá-las.

Muitas crianças gastaram o tempo de isolamento durante a pandemia nas redes sociais. Forçadas a permanecer em isolamento, não lhes restou outra alternativa. Estas estatísticas contam uma parte da história: em 2020, a receita do TikTok quintuplicou e o número de usuários nos EUA dobrou. Hoje, mais de um quarto dos usuários de todo o mundo têm menos de 18 anos, e o número de mulheres supera o de homens. Nos EUA, gasta-se em média mais de uma hora por dia com o TikTok. No geral, o uso de redes sociais cresceu dramaticamente durante o lockdown. Os adultos as utilizaram para permanecer conectados, enquanto os pais que se esforçaram para trabalhar em casa ou manter o emprego deixaram os filhos sob os cuidados da tecnologia.

Hoje vemos os frutos: o isolamento devido à recente pandemia acelerou a já existente tendência de declínio no comportamento e na educação das crianças. Qualquer professor dirá que a nova epidemia é o aumento vertiginoso de condutas inapropriadas e radicalmente desordeiras entre os estudantes, alimentadas em parte pelo amor que eles têm aos vídeos da internet. Estudantes que eram bem comportados na escola começaram a se comportar mal. Conhecem palavras indecorosas que normalmente não ouviriam nem na televisão nem em suas famílias. Sabem um grande número de danças e gestos inapropriados, que todos aprendem mais ou menos ao mesmo tempo. Nas escolas, eles se reúnem para ficar em volta das telas tão logo surja a oportunidade; quando não o fazem, passam o tempo falando sobre o que está acontecendo online.          

Naturalmente, esses problemas comportamentais se somam à defasagem de aprendizado, e aos danos mentais infligidos à maioria dos estudantes nos Estados Unidos, como consequência do pânico causado pela Covid-19. Sim, os estudantes estão se comportando mal por causa da imensa tensão mental provocada pela ansiedade e pelo isolamento decorrentes da pandemia; atualmente, a Força-tarefa de Saúde Preventiva dos Estados Unidos tem recomendado exames adicionais para desordens ligadas à ansiedade, inclusive para crianças de oito anos de idade.

Mas não foi a Covid-19 que ensinou às crianças transgressões criativas, pegadinhas, palavras obscenas e gestos inadequados. Foram as redes sociais. Talvez você tenha ouvido falar do trend dos devious ou diabolical licks, no TikTok, que atingiu o auge no outono de 2021. Estudantes do ensino fundamental e médio postavam vídeos nos quais apareciam roubando ou vandalizando propriedades escolares. Essas ações redundaram em inúmeras detenções e milhares de imitadores nos EUA e em outros países. Foi uma epidemia que se espalhou rapidamente. O vídeo original foi postado em 1.º de setembro e removido no dia 13 do mesmo mês. Todos os vídeos que perpetuavam o trend foram banidos pelo TikTok dois dias depois. Naquelas duas semanas, a hashtag devious teve mais de 200 milhões de visualizações. 

[N.T.: Mais recentemente, também foi notícia o chamado “desafio do apagão”blackout challenge, em inglês — que vitimou fatalmente uma menina de nove anos nos Estados Unidos e causou dano cerebral irreversível no menino Archie Battersbee, na Inglaterra.] [i]

Nós permitimos que isso acontecesse; tornamo-nos complacentes com os perigos da internet. A história do TikTok tem se repetido em outras plataformas de rede social por quase duas décadas. Mas nós ficamos acostumados aos alertas antigos e familiares. Por isso deixamos de lhes dar atenção. 

O TikTok foi lançado em 2016 pela empresa chinesa ByteDance. Alguns anos depois, quando a popularidade da rede social cresceu rapidamente nos EUA, o governo de Donald Trump tentou bani-la, usando como justificativa a preocupação com riscos de segurança. Porém, pouco tempo depois a proibição foi revertida por Joe Biden, o novo presidente. Apenas alguns meses antes, no entanto, o TikTok havia pagado uma grande quantia de dinheiro para estabelecer um acordo numa ação popular relativa à transferência de dados pessoais a servidores chineses. Em todo caso, as políticas de privacidade e dados do TikTok de fato não são consideradas piores que as de outras redes sociais.    

Na verdade, o TikTok tem os problemas usuais de qualquer aplicativo de rede social. Predadores que atuam online utilizam essa rede social para atrair crianças, e muitas vezes conteúdos obscenos conseguem escapar dos mecanismos de controle. Os desenvolvedores do aplicativo tomaram as providências básicas quanto à “proteção de crianças”: os pais podem usar o “modo restrito” para limitar conteúdo adulto e podem parear suas contas com as de seus filhos. Mas isso não impede que as crianças vejam vídeos com palavrões, letras com temas sexuais, conteúdo relacionado a drogas, roupas imodestas e danças obscenas. Além disso, as crianças só precisam saber um pouco de tecnologia para contornar as restrições; muitas sabem como evitar configurações de privacidade criando as próprias contas e fornecendo aniversários falsos. Assim elas podem acessar vídeos com conteúdo “adulto” e postar vídeos imediatamente, sem necessidade de revisão ou edição, expondo-se aos predadores.    

Estes são alguns dos outros males documentados no TikTok: potencial dependência; discurso de ódio dos mais variados tipos; intimidação virtual [cyberbullying] (inclusive divulgação de informações para transformar alguém em alvo [doxing]); vídeos ao vivo de suicídios; desenvolvimento de desordens neurológicas; e menores de idade que postam vídeos de si mesmas com conteúdo sexualizante. Os valores da plataforma também são progressistas; por exemplo, ela proíbe vídeos que promovem terapia de conversão.

Novamente, isso não acontece apenas no TikTok. O uso de redes sociais em geral faz mal para a saúde mental. É particularmente prejudicial para a saúde mental e física das meninas. Desde o início dos lockdowns temos visto um número crescente de hospitalizações resultantes de desordens alimentares entre mulheres jovens, apesar do decréscimo geral das hospitalizações de jovens durante a pandemia. A pressão dos pares e as redes sociais aumentaram dramaticamente o número de crianças levadas a clínicas especializadas em transição de gênero sem consulta prévia a um psicólogo, algo que deixou inquieto inclusive um conhecido psicólogo transgênero. Ademais, o formato do TikTok é particularmente ruim: expor qualquer pessoa a uma tela o tempo todo prejudica a saúde mental, ao passo que ver vídeos curtos consecutivamente pode reduzir a capacidade de concentração.   

Em março, um grupo de procuradores gerais do Estado deram início a uma investigação para descobrir se e como o TikTok prejudica as crianças. Talvez em alguns anos chegarão à mesma conclusão de qualquer pessoa com bom senso: o TikTok afoga a alma num oceano de maldade para cada gota de bem que gera

A internet de hoje não é a mesma de quando nós adultos éramos crianças; tem muito mais maldade (embora também haja mais bondade), e vídeos obscenos são divulgados diretamente para as nossas crianças. O mal na internet já não fica à espera de ser descoberto; ele jorra de forma agressiva.

Pais e professores precisam enxergar que estamos numa guerra. A internet não é um campo aberto com alguns buracos; é um campo totalmente minado. O livre acesso à internet põe em risco a saúde emocional e espiritual das nossas crianças, pois elas pisarão em minas para onde quer que se voltem. Nossos filhos precisam sair do TikTok — e o acesso deles à internet deve ser rigorosamente monitorado — agora. Não podemos mais dar-lhes acesso sem restrições a computadores (particularmente nos quartos!), a smartphones com dados ilimitados e a tablets sem monitoramento.

É fácil ignorar ou minimizar os males do acesso livre à internet, ao TikTok ou a outra rede social. É fácil apresentar desculpas, dada a onipresença da internet. “Meu filho precisa de um smartphone para entrar em contato comigo”. “Meu filho precisa de algo para se manter ocupado enquanto eu estou ocupado”. “Eu uso a internet como incentivo”. “Tenho aplicativos educativos no celular”. “Eles precisam aprender a navegar na internet por conta própria”. “Não tenho tempo para vigiar tudo o que estão fazendo”. “A internet não é tão ruim assim, a maior parte do conteúdo não faz mal”. “Meus filhos precisam de alguma privacidade, pois estão crescendo”.

Porém, não existe nenhuma boa razão ou justificativa que nos permita dar aos nossos filhos a liberdade para buscarem a sua própria destruição. As desculpas acima são somente isto: desculpas para que não realizemos o trabalho árduo de ensinar e criar os filhos. Além disso, nós mesmos temos tantas coisas para dar a eles: particularmente, nosso tempo e nossa atenção. Podemos dar a eles brinquedos, livros, artigos de arte, diários e bicicletas. Podemos dar tarefas e ensinar habilidades úteis para a vida adulta. Podemos encorajá-los a nutrir boas amizades, ter conversas edificantes e dar conselhos instrutivos a eles. Podemos ensiná-los a ter confiança em nós e a conversar conosco. Podemos ensinar-lhes que são amados e queridos sem que precisem imitar a vida fantasiosa e virtual de outra pessoa. Podemos ensinar a eles que somos feitos para o Céu, não para fantasias virtuais. Podemos ensinar que o mundo está contra eles e quer machucá-los, mas que nós somos por eles — e Deus é por nós.  

Nossos filhos clamam por alimento emocional e espiritual. Deveríamos dar a eles escorpiões ou cobras sob a forma de redes sociais e acesso irrestrito à internet? Não! O TikTok é muito mais perigoso do que a Covid-19, e não tenho dúvida de que sua taxa de mortalidade já é muito superior à de qualquer pandemia. Almas estão em jogo! Ainda que encontremos no TikTok algum raro vídeo que valha a pena — mesmo que seja um vídeo com conteúdo católico! —, existem entretenimentos muito mais seguros e edificantes, sem falar em alegrias muito superiores pelas quais esperar. Nossos filhos jamais saberão disso se não os educarmos de forma diferente.

Notas

  1. Sobre o menino Archie Battersbee, de 12 anos: a família da criança lutou desde abril até o começo de agosto pela vida do filho, mas, uma vez mais, assim como no caso do bebê Charlie Gard, prevaleceu a decisão judicial de que seus aparelhos fossem desligados. Nem tudo são notícias más, no entanto: o menino foi batizado no Domingo de Páscoa, logo depois de entrar em coma. Ele mesmo havia manifestado esse desejo anos antes, inspirado pelos cristãos lutadores de boxe que via na televisão. (N.T.)