(Com base na conferência proferida em março de 2019 em Bilbao, organizada pela Sociedade de São Vicente de Paulo e pela Obra do Pão dos Pobres.)
A Igreja Católica está passando por uma crise sem precedentes. Escândalos, confusão doutrinária e um mundo hostil levaram muitos a se perguntar se o barco de Pedro está prestes a afundar. Mas, como no Evangelho, Cristo está presente e é Ele quem tem a última palavra.
Um dos aspectos mais perturbadores desta crise tem sido a onda de escândalos sexuais, particularmente o caso McCarrick e o encobrimento de abuso por altos funcionários da Igreja. Histórias de seminaristas assediados, de bispos que olharam para o outro lado e de uma rede de proteção para predadores abalaram a confiança dos fiéis. A realidade é que, embora o pecado sempre tenha estado presente na Igreja, a diferença hoje reside na magnitude do encobrimento e na falta de resposta firme da hierarquia.
O escândalo McCarrick era apenas a ponta do iceberg. Nos Estados Unidos, o relatório do Grande Júri da Pensilvânia revelou décadas de abuso sistemático e encobrimentos. Na Argentina, Gustavo Zanchetta, nomeado bispo pelo Papa Francisco, foi acusado de conduta inadequada com seminaristas e, em vez de ser removido, foi transferido para o Vaticano. Na Espanha, há histórias de seminaristas que denunciaram o assédio e o abuso de poder sem que os bispos tomem medidas até que os casos sejam ameaçados de serem tornados públicos.
A crise moral não é exclusiva de uma região ou de um tempo. Peter Damian já denunciou abusos semelhantes no século 11. No entanto, a diferença hoje é a resposta institucional: a hierarquia parece mais preocupada em proteger sua imagem do que em fazer justiça.
A grande confusão doutrinária
Além dos escândalos, a crise atual tem suas raízes na confusão doutrinária. A ambiguidade tornou-se uma estratégia de comunicação de Roma: respostas vagas e abertas à interpretação sobre questões cruciais, como a comunhão dos divorciados recasados, intercomunicação com os protestantes ou o ensino moral sobre a identidade sexual. A Igreja, que sempre foi um verdadeiro farol, parece ter sucumbido ao perigoso relativismo.
Este relativismo é agravado pela oposição artificial entre doutrina e pastoral, como se a misericórdia pudesse existir sem verdade. A "boa-fada" é insistida, mas o pedido de conversão é omitido. Como resultado, o senso de pecado é turvo e confuso com os fiéis.
Um dos exemplos mais claros desta crise doutrinária foi o caso do Dubian. Quatro cardeais, incluindo o renomado Carlo Caffarra e Joachim Meisner, levantaram cinco perguntas diretas ao Papa Francisco sobre Amoris Laetitia, questionando se certos ensinamentos permaneceram válidos. Quatro anos depois, nunca receberam uma resposta. Pode ser comungado em pecado mortal? Existem padrões morais absolutos? A falta de clareza não só não resolveu essas questões, mas mergulhou a Igreja em uma crise de identidade.
Abordagem ao mundo e a perda do sobrenatural
A Igreja passou de uma voz profética para tentar agradar o mundo. Hoje fala-se mais da mudança climática do que da salvação eterna; mais sobre a integração migratória do que sobre a conversão do coração. Pregar sobre o julgamento, o inferno e a necessidade de estar em graça foi relegado ao esquecimento. Quando foi a última vez que uma homilia foi ouvida sobre a condenação eterna? Sobre a urgência da conversão?
João Paulo II advertiu que a Igreja não deveria sucumbir ao espírito do mundo. Nos últimos anos, no entanto, as mensagens de Roma se voltaram cada vez mais para uma agenda secular. O discurso sobre a crise ecológica e a imigração foi promovido, enquanto as preocupações com a apostasia no Ocidente ou a crise vocacional permanecem no pano de fundo.
Esta crise vem de cima. Não são as pessoas fiéis que mudaram a doutrina, mas aqueles que devem nos confirmar com fé. A ausência de clareza deixou um vazio que cada um preenche com sua própria interpretação. Como na tempestade do Evangelho, muitos sentem que Cristo dorme enquanto as ondas ameaçam afundar o barco.
Os sinais de esperança
Mas nem tudo é escuridão. A Igreja ainda está viva e há sinais de esperança. Congregações como Iesu Communio ou as Missionárias da Caridade atraem jovens que procuram viver a radicalidade do Evangelho. Comunidades de culto perpétuo florescem em lugares diferentes, lembrando que a força da Igreja não está nas estruturas humanas, mas na presença real de Cristo na Eucaristia.
No nível político, há também um ressurgimento de líderes dispostos a defender a vida, a família e a liberdade religiosa. Apesar da descristianização, muitos leigos estão organizados em minorias criativas, como propôs Bento XVI, pronto para ser um ferry em um mundo hostil.
- O que fazer?
Diante desta crise, não podemos limitar-nos a lamentar. Como os apóstolos na tempestade, somos chamados a três ações concretas:
1. Olhar para Cristo: A fé não é uma ideologia, mas uma relação
pessoal com Deus. Precisamos voltar aos sacramentos, especialmente à
Eucaristia e à confissão.
2. Trabalhando para a regeneração da Igreja: não podemos esperar que
as estruturas mudem sozinhas. Devemos formar comunidades onde a fé é
vivida autenticamente.
3. Para testemunhar sem medo: em um mundo hostil, os católicos são
chamados a ser luz. Não se trata apenas de defender a fé nos debates,
trata-se de vivê-la com coerência e coragem.
Sim, a tempestade está em ascensão e parece que o barco do Peter afunda. Mas Cristo ainda está a bordo. Como os apóstolos, ele nos chama a confiar e a remar. O futuro da Igreja não está nas mãos de políticos ou hierarcas, mas na fidelidade dos santos, dos mártires e de todos os fiéis que decidem viver a sua fé sem concessões. A última palavra não são os inimigos da Igreja, mas Aquele que nos prometeu: as portas do inferno não prevalecerão contra ela.
Fonte - infovaticana
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